Drummond e a diversificação econômica de Itabira

Drummond, um dia, nas páginas de um Boitempo, enalteceu a consistente diversificação socioeconômica de sua terra, numa época já tão distante

Drummond e a diversificação econômica de Itabira
Memorial Carlos Drummond de Andrade, no Pico do Amor, em Itabira – Foto: Divulgação
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Carlos Drummond de Andrade é eclético, multicultural.  As suas magníficas obras são convite a um mergulho na imensidão do conhecimento humano.  Farmácia era a formação acadêmica do “Gauche”. Eventualmente, em curto período, exerceu a função de professor de geografia e português no tradicional (infelizmente extinto) Ginásio Sul-Americano de Itabira. A prática docente, porém, não passou de momentâneo biscate.  Ainda bem!

Os poemas desse gênio da literatura denotam o notável talento de um inigualável “eu lírico”. Na extensa produção do fino modernista há muito de filosofia, história, sociologia, antropologia, psicologia e até psiquiatria.  Carlos Drummond e Sigmund Freud se encontram em alguns momentos. O “Menino Antigo” via (e percebia) tudo.  Carlos é o ser tipicamente itabirano e, portanto, uma entidade complexa. Graças a essa natural circunstância, o Poeta Maior se tornou um garimpeiro da alma humana. E tem mais. Ele assistiu ao nascimento de suposto eldorado “com 500 milhões de toneladas de hematita (de teor superior a 65% de ferro), com quantidade capaz de abastecer 500 mundos durante 500 séculos” Quanto exagero! Em menos de cem anos, toda essa grandiosidade virou poeirenta utopia.

Agora, o “sonho eterno” está prestes a se tornar rejeito (literalmente). Hoje, Itabira procura desesperadamente por um bote salva-vidas, ou a perdida diversificação econômica.  Perdida? Como assim?  Nos tempos de Mato Dentro floresceu uma infinidade de empreendimentos na “Cidadezinha Qualquer”. Pequenas e médias empresas movimentavam a economia local. Havia duas grandes fábricas de tecidos, algumas vinícolas, importantes forjas e também exuberante agricultura.

Aí chegou o aventureiro Percival Farquhar com a sua usina de ilusões (a tal Itabira Iron) e botou uma lápide nesses promissores negócios. Assim morreu a vocação inicial de Itabira. A mão de obra ficou escassa. Era impossível competir com a sanha do explorador americano. Drummond, um dia, nas páginas de um Boitempo, enalteceu a consistente diversificação socioeconômica de sua terra, numa época já tão distante. A façanha foi contada no poema “Tantas Fábricas”. Vale (????) a pena conferir e morrer de saudade (ou inveja) dessa Itabira de ontem:

Tantas Fábricas

A fábrica de café de João Acaiaba
A fábrica de sabão de Custódio Ribeiro
A fábrica de vinho de João Castilho
A fábrica de meias de François Boissou
A fábrica de chapéus de Monsenhor Felicíssimo
A fábrica de tecidos de Doutor Guerra
A fábrica de ferro do Girau do Capitão Aires
A fábrica de sonho de cada morador
A fábrica de nãos do governo longínquo
A fábrica de quê? Na intérmina conversa
Que rumina o milagre
E cospe de esquerda
No chão

Mato Dentro era assim. Uma fábrica em cada verso e o Distrito Industrial numa única estrofe.

Fernando Silva é jornalista e escreve sobre política em DeFato Online.

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