Anglo American ainda não planeja reassentamento de comunidades atingidas por Minas-Rio
Após determinação de juíza, mineradora nega ter recebido intimação; comunidades alegam impactos em água, alimentos e animais
Mesmo após ação do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) que obriga a Anglo American a reassentar três comunidades em Alvorada de Minas e Conceição do Mato Dentro, o empreendimento Minas-Rio executado pela mineradora continua causando prejuízos a essas famílias. A Ação Civil Pública (ACP) determina que as pessoas que moram em São José do Jassém, Passa Sete e Água Quente devem ser removidas da Zona de Autossalvamento (ZAS) em até um ano. No entanto, a Anglo American afirma ainda não planejar o deslocamento das famílias.
O veterinário Lúcio Guerra Júnior tem propriedades nas três comunidades e percebe que o principal problema é a contaminação da água. Os resíduos tóxicos afetam a vida das comunidades, que utilizam os córregos para uso, consumo e lazer. “A água é primordial pra todo ser humano, inclusive mais pra comunidade da Água Quente, porque a própria Água Quente é extremamente dependente do córrego. Está construída a barragem sobre o leito dele”, explica Lúcio.
Autor de mais de um Boletim de Ocorrência (BO) nos locais, Lúcio presenciou a poluição e o assoreamento dos córregos que abastecem toda a vizinhança. Além disso, o veterinário registrou junto à Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG) a morte e o atolamento de animais provenientes dos impactos ambientais causados pela Anglo American.
A água contaminada também prejudica a alimentação da comunidade. Além de impedir o consumo das hortas em seus quintais, Lúcio aponta que moradores do entorno à Mina do Sapo tinham uma produção intensa de farinha e polvilho para biscoitos e pães de queijo que está sendo interrompida. “A melhor farinha da região. Muitos foram deixando a atividade, porque a mandioca, depois de triturada, vai pra secar. E, nessa fase pra fazer a farinha, o que vinha em cima? A poeira do minério. Então prejudicava essas famílias também”, conta.
A sentença emitida no dia 17 de setembro pela juíza Letícia Machado Vilhena Dias foi baseada na Lei Mar de Lama Nunca Mais e determina 60 dias para que a mineradora apresente um Plano de Reassentamento Coletivo. Além disso, o processo deve ser acompanhado pelo Núcleo de Assessoria às Comunidades Atingidas por Barragens (Nacab). Segundo a ATI 39 Nacab, a Ação também solicita a anulação da atual licença ambiental concedida pelo Estado à Anglo American e impede novas licenças até a correção da ilegalidade.
O próprio processo de reassentamento pode causar impactos às comunidades. É por isso que o Plano também deve contar com a participação delas para preservar sua cultura – os laços afetivos e a economia. A intenção é que as condições de vida das comunidades São José do Jassém, Passa Sete e Água Quente sejam iguais ou melhores que as anteriores às atividades minerárias.
Apesar de ter sido obrigada a elaborar um calendário com as etapas, modos de elaboração e execução do Plano, a Anglo American alega em nota que ainda não foi notificada da decisão:
A Anglo American informa que não foi comunicada oficialmente da decisão sobre o julgamento da Ação Civil Pública que trata do processo de reassentamento coletivo das comunidades de Água Quente, Passa Sete e São José do Jassém, na zona rural dos municípios de Alvorada de Minas e Conceição do Mato Dentro (MG). Assim que intimada, a empresa irá analisar a decisão e se pronunciará nos autos do processo. A Anglo American ressalta que desde 2019 vem implantando um programa de reassentamento para as comunidades de Água Quente e Passa Sete, e está aberta a continuar o diálogo com a comunidade de São José do Jassém sobre eventual reassentamento.
O valor do reassentamento a ser custeado pela Anglo American está estimado em R$ 500 milhões. Caso a mineradora não apresente o Plano de Reassentamento Coletivo em até dois meses, será penalizada por uma multa de R$ 50 mil por dia de atraso.