Profecias do caos. Por favor, obedeça-as

Na “belle époque”, professor do Ginásio Sul-Americano fez previsão funesta para Itabira e foi achincalhado. Um século depois, temos, além dele e Tutu Caramujo, Danielle Mitterrand

Profecias do caos. Por favor, obedeça-as
Comunidade de Gondó foi atingida pelo projeto Minas-Rio da mineradora Anglo American. Foto: Ascom/Prefeitura de Conceição do Mato Dentro
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Ao perlustrar, despretensiosamente, um dos cinco livros de um itabirano ilustre, os quais tratam de psiquiatria, psicanálise, doença mental, por aí, deparei-me com a uma de suas interessantes obras e destaco uma. Trata-se de um livro póstumo, que não caiu do galho ainda. (ALVIM, Clóvis de Faria. Escritos Bissextos: Belo Horizonte, Vega, 1980, 176 p.).

Alvim, nascido em 1920 e morto em 1979, empresta o nome a dois bairros de Itabira — Clóvis Alvim I e Clóvis Alvim II — por sinal muito habitados e de frequentes destaques na imprensa.

Mas o que me deteve foi o seguinte: além de vários assuntos publicados em crônicas, contos, história, ele se revelou um emérito profeta, que até hoje não tinha sido mostrado ao mundo. Ou teria sido eu o único pesquisador que flagrou sua ação no exercício da função de visionário? Por enquanto o proclamo como emérito seguidor de São João no Apocalipse Bíblico e Nostradamus.

Vamos à página 13 de seu citado livro para transcrever as palavras de Clóvis Alvim: “Havia também grupos (teatrais) amadores que encenavam peças com temas locais. Lembro-me bem de “Sonhando com Ela”, uma farsa-profética do Tenente Agostinho”. Anotem este nome: Tenente Agostinho, professor de Educação Física no Colégio Sul-Americano e organizador de peças de teatro.

Segue à frente com o seguinte parágrafo: “O cenário era a cidade de Itabira, com o pico do Cauê ao fundo. O tema, a exploração das jazidas de ferro. Exploração em sentido literal do termo, ficando a cidade arrasada, mutilada em sua paisagem, com enormes buracos no chão (sic)”. Vamos conferir …

Precisa dizer mais alguma palavra? Ah, sim, quando em Itabira e Conceição do Mato Dentro esteve a ex-primeira-dama da França, Danielle Mitterrand, em nome da Fundation France Liberté, ela de helicóptero e eu de Fusquinha, acompanhei-a até as proximidades de Congonhas do Norte, onde hospedou-se numa fazenda escolhida a dedo, sem luz elétrica e com acesso difícil.

Era 16 para 17 de novembro de 2006. Numa longa entrevista, concedida dentro do cansaço e da generosidade da célebre figura, ela descreveu minuciosamente seu susto sobre o que viu dos ares da Serra do Espinhaço.

Danielle Mitterrand  deixou para minha anotação principal o seguinte: “Sobre Itabira, vi buracos, imensas crateras e não posso compreender como a população de cem mil almas consegue viver calmamente entre tantos problemas. Os relatos que ouvi sobre a água me deixaram preocupada. Não se pode viver fazendo pouco caso de um bem tão precioso”.

Há outras expressões e destaquei algumas, entre as quais esta: “No mundo não existe paisagem tão dilapidada como a que acabo de ver!”. Na bibliografia apavorante itabirana temos uma fila de desafiadores que fazem mais medo que Tutu Caramujo.

P.S.: A entrevista com Madame Miterrand foi publicada na edição número 168, de dezembro de 2006, da revista DeFato.

José Sana é jornalista, historiador, professor de Letras e ex-vereador em Itabira por dois mandatos, onde reside desde 1966

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