“Falta humanidade!”: moradores do Bela Vista e Nova Vista detonam Vale em reunião sobre o Sistema Pontal

Para os moradores, a empresa não tem acompanhado o drama diário enfrentado com a poeira, os ruídos, vibrações e demais impactos da atividade minerária

“Falta humanidade!”: moradores do Bela Vista e Nova Vista detonam Vale em reunião sobre o Sistema Pontal
Foto: Guilherme Guerra/DeFato
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A mineradora Vale promoveu na noite de quinta-feira (17) mais um encontro com moradores dos bairros Bela Vista e Nova Vista para atualizar sobre as obras de descaracterização de barragens a montante no Sistema Pontal, em Itabira. Mais do que apresentação de dados de monitoramento geotécnico e controle de índices, o que chamou a atenção na reunião foi a insatisfação geral dos moradores com a empresa. ‘‘Aqui está parecendo uma faculdade, toda a parte teórica é dada, muito bem explicada, mas a parte prática está faltando’’, afirmou Maria Inês de Alvarenga Duarte, moradora do bairro Bela Vista. 

 

Ela seguiu enfática ao dizer que a Vale não tem acompanhado o drama diário enfrentado pelos moradores com a poeira, ruídos, vibrações e demais impactos da atividade minerária. Todos esses temas haviam sido abordados pelos representantes da mineradora momentos antes, em uma apresentação com dados e índices levantados nos últimos meses. 

Segundo a Vale, entre maio e junho deste ano, nos períodos da manhã e da tarde, foram realizados 141 monitoramentos de ruído na região. 92,9% deles estavam dentro do limite estabelecido e outros 6,4% foram interrompidos por problemas técnicos. Os 0,7% restantes superaram tal limite, que não foi informado na apresentação. A mineradora também realizou 138 monitoramentos de vibração, onde 96,4% ficaram dentro do permitido e 3,6% foram interrompidos por problemas técnicos. 

Tema recorrente no que diz respeito aos impactos da mineração, a qualidade do ar também passou por inspeção. 80 registros foram coletados em duas estações localizadas no Bela Vista e Campestre, sendo: 86% dos casos dentro do correto e 14% deles interrompidos por “quedas de energia elétrica”. Ainda de acordo com a Vale, os dados são coletados de segunda à sábado, durante o dia.

Para tentar minimizar os danos das suas atividades, a empresa afirmou que realiza a umectação das vias de acesso ao Sistema Pontal e das praças onde são feitas as obras de escavação e depósito de material. Ainda conforme a Vale, mais de 100 hectares de áreas degradadas foram recuperados de 2022 para cá, o que representa aproximadamente 100 campos de futebol.

Não é bem assim…

No entanto, para os moradores essas ações são pouco efetivas e os dados não são tão precisos assim. “Nos dias em que mais se tem poeira, por coincidência, o aparelho estraga? Isso é um absurdo. Eu acho que é mentira esse monitoramento, tanto da Vale quanto do Codema [Conselho Municipal de Meio Ambiente]”, criticou Agmar Inês. 

Foto: Guilherme Guerra/DeFato

Como você pega um prato e almoça se na sua porta está um mau cheiro terrível? Não adianta a Vale instalar um posto de atendimento, acho que é jogar dinheiro fora. Se ela colocasse pessoas nas ruas, percebendo e sentindo o que os moradores estão vivendo, dia e noite, eu acho que teria mais humanidade por parte da Vale. Eu acho que o que falta por parte da Vale é se colocar no lugar dos moradores, falta humanidade”, voltou a criticar Maria Inês, se referindo também a um vazamento de esgoto nas áreas da mineradora.

Duas casas no mesmo lote: uma recebeu indenização, a outra não 

Outro ponto que chamou atenção no encontro foi levantado pelo advogado Bruno Donato, que representa um morador do bairro Bela Vista. Segundo Donato, o imóvel do seu cliente foi incluído na fase 1 das negociações da Vale, em um terreno onde há duas casas: a do seu cliente e a de uma prima. Com a mulher, já foi feito um acordo, pagamento de indenização e conclusão das negociações. Com o rapaz, as tratativas não avançaram.

“A gente questionou, fomos na NMC [empresa contratada pela Vale], fizemos reuniões, eles fizeram a vistoria na casa e coletaram todas as informações. Isso foi no dia 4 de maio e desde então não tem nenhuma resposta”, relatou Bruno Donato.

Foto: Guilherme Guerra/DeFato

Após apontar a questão, o representante da Vale e uma funcionária da NMC informaram que a situação está sendo tratada entre os departamentos jurídicos da mineradora e o escritório de advocacia Machado Meyer. No entanto, o Donato afirmou que essa informação ele já possuía, pois foi ele quem judicializou o imbróglio: Nós estamos discutindo, a gente vai pras audiências, vai produzir as provas que necessitam, mas a questão é: como uma pessoa reside no mesmo lote, com uma diferença de 5 metros de uma casa para outra, recebe [a indenização] e a outra não?”.

“Infelizmente a gente nunca tem resposta. É sempre o jurídico, é sempre isso, é sempre aquilo. Entendo o lado deles de falarem que tem que se resolver no jurídico e tudo mais, mas não está tendo a transparência como foi apontado. O único questionamento que eu fiz foi esse e eles não souberam me explicar o porque pra um teve essa benéfice de conversar e de tentar fazer um acordo extrajudicial e para o outro não. […] Não vai vir resposta futura, eu já sabia, mas meu papel enquanto advogado é defender o interesse do meu cliente”, concluiu Bruno Donato.

Mineradora fala em transparência

Com todas as críticas e demandas feitas, o representante da empresa e coordenador de comunidades, Marcelo Cabral, disse que: ‘‘A gente exerce essa transparência, como tem sido feito desde o início. Temos buscado cada vez mais, a cada avanço dos projetos ou da descaracterização, trazer essas informações. Já deliberamos algumas questões que foram trazidas e o que vai ser tratado. Vamos entender o que realmente aconteceu e as medidas evolutivas, como a gente tem feito em todas as reuniões’’.

A respeito da reclamação do esgoto a céu aberto na área da Vale, Cabral disse que a mineradora irá apurar a denúncia: “A gente deliberou conforme a reunião. Vamos fazer uma avaliação interna. Já que é uma área Vale, vamos entender o que está acontecendo e, a partir disso, tomar as atitudes que forem necessárias”.

Foto: Guilherme Guerra/DeFato