Cáritas, vereadores e deputada estadual querem audiência pública para discutir novas pilhas de rejeito da Vale em Itabira
A proposta, segundo a Cáritas, pode causar rebaixamento do lençol freático e aumentar a poluição atmosférica, sem oferecer nenhuma compensação ambiental para Itabira
12 vereadores da Câmara Municipal de Itabira assinaram nesta terça-feira (11) um abaixo-assinado com o objetivo de promover uma audiência pública para discutir o pedido de anuência da mineradora Vale, que pretende ampliar as cavas de Conceição e Minas do Meio – que fazem parte do Complexo Minerador de Itabira. Quem está à frente da iniciativa é a Cáritas Diocesana, entidade representante do Conselho Municipal de Meio Ambiente (Codema) e que também recebeu apoio da deputada estadual Bella Gonçalves (PSOL).
A proposta de ampliação feita pela Vale não irá aumentar a capacidade produtiva do local, mas busca aumentar o limite das cavas, podendo expandir o beneficiamento de minério de ferro no local em até 19 anos. Para aumentar a área de lavra das reservas de minério, será necessário implantar uma “Pilha de Disposição de Rejeitos Filtrados” e uma “Pilha de Estéril de Contrapilhamento”. A proposta, segundo a Cáritas, também pode causar rebaixamento do lençol freático, aumentar a poluição atmosférica na cidade e suprimir 378,37 hectares de mata nativa, cortando 520 árvores nativas isoladas
Como contrapartida, a Vale não oferece nenhuma compensação ambiental para Itabira, mas prevê a doação de área ao Parque Nacional do Gandarela (com sede em Rio Acima) e R$576.135,00 para se investir em projetos selecionados pelo ICMBio – que atendam aos componentes do Programa Nacional de Conservação do Patrimônio Espeleológico.
Confira a lista dos vereadores que assinaram a proposta:
- Carlos Henrique Silva Filho “Carlin Sacolão Filho” (Solidariedade)
- Marcelino Freitas Guedes (PSB)
- Dulce Citi Oliveira (PDT)
- Leandro Pascoal (PSD)
- Hudson Junio Diogo Santos “Yuyu da Pedreira” (PSB)
- Juber Madeira Gomes (PRD)
- Luiz Carlos de Souza (MDB)
- Jordana Madeira Dias (PDT)
- Bernardo de Souza Rosa (PSB),
- Marcos Antônio Ferreira da Silva “Marquinhos da Saúde” (Solidariedade)
- Elias dos Reis Lima (Solidariedade)
- Cidinei Camilo Rabelo “Didi do Caldo de Cana” (PL)
Veja quem não acompanhou o abaixo assinado:
- Rodrigo Alexandre Assis Silva “Diguerê” (MDB)
- Heraldo Noronha Rodrigues (Republicanos)
- Reinaldo Soares Lacerda (PSB)
- Carlos Henrique de Oliveira (PDT)
- Ronaldo Meireles de Sena “Capoeira” (PRD)
O prazo legal para realizar a audiência pública desejada pela Cáritas venceu em 2023, 45 dias após a Vale protocolar o pedido de ampliação das cavas na Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad). Este, inclusive, foi o motivo pelo qual o vereador Rodrigo Diguerê não quis assinar o abaixo-assinado.
No entanto, na avaliação do representante da Cáritas, Leonardo Ferreira, o prazo era desconhecido e o Codema ainda pode propor a audiência de maneira autônoma, apesar do processo ser uma competência do Estado. A razão para tal seria o artigo 7°, parágrafo XII, da lei municipal n°5.186: “É atribuição do Codema realizar e coordenar audiências públicas, quando for o caso, visando a participação da comunidade nos processos de instalação de atividades potencialmente poluidoras”.
“Com o pedido de vistas, cria-se uma oportunidade para que esse conselho tome uma decisão histórica: convocar audiência pública para que a população de Itabira decida quais condições considera necessárias para que sejam cumpridas pela mineradora para mitigar os impactos socioambientais que causa ao povo itabirano”, comunicou Leonardo Reis, representante da Cáritas, em parte da apresentação feita na Câmara de Itabira. Foto: Guilherme Guerra/DeFato
Deputada estadual envia ofício ao Codema
Ainda na terça-feira (11), a deputada Estadual Bella Gonçalves (PSOL) encaminhou um ofício ao Conselho do Meio Ambiente de Itabira, apontando a necessidade de realizar a audiência pública para discutir os impactos socioambientais do projeto da mineradora Vale na cidade. No texto, Bella também reforçou que existe a necessidade de se pensar em contrapartidas para superação da minero-dependência no município.
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Pedido de anuência será votado amanhã
O pedido de anuência da Vale chegou a ser discutido na última reunião do Codema, ocorrida no dia 14 de fevereiro. No entanto, após longa discussão sobre a ausência de estudos de impactos socioambientais, possíveis efeitos no abastecimento de água em Itabira e outros problemas que poderiam ser causados às comunidades do entorno, a proposta teve pedido de vista concedido.
Apesar de contrariado por parte do Conselho de Meio Ambiente sobre a necessidade do envio dos documentos, outras quatro entidades acompanharam o pedido de vista coletivo feito pela Cáritas, sendo elas: o Sindicato Metabase de Itabira e Região, a Funcesi, a Associação Comercial, Industrial, de Serviços e Agropecuária de Itabira (Acita) e o Serviço Autônomo de Água e Esgoto (Saae).
Com tempo para avaliar o Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (Eima/ Rima) – que não estavam anexados ao pedido da Vale -, o representante da Cáritas, Leonardo Reis, constatou que a proposta da Vale pode rebaixar o lençol freático e aumentar a poluição atmosférica em Itabira.
Segurança hídrica
De acordo com Leonardo Reis, uma pesquisa realizada na Universidade Federal de Itajubá – Campus Itabira, em 2024, apontou que 75,25% das outorgas de água no município são destinadas para a mineração, enquanto somente 19,18% são voltadas para o consumo humano. Esta seria a maior diferença entre os municípios minerados da Bacia do Rio Piracicaba.
Na apresentação feita pelo representante da Cáritas é informado que, através do parecer técnico CGA n° 78/2024, a proposta de ampliação das cavas causará o rebaixamento do nível de água na Mina Conceição e nas Minas do Meio. O aumento da vazão na Mina Conceição subirá de 650m³/h para 1663 m³/h, enquanto nas Minas do Meio o consumo de água subirá de 1590 m³/h para 1773m³/h
Segurança das pilhas de estéril
Atualmente, existem 12 pilhas de estéril e duas pilhas de rejeito compactado já construídas em Itabira. Com a ampliação das cavas está prevista a construção de mais duas pilhas de rejeito e estéril, onde segundo a Cáritas, não foram considerados dentro dos estudos de impacto, os efeitos das mudanças climáticas e eventos extremos. Ainda de acordo com o representante da Cáritas no Codema, “não existem informações claras sobre a segurança das barragens e muito menos das pilhas de estéril existentes ou a serem construídas em Itabira”.
+ Vale quer aumentar cavas e criar pilhas de estéril sem oferecer compensação ambiental para Itabira
Poluição atmosférica
Recorrentemente a cidade de Itabira é invadida por poeira, que muitas vezes ultrapassam os limites legais e aumentam os casos de problemas respiratórios, principalmente entre crianças e idosos.
Na apresentação da Cáritas foi informada uma pesquisa da professora Ana Vasques, apontando que, se padrões ainda mais rigorosos de poluição atmosférica fossem adotados em Itabira, poderiam ser evitadas 41 internações por doenças respiratórias, 28 internações por doenças cardiovasculares e 40 mortes prematuras de adultos maiores de 30 anos. Ainda de acordo com a apresentação, um estudo da pesquisadora Mariana Morozesk encontrou valores de poluição atmosférica de 2 a 3 vezes maiores do que a repassada pela Vale ao poder público municipal.
Segundo parecer CGA n°78/2024, com a ampliação das cavas e a construção das pilhas de estéril e rejeito que a Vale está pedindo anuência ao Codema, a quantidade de particulado atmosférico será ultrapassado 8 a 10 vezes por ano, com relação ao máximo permitido pela Conama 491/18 (lei estadual que é mais branda que a lei municipal). Partículas menores (Pn2,50 e Pn10), que são mais prejudiciais à saúde, também irão ultrapassar os limites legais mais vezes que já fazem atualmente.
Ampliação das cavas
A cava Mina Conceição (CCE), tem uma massa de 434.7 milhões de toneladas (Mt) de minério, com um teor médio de 45.70% de ferro (Fe) e relação estéril-minério de 0.63:1t/t. Caso o projeto seja aprovado, a Mina Conceição ocupará uma área de aproximadamente 428,471 héctares (ha), dos quais 104,96ha são de área nova e o restante referente a atual cava. Sua configuração terá um talude de altura máxima de 635 metros (cota da crista mais alta – cota do pé mais baixo), enquanto seu banco mais alto será a cota 1140m e o mais baixo ficará na cota 505m.
Já a cava Minas do Meio (MMI) possui uma massa de 628.3 milhões de toneladas (Mt) de minério, com um teor médio de 45.87% (Fe) e relação estéril-minério remanescente de 2.34:1t/t. Caso o projeto seja aprovado, a cava Minas do Meio ocupará uma área de aproximadamente 911,111 hectares (ha), dos quais 501,42 ha são de área nova e o restante referente a atual cava. Sua configuração terá um talude de altura máxima de 760 metros (cota da crista mais alta – cota do pé mais baixo), enquanto seu banco mais alto será a cota 1190m e o mais baixo ficará na cota 430m.
Pilhas de rejeitos filtrados e de estéril
A PDER ITA-CAU-01 deverá atender os rejeitos filtrados da Usina Conceição e estéreis oriundos da cava Minas do Meio, Cauê e Conceição. A estrutura ocupará uma área útil de 306,052 hectares (ha), onde volume a ser disposto na pilha é de, aproximadamente, 89.460.000 de metros cúbicos.
De forma semelhante, a “Casa da Velha/Ipoema” receberá estéril proveniente da Mina Cauê, que será contrapilhada às estruturas existentes denominadas PDE Casa da Velha (implantada) e PDE Ipoema (implantada) e a PDER Ipoema Borrachudo (em operação). A “Casa da Velha/Ipoema” ocupará uma área de 132,734 hectares (ha), tendo capacidade de receber aproximadamente 30,2 milhões de metros cúbicos de estéril.
Para construir as estruturas de PDER ITA-CAU-01 e “Casa da Velha/Ipoema” será necessário suprimir 378,37 hectares de mata nativa e intervir em 58,66 hectares dentro de área de preservação permanente (APP), localizada no entorno das minas. Desta forma, serão cortadas 520 árvores nativas isoladas, que serão redistribuídas em 115,63 hectares.