Contra aumento concedido à Fazenda, servidores de Itabira acionam Ministério Público
Alvo dos protestos é a lei nº 5347, sancionada em dezembro de 2021
No dia 22 de dezembro de 2021, a Prefeitura de Itabira sancionou a lei nº 5347, no que parecia ter sido a pá de cal em um tema que gerou muita discussão. No entanto, o assunto ainda passa longe de um fim.
Oriunda do projeto de lei nº 112/2021, a norma, dentre outras medidas, cria o Prêmio de Superação de Metas e Arrecadação de Tributos (Presmat) para os servidores da Secretaria Municipal da Fazenda. Na prática, os profissionais da pasta, entre eles ATAS (assistentes técnicos administrativos) e procuradores jurídicos, receberiam gratificações e bonificações caso alcançassem determinados objetivos.
Alguns cargos poderiam receber premiações que chegam a até R$ 3000 a cada três meses, totalizando, dessa forma, R$ 12 mil ao ano. No próprio portal da transparência do município, é possível perceber que houve casos de profissionais que mais do que dobraram o salário com o impulso do Presmat. Você pode conferir mais detalhes nas imagens abaixo.
A proposta, que virou lei, foi alvo de críticas de diversos servidores pertencentes a outras pastas. Para o grupo, o aumento gera uma disparidade financeira entre as áreas. Durante várias reuniões da Câmara, quando o projeto ainda estava sendo discutido, foram realizados protestos que pediam as gratificações para todos os servidores municipais.
Sem conseguir sucesso junto aos vereadores e dentro da Prefeitura, um grupo com pouco mais de 200 ATAS acionou o Ministério Público de Itabira. Na denúncia – hoje enquadrada em notícia de fato, um procedimento interno do órgão para apurar queixas encaminhadas a ele – formalizada no dia 6 de abril, os servidores citam a falta do princípio da impessoalidade e da isonomia salarial na lei sancionada por Marco Antônio Lage (PSB). Além disso, afirmam que a medida promove “a desunião da classe e a injustiça salarial”. Confira a íntegra da denúncia abaixo.
Incoerência
À DeFato Online, uma servidora municipal, que preferiu não se identificar, questionou o porquê dos vencimentos atuais da Fazenda estarem tão acima dos demais setores da Prefeitura.
“Nosso questionamento no Ministério Público é: se os ATAS têm a mesma função ou funções parecidas; a mesma nomenclatura; prestaram o mesmo concurso; têm o mesmo nível de escolaridade, por que eles vão receber esse Presmat e outros não?”, argumenta.
A servidora também citou uma reclamação enviada a Marco Antônio Lage, em fevereiro, na qual protestavam contra a lei (você pode ver o documento logo abaixo). No entanto, ressalta, não houve nenhuma resposta do prefeito itabirano, o que motivou o grupo a acionar o MP. Segundo ela, faltou bom senso do pessebista e vereadores da cidade, que aprovaram o PL 112/2021 por unanimidade.
“Queremos deixar bem claro que não temos nada contra os servidores da Fazenda. Mas qual foi a isonomia desta lei? Estamos questionando a falta de bom senso do prefeito e vereadores, que aprovaram a lei dessa forma. Nós estamos lutando para que a gente também receba a gratificação por superação de metas, porque a minha tem uma meta, a Fazenda tem meta, a Saúde tem meta. Claro que dinheiro é importante para o município, mas saúde não é? A educação não é? A Assistência Social não é? Então se a Secretaria da Fazenda, que mexe com dinheiro, é importante, quem faz o serviço acontecer com esse dinheiro também é. E estamos lutando por isso”, reclama.
Atuação do sindicato
A reportagem da DeFato também questionou porque o grupo não recorreu ao Sindicato dos Servidores de Itabira, hoje presidido por Auro Gonzaga, recém reeleito. De acordo com a servidora, a entidade chegou até a apoiar a lei.
“Não (sentem confiança no sindicato). Na verdade, o sindicato apoiou essa lei. Essa lei foi acoplada a algumas poucas benfeitorias ao servidor, como aumentar o número de ata 1 para 2. Outra foi que o cartão alimentação era para quem recebia até pouco mais de R$ 2000 e ele (Marco Antônio Lage) colocou para quem recebe cerca de R$ 4600. Então ele acoplou essas migalhas a essa lei e o sindicato aceitou de bom agrado. E os vereadores disseram que não votariam contra o servidor. Bom, não votaria contra o servidor mas a favor de apenas alguns? Porque essa lei poderia ter sido modificada. O sindicato poderia falar ‘não, calma lá, vamos diminuir um pouco a gratificação mas vamos dar para todo mundo'”.
A servidora ainda critica outras supostas “manobras” contidas na norma, sancionada em dezembro do ano passado. “Nessa lei o salário mínimo dos advogados passou para R$ 9 mil. Mudou de advogado para procurador jurídico para isso (promover o aumento). Tem auditor que dobrou o salário, recebendo, em líquido, R$ 11 mil. Estamos nos sentindo humilhados, desmotivados e injustiçados. Tenho mais de 10 anos de Prefeitura e nunca vi tal absurdo na minha vida”, desabafa.
“Todos os ATAS estão insatisfeitos. E os técnicos também. Você vai pegar qualquer técnico, ele recebe R$ 2800 reais. Um auditor está recebendo R$ 9 mil. Um ata que tem a base de R$ 1500, esse mês recebeu R$ 6 mil. Então não somos só nós, ATAS, que estamos desmotivados, mas toda a Prefeitura. À exceção dos servidores e procuradores da Fazenda.”
Justificativa infundada
Um dos argumentos utilizados por profissionais da Fazenda durante as intensas discussões que antecederam a sanção da lei é de que o serviço da pasta seria mais técnico que os demais. Porém, a manifestante contesta tal ideia.
“O ata da Secretaria de Educação faz o serviço da Fazenda, o contrário também. Claro que se um ata da Fazenda chegar na minha secretaria, vou ter que passar as coordenadas para ele. Da mesma forma, o contrário. Mas é um serviço administrativo. Qualquer ata faz o trabalho da Fazenda ou de outra secretaria. Esse serviço técnico que citam foi um modo de justificar o prêmio, mas nós discordamos”, afirma.
Ela criticou, inclusive, o repasse financeiro feito pela Prefeitura aos trabalhadores da Educação e da Saúde, não o considerando suficiente. Enquanto a Saúde foi bonificada pelos serviços prestados durante a pandemia, os servidores da Educação receberam uma espécie de compensação pelos gastos no mesmo período, já que precisaram recorrer a outras alternativas de ensino.
“Os servidores da Saúde, com essa pandemia, ficaram muito expostos e receberam R$ 1 mil, como se fosse resolver a vida de todo mundo! Aí vem a Fazenda e vai receber R$ 3 mil de três em três meses. Na Educação, os professores não pararam, trabalharam em casa com os alunos. E os ATAS que não poderiam trabalhar em casa foram remanejados para outras secretarias. Foi uma ignorância do governo fazer isso, podemos chamar de privilégio.”
A servidora ainda defende que, caso a denúncia não prospere no âmbito municipal, o grupo irá recorrer ao Ministério Público de Minas Gerais. Ela também não descarta chegar à esfera federal. “Não vamos parar”, conclui.