Opinião: Vale ameaça sair de Itabira se não tiver aval para destruir mais sem compensar

Multinacional usa reunião pública para pressionar a cidade e escapa do debate sobre os impactos ambientais e sociais de novo projeto de ampliação

Opinião: Vale ameaça sair de Itabira se não tiver aval para destruir mais sem compensar
Foto: Tatiana Linhares
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“A gente continua com os estudos de continuidade das nossas operações. Mas, para que a gente continue operando, esse projeto precisa ser aprovado”. A fala de um representante da Vale, durante a reunião do Conselho Municipal de Meio Ambiente (Codema), na última segunda-feira (12), não deveria soar como uma ameaça. Mas soa. A multinacional, que ergueu um império a partir das montanhas de Itabira, agora condiciona sua permanência no município à aprovação de mais um projeto de ampliação — desta vez, das cavas, além da instalação de pilhas de rejeito e estéril. Sem diálogo transparente, sem compromisso claro com contrapartidas e ignorando os alertas ambientais e sociais.

A postura da empresa durante a reunião foi emblemática. A população compareceu em peso, levantou perguntas legítimas — sobre os impactos da proposta, a duração real da presença da empresa na cidade e os investimentos que deixará como legado. Mas a Vale desviou. Evitou respostas objetivas, insistiu em autopromoção. Ao invés de rocha firme, a postura da empresa mais se assemelha à lama que escorreu de suas barragens: dissimulada, escorregadia, perigosa.

É preciso lembrar que o próprio relatório do projeto da empresa admite os danos da ampliação: perda de cobertura vegetal, fragmentação de habitats, supressão de espécies protegidas, degradação da paisagem e interferência nos cursos d’água da região do Cubango. Novamente, o lençol freático de Itabira será agredido. Novamente, os riscos serão empurrados para a conta da população.

A discussão — ou a tentativa dela — não é sobre negar o projeto por completo. A comunidade reconhece a importância histórica da Vale para a cidade. Mas cobra que a empresa, finalmente, atue com responsabilidade. É hora de contrapartidas concretas: obras estruturantes, apoio real à diversificação econômica, investimentos permanentes que não desintegrem quando a última carga de minério deixar o solo itabirano.

É, no mínimo, estranho que uma empresa que já anunciou sua saída da cidade se preocupe tão pouco em deixar um legado digno. As demandas estão na mesa há anos: melhorias na saúde pública, ampliação da universidade federal, duplicação das MGs 129 e 434, construção de uma nova unidade prisional, criação de um novo distrito industrial, instalação de um porto seco. Oportunidades concretas de transformar vidas. Mas a Vale finge não ouvir.

Ao transformar uma audiência pública em peça publicitária, e ao tentar chantagear o município com a ameaça da debandada caso seu projeto não seja aprovado, a Vale mostra que não quer negociar. Quer impor. Quer manter Itabira refém de sua lógica extrativista até o último grama de minério — sem dar à cidade o direito de planejar um futuro além da mineração.

É este o verdadeiro legado da Vale?