Mais um capítulo da novela: fiscais chavistas admitem vitória da oposição e denunciam pressões
A maioria dos países democráticos do planeta não reconhece a vitória de Nicolás Maduro, inclusive o Brasil
Militantes governistas na Venezuela, entrevistados pelo site Caracas Chronicles e que atuaram em seções eleitorais afirmam ter visto as atas que confirmam a derrota acachapante de Nicolás Maduro.
A Venezuela está mergulhada em grave crise política, acentuada na disputa entre o presidente Maduro e a oposição em torno da eleição presidencial do dia 28 de julho, diante do resultado divulgado pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE), apontando a vitória do atual presidente, com 51,95% sobre o seu opositor, Edmundo González Urrutia, com 43,18%.
O resultado provocou forte reação da oposição e da comunidade internacional, que passou a exigir a apresentação das atas que confirmassem a reeleição do presidente venezuelano, nunca publicadas pelo CNE.
Também o Tribunal Supremo de Justiça (TSJ), controlado pelo regime chavista, sequer se interessou em apresentar as atas solicitadas pela oposição e comunidade internacional.
Os depoimentos colhidos pelo site Caracas Chronicles, em condição de anonimato dos fiscais eleitorais do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), acrescentaram mais elementos sobre as irregularidades do pleito de 28 de julho, quando confirmaram ter visto as atas nas seções eleitorais e a vitória esmagadora de González.
A reportagem, sob o título de: “O elo perdido da eleição de 28 de julho”, foi escrita a partir de um texto publicado originalmente no site “La Vida de Nos”, quando dois fiscais e uma líder comunitária do PSUV revelaram atos de pressão por parte do partido governista para que não divulgassem os resultados das atas a que tiveram acesso.
Na eleição venezuelana foram registradas 30.026 seções eleitorais, dispondo cada uma de um presidente, um operador da urna eletrônica, um secretário, um membro principal e testemunhas (os fiscais) dos múltiplos partidos.
A oposição digitalizou 25.073 atas eleitorais, reunidas por fiscais de partidos da oposição, e divulgadas em um site, comprovando a vitória de Urrutia e que, segundo a depoente, identificada apenas como Karla disse: “Se eles publicaram a ata eleitoral onde o candidato deles perdeu, e eu sei que é real porque a tenho aqui, por que eu deveria duvidar ou pensar que as outras que eles carregaram são falsas?”
“Karla” foi fiscal na cidade de La Guaira, no estado de Vargas, bem próximo de Caracas e pertence a uma Unidade de Batalha Hugo Chávez, uma organização do governo, e tem em sua casa atas originais.
Karla diz: “No meu centro de votação, Maduro venceu por alguns votos, mas em La Guaira a oposição nos aniquilou. Outros fiscais do PSUV postaram os números no nosso grupo de WhatsApp, e foi inacreditável. Eles nos deram uma surra”. Karla se mostrou surpresa com o resultado divulgado pelo CNE anunciando a vitória de Maduro: “Como vencemos?…
Isso é loucura. O chavismo sempre vence em La Guaira, e dessa vez não aconteceu”.
Ela também se pergunta por que lhe pediram que apagasse evidências no WhatsApp e a proibiram que falasse sobre a eleição, se a vitória do governo foi contundente.
E prossegue: “Na tarde do dia da eleição, a coordenadora do seu centro disse a todos que, “por ordens superiores”, eles imprimiriam apenas uma ata eleitoral por mesa, e não para cada testemunha”.
Ela reclamou porque o partido não lhe tinha avisado, mas foi advertida pela coordenadora de que estavam ‘no mesmo time’ e que ela não deveria ser tola. “Eu recusei. Eu queria minha ata eleitoral e que o cara da oposição pegasse a dele também, porque eu sou chavista, mas não trapaceio”.
Outra fiscal, identificada por Daria, contou que em sua seção uma falha técnica” impediu durante horas a impressão das atas eleitorais, com o problema resolvido depois das 22hs, e os números, mostravam que Urrutia vencera por uma diferença de 300 votos.
Quando a oposição publicou as casas eleitorais que tinha em seu poder, que representariam cerca de 80% do total, a fiscal do PSUV disse ter visto no site opositor a mesma ata que tinha em seu poder.
“Ela hesitou e então verificou a identidade de uma outra pessoa de outro centro distante. Mesma coisa. Era a mesma ata eleitoral”.
Outra fiscal, desta feita identificada como Maria Eugenia, líder comunitária, em Ciudad Bolívar, disse ter recebido a tarefa de manter um mínimo de 90 votos para o PSUV.
Maria Eugenia afirma que “pela primeira vez, desde que o chavismo chegou ao poder, há 25 anos, não tivemos que ir buscá-las em suas casas, como em outras eleições. A pessoa foram votar porque queriam. Era como se soubessem em quem votar”.
O Caracas Chronicles disse: “Ao cair da noite, a coisa mais inusitada aconteceu: o chat explodiu com mensagens dizendo que tinham perdido em quase todos os centros da paróquia. Os chefes estavam furiosos, exigindo explicações, furiosos, histéricos. Uma paróquia onde eles nunca perderam, onde eles sempre venceram de forma esmagadora”, finaliza.