Aprovação do marco temporal pela CCJ do Senado pode acirrar tensão com STF
O argumento dos parlamentares é de que os ministros do STF estariam invadindo as competências do Congresso Nacional
O projeto de lei do marco temporal foi aprovado nesta quarta-feira (27) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal. A votação na Casa do Legislativo veio como resposta ao Supremo Tribunal Federal (STF), que rejeitou, na última semana, a tese por 9 votos a 2.
O argumento dos parlamentares é de que os ministros do STF estariam invadindo as competências do Congresso Nacional. A ideia conta com o apoio do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Os parlamentares de oposição ao governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pretendem intensificar ações visando contrapor ao STF. O marco temporal deve ser discutido também em uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), apresentada pelo senador Dr. Hiran (PP-RR).
Apesar de ter rejeitado a tese do marco temporal no dia 21 de setembro, o STF retoma nesta quarta-feira a discussão sobre a tese que ficará definida sobre o tema, que tem repercussão geral — ou seja, servirá de parâmetro para a resolução de, pelo menos, 226 casos sobre demarcação de terras que estão suspensos. Essa será a última sessão da ministra Rosa Weber como presidente da Corte.
Um dos pontos polêmicos da sessão é a indenização aos não-indígenas que ocuparam as terras dos povos originários de “boa-fé”, ou a compensação aos indígenas nos casos em que não é possível fazer a demarcação.
Em discussão
Um dos principais pontos em discussão no marco temporal é o pagamento de indenizações para não-indígenas que ocuparam as terras de povos originários de “boa-fé”, assim como a compensação financeira aos indígenas nos casos em que não é possível fazer a demarcação de áreas.
Nesse sentido, a oposição ao governo Lula deve ter uma vitória na CCJ do Senado. O tema conta com apoio de senadores de diferentes partidos, incluindo nomes que normalmente votam com o governo em outras matérias.
A proposta que tramita na CCJ trata da demarcação de terras indígenas ocupadas até 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição da República, estabelecendo que só as áreas ocupadas ou em disputa até essa data estariam aptas para a demarcação.
Novos capítulos
A oposição no Senado tem foco também em outros temas que foram julgados ou estão sendo analisados pelo STF.
- Aborto: a ação pode acabar descriminalizando o procedimento até o 3º mês e já conta com um voto favorável no STF. Porém, o Congresso articula um plebiscito popular para tratar do tema;
- Porte de drogas: a ação trata da descriminalização para uso pessoal e possuí cinco votos favoráveis ao porte de maconha. No Congresso, há uma PEC tramitando para criminalizar o porte para uso pessoal;
- Piso da enfermagem: a Corte possui uma ação que contesta a lei que determina o pagamento do novo piso da enfermagem, porém, o pagamento está autorizado por meio de decisão liminar. A advocacia do Senado está questionando a medida que liberou as novas remunerações para enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem e parteiras;
- Imposto sindical: o STF se mostra favorável à “contribuição assistencial” de sindicalizados e não sindicalizados; já o Congresso é contrário e anunciou que vai obstruir essa pauta;
- Casamento homo afetivo: o STF reconheceu a união homo afetiva como núcleo familiar. a Câmara discute um projeto de lei que pretende vetar o casamento entre pessoas do mesmo sexo;
- Marco civil da internet: o STF terá que lidar com ações que contestam dispositivos que abordam a responsabilidade de big techs; já a Câmara discute a regulamentação das redes sociais.
Votação na CCJ
Nesta quarta-feira, a CCJ aprovou o relatório do projeto de lei que estabelece a tese do marco temporal para a demarcação de terras indígenas. Os senadores rejeitaram um único destaque envolvendo o contato de povos indígenas isolados.
Por 16 votos a 10, a CCJ deu aval ao texto, em uma vitória da bancada ruralista contra o governo — especialmente os partidos de esquerda. Senadores de partidos de centro e direita que têm cargos no governo (como PSD, União Brasil, PP e Republicanos) votaram a favor da proposta.
O texto do relator, o senador Marcos Rogério (PL-RO), é favorável à tese do marco temporal. Por essa regra, os indígenas só teriam direito à demarcação de terras que ocupassem no momento da promulgação da Constituição Federal de 1988.
O projeto foi aprovado em maio na Câmara dos Deputados por 283 votos a 155.
Além da tese do marco temporal, o relatório aprovado pelos senadores também prevê uma flexibilização da política de não-contato dos povos indígenas isolados, permitindo que entidades privadas tenham contato com esses povos para viabilizar ações consideradas de utilidade pública.
Outro ponto polêmico é a autorização para garimpos e plantações de transgênicos em terras indígenas e a celebração de contratos entre indígenas e não-indígenas para explorar atividades econômicas nos territórios tradicionais.