MP apura improbidade administrativa no incêndio que destruiu UPA; vereadores querem ‘caça às bruxas’
Órgão pediu inquérito policial para saber se o incêndio partiu de prática criminosa. Na Câmara, o assunto deu o tom da reunião ordinária
O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) informou, em nota enviada a DeFato, que instaurou procedimento preparatório para apurar “eventual ato de improbidade administrativa” no âmbito do incêndio que destruiu no domingo, 23, a estrutura erguida para abrigar a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do bairro Fênix.
O procedimento foi aberto nessa segunda, 24, e se dá para analisar possíveis irregularidades, sendo que os fatos ou autoria não estão claros. É um passo chave para a interposição de ações como um inquérito civil, em um próximo passo.
“Ainda nesta data, foi requisitada à Polícia Civil a instauração de inquérito policial para que seja apurado se o incêndio decorreu de prática criminosa”, acrescenta a nota da 6ª Promotoria de Justiça de Itabira, responsável pela curadoria do patrimônio público.
Outros detalhes não foram antecipados. O delegado regional da Polícia Civil em Itabira, Helton Cota Lopes, confirmou a frente assumida pela corporação. A perícia técnica já fez os primeiros levantamentos e, agora, são investigadas as causas do incêndio. A expectativa de Cota é concluir os trabalhos o mais rápido possível. “As investigações estão avançadas. Não vai demorar”, frisou, nesta terça.
Repercussão
Na Câmara de Vereadores, o incêndio do prédio público repercutiu durante a reunião ordinária realizada hoje, 25. Reinaldo Lacerda (PSDB) relembrou a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) presidida por ele em 2018 – à época era do PHS – para apurar possíveis irregularidades na construção da UPA.
“Constatamos algumas possíveis irregularidades e encaminhamos o documento ao MP estadual e federal”, disse Lacerda. Entre os indícios que citou, foi observada a possibilidade de superfaturamento da obra, “em torno de R$ 2 milhões”.
De forma detalhada, o relatório final da CPI, com mais de três mil páginas, foi protocolado no Tribunal de Contas da União (TCU) e no Ministério Público Federal (MPF), uma vez que R$ 3,1 milhões foram custeados pelo Governo Federal. O documento também foi encaminhado ao Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE/MG) e ao Ministério Público Estadual (MPE), pois a obra contou com R$ 1 milhão de verbas municipais.
“Quero dizer à população itabirana que farei as cobranças devidas”, enfatizou o parlamentar, em atenção às instâncias a que o relatório foi submetido. Em seu discurso, Weverton Leandro Santos Andrade, o Vetão (PSB), presidente do Legislativo, também cobrou esclarecimentos do público-alvo do relatório final da CPI. “Temos que cobrar, com todo o respeito, o Ministério Público que tanto cobra da nossa classe”.
No MPF tramita um inquérito civil movido pela Procuradoria da República em Minas Gerais. De acordo com consulta processual feita no site do órgão, as movimentações tiveram início em julho de 2019, ainda sem um desfecho.
Construção inapropriada
A UPA Fênix, que ganhou o nome de UPA José Cesário Martins Carneiro, foi anunciada pelo ex-prefeito Damon de Sena (PV) em 2013. À época, a obra foi orçada em R$ 4,1 milhões, sendo que R$ 3,1 milhões seriam provenientes de convênio com a União e, o restante, de contrapartida do município. Ganhou a licitação a carioca Novo Horizonte Jacarepaguá – a mesma empresa às voltas com o incêndio do Ninho do Urubu, na Zona Oeste do Rio, ocorrido em fevereiro de 2019.
Num primeiro momento, o governo de Ronaldo Magalhães (PTB), que sucedeu o de Damon de Sena, alegou falta de dinheiro para equipar e pôr a UPA 24 horas em funcionamento. Mas, o caso se agravou: foram constatadas irregularidades na construção do prédio. O Conselho Municipal de Saúde, inclusive, decidiu cancelar a implantação do serviço.
O que foi trazido à tona pelo Conselho de Saúde na gestão municipal passada e ratificado pela Secretaria Municipal de Saúde foi, inclusive, resgatado hoje por Neidson Freitas (MDB). A estrutura foi feita com sistema construtivo modular e não atendeu às especificações e exigências de vigilância sanitária para funcionamento como UPA. Os principais erros estruturais encontrados foram ambientes sem garantia de acessibilidade; áreas sem ventilação natural; e espaços sem ralos e com piso inadequado (com rugosidade), não permitindo limpeza e desinfecção adequada.
“A UPA ficou só no projeto, na intenção, na vontade. Passou longe de abrigar o serviço. Havia toda uma estrutura comprometida e tudo isso muito bem colocado nos pareceres técnicos”, comentou Neidson Freitas, durante a palavra aberta.
A colega de partido, Rosilene Félix, endossou. “Houve erro do início ao fim: de planejamento, de reavaliação, de cuidado. É uma sucessão de erros que todos nós representantes do poder público precisamos pensar a respeito e agir”.
Falas “vazias”
Neidson fez críticas na Câmara ao que indicou ser uma tentativa de responsabilizar a gestão do adversário político de Marco Antônio Lage (PSB), o ex-prefeito Ronaldo Magalhães, sobre o incêndio ocorrido na UPA Fênix.
“Temos visto muitas falas vazias, alguns ainda tentando usar o tema para politizar um assunto que deve ser politizado, sim, mas com responsabilidade, com conhecimento e não com bravatas, com raiva, com marketing. Tivemos um projeto desestruturado que foi alertado lá atrás que a sua composição era altamente inflamável e que com muita responsabilidade não se autorizou, nos últimos anos, a ocupação desse imóvel. Poderia ter sido pior essa tragédia, senhor presidente”, ponderou Neidson, a Vetão.
Matagal
O emedebista suscitou também a responsabilidade da Prefeitura para com a limpeza urbana, “haja vista o mato alto próximo à UPA”, apontado por ele como um motor do incêndio. “Podemos ver nas fotos o matagal ao redor e um incêndio secundário que alcançou a UPA. Resta saber a origem dele”, disparou.
Vigilância
Reinaldo Lacerda lamentou a depredação do prédio erguido, anterior ao incêndio, e seu uso por vândalos. Disse, por sua vez, que pedirá ao Poder Executivo esclarecimentos sobre a vigilância do patrimônio, que no entendimento dele caberia à obra, embora sob abandono.
“Colaboração”
Em nota distribuída à imprensa ainda no domingo, o prefeito Marco Antônio Lage disse, por meio de sua assessoria de imprensa, que “determinou a abertura imediata de um procedimento investigativo que apure todo o histórico da obra, desde a contratação, passando pela execução e até o abandono dos anos passados, que resultou em um desperdício de dinheiro público”. “O município também colaborará com as investigações policiais que irão apurar o incêndio”, assinala.