Pedido de vista, reunião às portas fechadas e sessão extraordinária: a votação e aprovação do repasse de R$ 800 mil ao Valério
Projeto de lei que autoriza o aporte financeiro de recursos públicos no clube tramitava no Legislativo desde julho
No último sábado (26), o Valério enfrentou uma importante batalha em campo, quando venceu por 3 a 2 o Juventus, em Minas Novas, em sua estreia pela Segundona do Campeonato Mineiro — equivalente à terceira divisão do Estadual. Nesta terça-feira (29), foi a vez de superar um desafio extracampo: destravar a votaçao do projeto de lei 75/2023, que prevê o aporte financeiro de R$ 800 mil no time de Itabira. Após muita discussão, pedido de vista, reunião às portas fechadas e sessão extraordinária, o texto foi, enfim, aprovado pela Câmara de Vereadores.
Tramitando desde o dia 19 de julho no Legislativo, o projeto de lei estava travado na Comissão de Finanças, Orçamento e Tomada de Contas, presidida por Sebastião Ferreira Leite “Tãozinho” (Patriota). O parlamentar cobrava do Valério explicações sobre utilização de R$ 300 mil repassados pela Prefeitura de Itabira ao clube em 2022 para a participação na Segundona do Mineiro daquele ano.
Essa prestação de contas chegou à Câmara Municipal em 21 de agosto — e foi protocolada no gabinete de Tãozinho Leite no dia 24 —, o que permitiu que o projeto de lei 75/2023 pudesse ter sido debatido na reunião de comissões da última segunda-feira (28), quando foi liberado para votação na tarde desta terça-feira. Embora tenha vencido as etapas burocráticos, a matéria não encontrou caminho fácil para a sua aprovação.
Mesmo que o início da votação indicasse o contrário, com a proposta encontrando respaldo junto à maioria dos vereadores, o que se viu no plenário do Legislativo foi mais um debate tumultuado. Isso porque Tãozinho Leite pediu que fosse lido um ofício de sua autoria em que apontava supostas irregularidades na prestação de contas do Valério.
“Ontem, assim que fui protocolar [o ofício] na secretaria [Câmara], a partir de 18 horas, já tinha fechado. Foi protocolado na secretaria geral hoje e pude ver que [o ofício] não estava aqui na manifestação para ser lido, mas, como presidente da Comissão de Finanças, eu ia fazer aqui o meu parecer [sobre a prestação de contas]. Eu gostaria que a vossa Excelência [Heraldo Noronha] lesse o ofício que eu encaminhei para a secretaria geral junto à presidência para todos os vereadores que estão aqui, como forma de representação da Comissão de Finanças”, argumentou Tãozinho Leite.
O pedido foi, inicialmente, negado pelo presidente da Casa, Heraldo Noronha Rodrigues (PTB), alegando que o documento não apresentava nenhum indício de que algo pudesse estar realmente errado. “O Tãozinho questionou por que eu não li o ofício e não li ess ofício porque o documento que ele apresentou não tinha materialidade. Era genérico e não tinha nada apontado [as irregularidades]. Então, de forma efetiva, não tinha os pontos que motivaram a não aprovação da prestação de contas. Então, não tinha como eu ler e eu não pus para ler”, explicou.
Porém, mesmo com a argumentação de Heraldo Noronha, alguns vereadores ficaram com receio de votar o projeto de lei diante da possibilidade de irregularidades na prestação de contas de 2022. Isso foi suficiente para que José Júlio Rodrigues “do Combem” (PP) pedisse a suspensão da reunião para que os vereadores pudessem deliberar se o projeto de lei deveria ou não ser votado ainda hoje. Esse pedido chegou a ser negado pelo presidente do Legislativo. Com isso, Júlio do Combem pediu vista à votação.
“A gente precisa voltar e realmente ver o que tem nesse ofício, o que o vereador entendeu, para que não fique para a comunidade a imagem de que quem estava na diretoria do Valério fez algo que não era correto. Estamos dando precedentes para manchar a imagem do clube pelo qual temos todo carinho por ele. Isso a gente não pode fazer. Então, eu gostaria de pedir ao senhor presidente, eu tenho certeza que isso não vai tirar a autonomia do presidente, para suspender a reunião para analisarmos”, ponderou Júlio do Combem.
“Eu gostaria de fazer pedido de vista no projeto, senhor presidente”, complementou diante da negativa sobre a suspensão da reunião ordinária.
Nesse momento, dava-se como certo que a decisão sobre o aporte financeiro ao Valério seria adiada em mais uma semana. Porém, o vereador Bernardo de Souza Rosa (Avante), sugeriu que o pedido de vista tivesse validade por 20 minutos — o que é permitido pelo regimento interno da Casa — para que o plenário da Câmara pudesse deliberar e tentar destravar a votação. Dessa vez, o pedido foi acatado por todos os parlamentares, que se reuniram às portas fechadas no gabinete de Heraldo Noronha.
Ao fim desse debate privado, os vereadores retornaram ao plenário, com o ofício sendo lido em plenário para que o público também tivesse conhecimento do seu teor.
Assim, o projeto de lei 75/2023 foi colocado em primeira votação e recebeu 15 votos favoráveis e uma abstenção, essa justamente de Tãozinho Leite. O vereador Júlio César de Araújo “Contador” (PTB) não participou da reunião desta terça-feira e não teve voto contabilizado.
Reunião extraordinária
Para dar celeridade à tramitação do texto, Heraldo Noronha propôs um reunião extraordinária para a noite de terça-feira, o que foi levado para apreciação do plenário. Parte dos vereadores se mostravam favoráveis a um intervalo de alguns dias para que pudessem analisar a prestação de contas do Valério e verificar se há ou não alguma irregularidade.
Colocada em votação, a reunião extraordinária foi aprovada com dez votos favoráveis. Cinco parlamentares votaram contra: Luciano Gonçalves dos Reis “Sobrinho” (MDB), Reinaldo Soares de Lacerda (PSDB), Roberto Fernandes Carlos de Araújo “Robertinho da Autoescola” (MDB), Sidney Marques Vitalino Gonçalves “do Salão” (PTB) e Tãozinho Leite. Heraldo Noronha só votaria em caso de empate.
Na extraordinária, o projeto de lei 75/2023 foi aprovado em segundo turno, com o mesmo placar da primeira votação: 15 votos favoráveis e uma abstenção. Agora, o texto segue para a sanção do prefeito Marco Antônio Lage (PSB).
Emenda
Diante da longa tramitação desse projeto de lei, principalmente pela falta da prestação de contas de um recurso público aportado anteriormente no Valério, o vereador Bernardo Rosa apresentou uma emenda com objetivo de dar maior transparência a esse tipo de processo.
De acordo com o documento, para que a equipe itabirana possa receber o aporte financeiro, é necessário que dê “preferência na contratação de pessoal, tanto fixo quanto de apoio, a profissionais autônomos e prestadores de serviços temporários do município de Itabira”. Também estabelece que o time “arque com todos e quaisquer ônus de natureza trabalhista, previdenciária, social, fiscal e extraordinários que, por ventura, advirem em decorrência de sua participação” na Segundona do Mineiro.
Ainda determinou que “o recurso recebido não poderá ser utilizado para o pagamento de outra despesa que não tenha como origem a modalidade esportiva”. Além disso, “o Clube ficará obrigado a prestar contas do repasse feito pelo município”, assim como só terá direito a um novo repasse caso faça a “prestação de contas do repasse referente ao ano anterior, no prazo de 60 dias após o encerramento da competição. A prestação de contas no fim de cada exercício financeiro será requisito para concessão de nova contribuição”.
Por fim, impõe que “o clube se obriga a proceder à abertura de conta bancária específica para movimentação exclusiva do recurso repassados por conta desse contrato de patrocínio”.
“A liberação do recurso na conta bancária específica terá como objetivo viabilizar o monitoramento, bem como a fiscalização de sua utilização para os fins a que se destina, de forma a evidenciar a respectiva movimentação financeira, cuja demonstração é indispensável no procedimento de prestação de contas da ampliação dos recursos financeiros disponibilizados pelo município”, finaliza a emenda proposta por Bernardo Rosa, que também foi aprovada nesta terça-feira.