O futebol odeia os especialistas

Reação do Internacional no Campeonato Brasileiro prova que o esporte vai muito além do campo.

O futebol odeia os especialistas
Abel Braga é o grande nome da reação colorada no Brasileirão. Foto: Reprodução/ Site oficial do Vasco

O que é o futebol? Para alguns, trata-se apenas de uma bola em movimento sendo disputada por 22 alucinados. Para outros, uma forma de enxergar o mundo. Seja ele complexo ou simplista – tudo dependerá da sua ótica – uma coisa é fato: o futebol odeia os especialistas.

Aqueles que tentam entender o esporte a partir da lógica e da consequência natural das coisas volta e meia são rechaçados. E mesmo em um momento no qual atinge profissionalismo e preparação cada vez maiores, o futebol continua a nos surpreender.

Um exemplo? O Internacional de Abel Braga. Eliminado em duas competições (Copa do Brasil e Libertadores) após o velho conhecido da torcida desembarcar em Porto Alegre e dado como carta fora do baralho no Brasileirão, o Colorado reagiu, não perde há oito jogos, e hoje está no primeiro lugar da disputa.

A troca forçada de Eduardo Coudet, com grande trajetória no futebol argentino, para Abel Braga, há anos contestado por seus métodos, parecia desastrosa. Unanimemente.

Porém, a sinergia entre técnico e jogadores deu certo e hoje o clube gaúcho é líder do Brasileirão. Óbvio: o atual nível do futebol brasileiro ajuda a explicar o sucesso de um elenco limitado comandado por um técnico que está longe dos seus melhores momentos.

Mas atrelar o sucesso colorado apenas a esse fator é reduzir o debate. Ao fazermos isso, ignoramos os diversos aspectos que permeiam o futebol e o tornam fascinante. Apesar do momento ser dos analistas de desempenho, dos cursos para treinadores e do fator teórico, como um todo, o esporte continua dependendo bastante das relações humanas

Tomemos como exemplo o São Paulo. Outrora líder do campeonato, jogando um futebol dominante, o Tricolor sucumbiu de maneira assustadora em 2021. Entre as várias justificativas que podem ser dadas para a queda de desempenho, uma delas é a fortíssima discussão entre Fernando Diniz e Tchê Tchê à beira do campo, no jogo contra o RB Bragantino.

As informações dão conta de que o ambiente no clube ficou péssimo após a situação. E nem o pedido de desculpas do treinador, tanto a Tchê Tchê, quanto ao restante do elenco, parece ter amenizado o clima. E aí vale o questionamento: de que adianta você ter boas ideias se não sabe se relacionar com seus atletas, aqueles que colocarão as suas ideias em prática?

Outro fator regularmente ignorado pelos analistas é a capacidade de alguns treinadores em se adaptarem em diferentes contextos. Sampaoli, hoje no Atlético, deixou o Santos em 2019 porque o clube não investiria o que ele desejava para a próxima temporada.

Direito do argentino? Claro. Mas o que ele esperava diante da atual situação financeira do Peixe? Cuca, com muito menos recursos e sem exigir um caminhão de reforços como Sampaoli, chegou à final da Libertadores, eliminando os poderosos Grêmio e Boca Juniors com autoridade.

Talvez este seja o mérito de Abel Braga. Entender o momento do clube no qual deve ficar até o fim do Brasileirão e trabalhar o psicológico do seu grupo. Algo simples? Jamais, especialmente se tratando de um time que vinha de duas eliminações seguidas em cobranças de pênaltis.

A discussão sobre o nível do futebol praticado no país é, sim, importante, e não pode ser ignorada. Mas ela vai além de Abel Braga. O ressurgimento do experiente treinador indica que realmente precisamos evoluir, mas também prova que o futebol, definitivamente, odeia os especialistas.

Victor Eduardo é jornalista e escreve sobre esportes em DeFato Online.

O conteúdo expresso é de total responsabilidade do colunista e não representa a opinião da DeFato.

MAIS NOTÍCIAS