Itabira 2041

Tudo por nossa cidade, sou obrigado a estabelecer-me no futuro com a pergunta: que destino nos aguarda?

Itabira 2041
Itabira na década de 30 – Foto: Brás Martins da Costa/Arquivo de Marcos Maggessi
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Amigos, viver não é o que pensam. Qualidade de vida é ter projeto divino a executar. E não cabe fadiga. Querem suportar? E vencer? Que tenham fé. Não sejam covardes como résteas da última geração que nos afundou.

Bode expiatório

Eu, mesmo sem estar nessas paragens terrestres à altura do ano de 2041, ofereço-me para ser crucificado como um cristo diferente, pecador, ou bode expiatório, sem desejo algum de ser mártir, que apenas possa sentir o dever cumprido. Peguem as ferramentas — martelo, pregos, formão, serrote e a madeira — não é preciso me amarrar, prometo não reagir.

Deixem-me entre os pecadores, perdoem aqueles que sofreram e sofrem. Que fique claro, como o óbvio alertou e poucos viram, somente eu tenho culpa pela exaustão das minas. Falhei de tanto insistir. Que os cravos ultrapassem a madeira e jorrem sangue sem dó. Não tenho medo, mereço muito bem esse castigo, além de marteladas ou flechadas.

Retrato fiel

O chamado “deus do mundo”, o dinheiro, já não voa, nem corre, circula devagar. Há personagens metidos a gente boa, de chapéu na mão esperando uma moeda pingar. Falta reprisar o que ocorreu em Catas Altas do Mato Dentro, no século XIX, quando apareceu um “padre milagroso”, o português Monsenhor Mendes, e ensinou o povo a trabalhar. Aqui a preguiça triunfa.

A queda vertiginosa da arrecadação municipal, super anunciada — de um bilhão de reais por ano para poucos milhõezinhos — não teve precedentes. Servidores que recebiam salários altos tiveram que se assimilar ou sumir. O resto diluiu-se. Ninguém ficou para arrastar o tal papo de salário justo.

Há pracinhas lindas, arborizadas, eleitoreiras, só faltam ser cuidadas. Quem fará isso? Podem promover festanças também, só falta credibilidade para contratar músicos. Nas ruas da meia-noite desfilam personagens de Sodoma e Gomorra. Os buracos tapados afundaram-se, voltaram todos, mas isso não causa problema algum, os veículos foram reduzidos. Não existem agentes da Transita multando carroças. Ruas e avenidas abandonadas como desertos da Sibéria. Distrito Industrial entrou no silêncio dos cemitérios.

Ir e vir. Para quê?

Ônibus da Estação Rodoviária Genaro Mafra para Belo Horizonte tinham tempo determinado, de hora em hora. Agora, diz o agente do guichê, cochilando em cima da gaveta e babando: “Temos um de manhã, outro à tarde e ainda o último às 20 horas”.

O transporte urbano, que teve redução nos preços de tíquetes e passou a custar R$ 3,00, está dispensado. Agora é vai a pé ou de charrete.

“O trem que leva Minas”, segundo Newton Baiandeira cantava, nada leva mais, nem passageiro, nem minério, só a saudade sobrou. Pelo menos veio a tranquilidade para os ativistas de plantão porque a poeira baixou e abaixou.

Cadê os filhos da cidade?

Somavam 5 mil e tanto os funcionários da prefeitura. E agora? Estão em filas para cobranças, principalmente na Justiça do Trabalho, e via sindicatos. Há uma dúzia de pessoas que cuida da distribuição de água e da limpeza. Itaurb e o Saae foram extintos, não são 160 na rua, somam mais de 800. As portas de comerciantes foram cerradas.

A Vale empregava cerca de 2,5 mil funcionários na área de Itabira e mantinha mais de mil empresas terceirizadas. Agora, os equipamentos estão enferrujados. Parte foi colocada à venda, vieram pequenas mineradoras e levaram peças de ferro-velho.

Saúde, educação… mais o quê?

Perguntam pelas casas de saúde? O velho Hospital Municipal Carlos Chagas (HMCC) não durou um dia após a partida da mineradora. Mantido pela prefeitura, entrou em desuso e teve colapso por falta de tudo — funcionários, matéria-prima, equipamentos e a peça principal, os médicos.

O Hospital Nossa Senhora das Dores (HNSD) mantém-se de pé, ou ajoelhado, tem ainda uns 500, muitos são voluntários. E as faculdades, consideradas o alicerce do futuro? A Unifei foi abandonada no tempo das vacas gordas, a UniFuncesi ficou sem fôlego, sem o ânimo da concorrência. Faltam doentes.

Voltaremos na próxima semana com o “Itabira 2045”, esperando que o quadro mude para melhor. Enquanto isso, continuem pregando-me na cruz. Quem sabe possam proclamar: “Você é um anti-covarde.”

As igrejas da cidade estão lotadas, fieis tornaram-se super contritos. Oremos, rezemos, reflitamo-nos. Mantenham as marteladas.

José Sana é jornalista, historiador, professor de Letras e ex-vereador em Itabira por dois mandatos, onde reside desde 1966

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