Justiça bloqueia R$ 50 milhões da Vale e determina pagamento mensal a removidos em distrito de Ouro Preto
Empresa está tirando população de casa para dar início ao descomissionamento da barragem Doutor, em Antônio Pereira
A Justiça de Ouro Preto concedeu liminar em ação movida pelo Ministério Público de Minas Gerais e bloqueou R$ 50 milhões da Vale. Além disso, a mineradora terá que arcar com pagamentos mensais a pelo menos 229 pessoas que estão sendo retiradas de suas casas no distrito de Antônio Pereira, onde a empresa procederá o descomissionamento da barragem de Doutor, atualmente em nível 2 de risco de rompimento.
A decisão liminar é assinada pela juíza Kellen Cristini de Sales e Souza, da 1ª Vara Cível de Ouro Preto. Ela acata manifestação do Ministério Público, que afirma, na ação, que a Vale “mostra-se negligente, ao manter-se inerte e não prestar auxílio financeiro emergencial à população diretamente atingida, a fim de que possam, ainda que minimamente, reconstruir sua vida social, financeira e laboral”. Em outro trecho, a promotoria diz ainda que a “a população do Distrito de Antônio Pereira vive em constante estado de medo e ansiedade em razão da necessidade iminente de evacuação e incerteza do risco de rompimento”.
O Ministério Público havia requerido bloqueio de R$ 1 bilhão das contas da vale, mas a magistrada julgou o valor alto demais e concedeu 5% do valor. Os R$ 50 milhões deverão servir de garantia, exclusivamente, para ressarcimento de eventuais prejuízos decorrentes da remoção compulsória das pessoas residentes nas zonas de autossalvamento (ZAS) da barragem Doutor. Adicionalmente, a juíza determinou que a Vale inicie o pagamento mensal, no prazo de 30 dias, a contar da remoção, até o reassentamento definitivo, de um salário mínimo a adultos, meio salário mínimo aos adolescentes e um quarto de salário mínimo às crianças, a todas as pessoas que forem removidas de suas residências.
Outra determinação é que a Vale pague, também mensalmente, em espécie, o valor correspondente ao custo de uma cesta básica, conforme apurado pelo Dieese, no montante de R$ 429,30, por núcleo familiar. Em caso de descumprimento das medidas impostas, a mineradora poderá pagar multa diária R$ 500 mil, limitada a R$ 5 milhões.
Em comunicado postado em seu site, a Vale afirmou que “adotará as medidas necessárias para assegurar seu direito de defesa dentro dos prazos legais”. No processo, a empresa argumentou que as exigências requeridas pelo Ministério Público são desnecessárias, pois “as medidas já vêm sendo adotadas pela empresa”. Ainda segundo a Vale, “mesmo antes do acionamento do nível 2 de emergência da estrutura, já havia dado início, junto à Defesa Civil, à remoção programada das famílias que residem na área de risco”. Assim, sustenta “ser descabida a imposição das medidas pleiteadas pelo autor, que já vem sendo implementadas”.
Remoção é reivindicada em Itabira
A remoção da população vizinha à barragem de Doutor, em Ouro Preto, foi iniciada em 16 de fevereiro de 2020 pela Vale, em conjunto com a Defesa Civil Municipal, em função do início do processo de descaracterização da estrutura. Ao todo, serão 78 famílias que terão de deixar suas casas, em torno de 235 pessoas e 211 animais. A retirada está sendo parcelada, com pequena quantidades de famílias a cada dia de evacuação.
A evacuação de moradores das áreas de autossalvamento é também uma reivindicação de vizinhos de barragens em Itabira. Movimento de atingidos pela mineração se baseia até em uma condicionante pactuada no ano 2000 para exigir que as famílias sejam retiradas das casas, sob alegação de perigo devido à proximidade com as estruturas de rejeito.
Essa vontade ficou explícita em audiência pública promovida em dezembro do ano passado, pela Câmara de Vereadores, a pedido do parlamentar André Viana, também presidente do Sindicato Metabase. Naquela oportunidade, o então gerente das minas de Itabira, Rodrigo Chaves, aventou pela primeira vez a possibilidade de remoções na cidade, mas tão somente quando alguma barragem do município for descaracterizada. Segundo comentou, diques internos de pelo menos três estruturas deverão ser desativados.
A própria Vale estipula que 13 mil pessoas, em 5 mil imóveis, estejam em zonas de autossalvamento em Itabira. A cidade tem hoje três barragens em nível 1 de risco de rompimento: Pontal, Itabiruçu e Santana. Em caso de obras de descomissionamento, as estruturas poderiam ser elevadas ao nível 2, o que demandaria a retirada dessas comunidades.