Anglo American convoca moradores de Gondó para negociação, mas 76 famílias continuam fora do Plano de Reassentamento

Desde o dia 17 de fevereiro, moradores elegíveis ao Plano de Reassentamento de Gondó começaram a se reunir com a mineradora para dar início às negociações

Anglo American convoca moradores de Gondó para negociação, mas 76 famílias continuam fora do Plano de Reassentamento
A comunidade de Gondó é um dos territórios atingidos pela mineração da Anglo American. Foto: Foto: Kennet Anderson

Em novembro de 2024, os atingidos aprovaram o Plano de Reassentamento de Gondó, comunidade situada na área rural do distrito de Córregos, em Conceição do Mato Dentro. Tal projeto, de responsabilidade da Anglo American, prevê o deslocamento de uma parte dos moradores situados próximos à Serra do Sapo — área de cava do complexo Minas-Rio. O plano foi inicialmente apresentado pela mineradora e, posteriormente, revisado e negociado pelos atingidos da comunidade junto à empresa, com o auxílio da Assessoria Técnica Independente ATI 39 Nacab.

Durante o período de revisão do plano, a comunidade solicitou equiparação com os critérios já legitimados nas negociações das comunidades da Zona de Autossalvamento (ZAS) — Passa Sete, Água Quente, São José do Jassém e parte do Beco — situadas logo abaixo da barragem de rejeitos e que também serão reassentadas em breve. Entretanto, apesar do avanço de alguns pontos da negociação, o Plano de Gondó não contemplou toda a comunidade, deixando de fora 76 famílias que reivindicam o direito ao reassentamento.

É importante destacar que algumas famílias que estão em Gondó já foram reassentadas, há cerca de 16 anos, e serão reassentadas pela segunda vez pela Anglo American. Devido à essa reincidência, em setembro de 2023, o Ministério Público entrou com Ação Civil Pública (nº 5001738-55.2023.8.13.017) na Comarca de Conceição do Mato Dentro, requerendo que a Anglo American pague danos morais individuais e coletivos. Entre os valores solicitados: 500 mil reais estão previstos para cada uma das 9 famílias identificadas à época; 5 milhões de reais serão destinados aos danos coletivos, às comunidades atingidas pela mineração na região; além de danos ambientais, com pedido de 70 mil reais a ser destinado à Polícia Militar Ambiental atuante no município.

Essa situação evidência que, dentre as 76 famílias, existem ainda aquelas que já foram reassentadas e que atualmente estão privadas de direitos para novas negociações. São famílias excluídas da lista de elegibilidade, por não serem reconhecidas como atingidas pela Anglo American, apesar de afirmarem sofrer os mesmos danos. Essa exclusão gera impactos diretos na vida de moradores como Maria da Paz Silva, que nasceu e cresceu na comunidade e enfrenta dificuldades para obter respostas da empresa. Sem perspectiva de reassentamento, ela conta como é conviver na comunidade após o início das operações do complexo Minas-Rio:

“Do jeito que eles me tratam, eu me sinto abandonada. A gente liga pra lá, eles falam que vem e não vem. Estamos tomando água ruim, o ar está poluído, a alimentação… Tudo poluído. A Anglo deveria respeitar todos os direitos nossos, porque a gente mora do lado de cá do rio [Santo Antônio], que eles falam que não consideram, mas todo mundo é prejudicado, tanto pelo ar, quanto pela água”, desabafa Maria da Paz.

Diante da exclusão das famílias, foram feitas tentativas para rever o limite da comunidade apresentado pela Anglo American. Em setembro de 2022, o órgão estadual licenciador da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) encaminhou à Anglo American o Ofício 81, documento que solicita a revisão da delimitação e caracterização do território de Gondó. Como resposta, a mineradora apresentou um estudo que não considera as localidades de Diamante, Solidão, Ribeiro, Fazenda Paulista e Retiro São Francisco no Plano de Reassentamento, alegando que não estão dentro da Área de Influência Direta (AID) da empresa. A análise foi questionada pela Assessoria Técnica Independente, em outubro de 2023, e contestada pelo parecer técnico da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Gestão Urbana de Conceição do Mato Dentro, de junho de 2024.

Falta de respostas  

Enquanto não há resposta do órgão licenciador sobre o impasse, a moradora Neusa Saldanha, que possui propriedade às margens da MG-010, bem próxima à cava da mina e não foi incluída no Plano de Reassentamento, expressa sua frustração:

“Passam 1, 2, 3…14 anos sem nenhuma solução. É muito deprimente. É injusto porque são mais de 100 famílias, por que só a metade está inclusa? A gente se sente excluídos mesmo, como se a gente não existisse. A gente tem tudo, as documentações, participações em reuniões e isso deixa a gente muito angustiado. É muito triste. A gente vive em sociedade, busca por justiça e acaba sendo injustiçado”.

Segundo o Nacab, que assessora as pessoas atingidas, além de casos como os de Maria da Paz e Neusa Saldanha, há ainda moradores que vivem dentro da área de abrangência e não tiveram o direito à negociação, como ocorre na localidade Buritis. De acordo com a listagem da mineradora, estão elegíveis ao reassentamento apenas 74 dos 144 núcleos familiares de Gondó identificados pela ATI Nacab. Há também o registro de seis núcleos familiares que estão na área de abrangência e não foram incluídos. Assim, 76 famílias estão excluídas do Plano de Reassentamento.

A assessoria Nacab avalia que a morosidade na resposta ao Ofício 81 e a exclusão dessas famílias do Plano de Reassentamento levantam questionamentos sobre os critérios adotados pela Anglo American e a necessidade urgente de revisão do processo, para garantir equidade no atendimento às famílias atingidas.

Delimitação do território de Gondó

Em junho de 2024, a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Gestão Urbana de Conceição do Mato Dentro apresentou o Parecer Técnico nº 01/2024, que define os limites de Gondó, na zona rural do município. Segundo o documento, junto a Buriti, Durão 1 e 2 e Gondó Central, as localidades de Solidão, Diamante, Retiro São Francisco, Fazenda Paulista e Ribeiro também compõem o povoado.

A delimitação pelo município considerou dados da Cartografia das Afetações realizada pela Cáritas ATI 39 em 2022, a legislação vigente e informações do uso do solo e da bacia hidrográfica da região. O parecer afirma que as localidades de Gondó estão em uma mesma sub-bacia hidrográfica e sofrem igualmente os impactos das atividades da Anglo American.

No momento, é aguardada manifestação do órgão licenciador ambiental, em relação aos estudos protocolados pela Anglo American e ao parecer técnico da Secretaria do Meio Ambiente do município, para determinar se a comunidade será considerada em sua completude no cumprimento de obrigações da mineradora.

* Com informações do Nacab.