Anglo American vira ré por violações de direitos humanos em Conceição do Mato Dentro

Mineradora será investigada por danos socioambientais causados a nove famílias reassentadas da comunidade Gondó

Anglo American vira ré por violações de direitos humanos em Conceição do Mato Dentro
Conceição do Mato Dentro se prepara estruturalmente para suportar “boom” da mineração. Foto: divulgação

O Ministério Público de Minas Gerais (MP/MG) ajuizou a Ação Civil Pública (ACP) de comunidades em Conceição do Mato Dentro contra a Anglo American pelos danos socioambientais decorrentes da atividade minerária. A ACP apresentou ao Poder Judiciário o quadro de violações de direitos humanos que nove famílias reassentadas em Gondó e Retiro São Francisco vêm sofrendo por conta da atividade minerária na região. 

Danos

Embora já reassentadas há aproximadamente 15 anos, essas famílias ainda têm diversos de seus direitos legais e contratuais violados, uma vez que foram para uma Área de Influência Direta (AID) da Anglo American. Valter mora a 1km da serra explorada e relata inúmeras experiências negativas devido à presença da mineração: “Quando a gente vê uma vibração dessas, uma detonação, as vasilhas chegam a cair das prateleiras”, conta. Seu Valtinho morava em uma localidade de barragem de rejeitos e mora em Gondó desde 2011.

Estudos apresentados pela Assessoria Técnica Independente (ATI) 39 da Cáritas ao MP demonstram vários problemas que essas famílias sofrem cotidianamente, como perda dos laços comunitários, ausência de registro de propriedade, falta de água potável, barulho, poeira, rachaduras nas casas e comprometimento da saúde mental. 

Os problemas acabam afetando também a produção de alimentos como milho, feijão e mandioca para a comunidade. Seu Valtinho conta que sua mulher é contemplada pela Declaração de Aptidão (DAP) ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e deixa de fornecer alimentos para escolas do município por causa da contaminação pelo minério. “De uns anos pra cá, já caiu a produção. A água foi faltando, teve até que caminhão-pipa abastecer a gente porque as nascentes secaram. A água que nascia lá embaixo da serra ficou muito poluída”.

Além disso, a mineradora também não realizou o registro de propriedade. “Quando transferiram a gente pra cá, disseram que, no máximo, seis anos a gente já estaria com a documentação do terreno. Isso foi em 2011 e eles [a Anglo American] ainda não forneceram pra gente o documento do terreno”, relata Valtinho, que chegou a receber uma oferta em sua casa, mas não encontrou outra em um valor que pudesse arcar. 

A ACP

De acordo com a ATI Cáritas, a ação civil é uma conquista da comunidade que, desde o início do Programa de Comitê de Convivência em Gondó, vem relatando os contínuos danos da mineração na comunidade e em seus modos de vida. 

A primeira assembleia na comunidade aconteceu em setembro de 2022, quando o MP sinalizou que a Anglo American deveria indenizar as famílias reassentadas por danos morais. Foi a partir daí que a empresa formalizou o Comitê de Convivência de Gondó, com o objetivo de discutir com o povoado os impactos da mineração e buscar resoluções para suas demandas coletivas.

Desde então, aconteceram cinco reuniões do Comitê de Convivência. Esses encontros se tornaram momentos em que as atingidas e atingidos de Gondó puderam relatar a representantes do MP os danos sofridos pela comunidade. Além disso, as famílias puderam propor e cobrar a resolução de seus problemas à Anglo American. 

Após ser ajuizada, a ACP será primeiramente julgada na Vara da Comarca de Conceição do Mato Dentro-MG. Ainda cabe recurso no Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) e, posteriormente, nas instâncias superiores. 

O que a Ação Civil Pública solicita ao Poder Judiciário como indenização às famílias reassentadas de Gondó?

1) A indenização de, no mínimo, R$500.000,00 para cada uma das nove famílias reassentadas em Gondó para reconhecimento do dano moral individual. Esse valor deverá ser depositado em conta bancária a ser indicada por elas.

2) Pagamento de dano moral coletivo no valor de R$ 5.000.000,00 a ser depositado em conta judicial especificamente para tal finalidade. Caberia ao Programa de Apoio a Projetos da Região Central — PROAP CENTRAL a indicação das destinações em favor de projetos sociais, ambientais, de fiscalização, de proteção e de reparação do meio ambiente;

3) O valor da indenização deverá ser aumentado proporcionalmente de acordo com o tempo de permanência das famílias no território;

4) Condenação da Anglo American ao pagamento de danos ambientais no valor de R$ 70.072,98. O valor seria revertido em favor da Polícia Militar Ambiental em atuação na comarca de Conceição do Mato Dentro.