Professora em Itabira, Tuani Guimarães é pré-candidata a vice-governadora de Minas Gerais
Ela compõe chapa com Renata Regina, pré-candidata a governadora do estado. Elas disputam as eleições pelo PCB
No início de julho, o Partido Comunista Brasileiro (PCB) lançou suas pré-candidatas ao Governo de Minas Gerais: Renata Regina, a governadora, e Tuani Guimarães, professora radicada em Itabira, a vice-governadora — a primeira residente em terras itabiranas a disputar o cargo. A sigla apresenta uma plataforma de campanha fortemente liga às pautas sociais, com destaque para propostas de valorização aos profissionais da educação e mudanças no modelo de exploração do setor mineral.
Renata Regina, de 35 anos, é ativista do Comitês do Poder Popular da capital mineira, Belo Horizonte. Essa será a sua primeira eleição para um cargo no Executivo — ela, porém, já participou de outros dois pleitos, em 2014 e 2018, quando concorreu para deputada estadual e federal, respectivamente, sempre pelo PCB.
Já Tuani Guimarães, de 32 anos, é natural de Vitória (ES), mas reside em Itabira desde 2018, onde é professora de Sociologia, atuando na rede estadual de ensino. Ela também é mestra em Arquitetura e Urbanismo, além de cursar Direito na Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). No campo social, participa do Comitê Popular dos Atingidos pela Mineração no Quadrilátero Aquífro/Ferrífero e dos movimentos sindicais da educação de Minas Gerais.
Após o lançamento da pré-candidatas do PCB, o portal DeFato conversou com Tuani Guimarães, que explicou o programa político do seu partido ao governo do estado. Confira:
DeFato: Você é pré-candidata a vice-governadora de Minas Gerais, compondo chapa com Renata Regina, pré-candidata a governadora. Qual a plataforma de governo e principais bandeiras defendidas por vocês?
Tuani Guimarães: Ocupa papel central em nossa plataforma de governo o fim da Lei Kandir, que tem gerado uma perda bilionária na arrecadação de Minas Gerais e favorecido o processo de desindustrialização em nosso estado; a revisão das alíquotas da Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM); o fortalecimento do parque industrial mineiro através de investimentos em ciência e tecnologia, ampliando os recursos para as universidades públicas estaduais de Minas Gerais (UEMG e UNIMONTES), com uma reforma universitária; e a reestatização da Vale sob controle das trabalhadoras e dos trabalhadores.
Como professora, aponto que em relação à educação básica, nossa primeira pauta é a implantação do Piso Salarial Profissional para toda a educação. Pautaremos a revogação dos projetos liberalizantes “Somar”, de privatização das escolas, e do projeto “Mãos Dadas”, de municipalização do ensino infantil e fundamental, que tem sido um vetor de desfinanciamento da educação pública e aumento do direcionamento dos recursos do estado para o setor privado.
Na saúde, de igual maneira, nos posicionamos contra a gestão privada através das Organizações Sociais (OSs) e a implementação do piso profissional às trabalhadoras e aos trabalhadores da saúde.
E incluímos em nosso plano a revisão das contrarreformas da previdência e administrativa do governo Romeu Zema (Novo) que afeta todos os servidores públicos do estado e a qualidade dos serviços públicos prestados à população.
Nossa plataforma de construção do Poder Popular e de uma Minas e um Brasil socialista, vem junto com o programa emergencial para enfrentar o desemprego, a fome, a miséria e o neoliberalismo proposto por nossa pré-candidata à presidência Sofia Manzano e seu vice Antônio Alves, que propõem a troca da Lei de Responsabilidade Fiscal por uma Lei de Responsabilidade Social e a redução da jornada de trabalho para 30 horas sem redução dos salários e direitos, o que gerará mais e melhores empregos.
Entendemos que mesmo concretizando uma vitória eleitoral, para dar consequência às medidas propostas, será necessário que a classe trabalhadora esteja organizada pressionando nas ruas para o avanço das medidas, que são elas:
1. Revogação de todas as contrarreformas neoliberais, tais como trabalhista, previdenciária, PEC da Morte (teto dos gastos), revogação das privatizações e a transformação da Lei de Responsabilidade Fiscal em Lei de Responsabilidade Social, com a finalidade primeira de assegurar recursos para educação, saúde, saneamento, programas sociais e investimentos públicos;
2. Combate ao desemprego através da redução da Jornada de Trabalho para 30 horas semanais sem a redução de salários, o que ampliaria a oferta de emprego de maneira imediata, da abertura de concursos públicos para a expansão de serviços essenciais à melhoria de vida da classe trabalhadora e de um programa de obras públicas de caráter anticíclico para a promoção dos direitos do povo trabalhador tais como, obras de saneamento básico, ampliação da malha ferroviária, construção de habitações populares e reforma de equipamentos públicos;
3. Reforma agrária Popular para a produção de alimentos saudáveis, com regularização dos assentamentos rurais, demarcação e regularização de terras indígenas, quilombolas e de comunidades tradicionais, incentivo à redução do uso de agrotóxicos, apoio à agricultura familiar com fomento às cooperativas a à produção agroecológica;
4. Reforma tributária reduzindo a carga tributária que recai sobre as trabalhadoras e os trabalhadores, é necessário congelar as tarifas de água e luz e outros serviços essenciais. Além disso, é necessário romper com o ciclo de isenções fiscais concedidas às grandes empresas que deixam de gerar receita para o Estado e batem recordes de lucro;
5. Programa de Moradia com confisco sem indenização dos imóveis ociosos nos grandes centros urbanos, aliado a um vasto programa de reforma e construção de habitações populares, de forma a superar o déficit habitacional;
6. Fortalecimento da Saúde Pública com reversão das privatizações, por exemplo do setor das comunidades terapêuticas que têm agido de maneira ineficiente e anticientífica no atendimento a dependentes de drogas;
7. No Setor dos Transportes, a ampliação do uso da rede de transporte ferroviária para transporte de pessoas e cargas, com revogação das concessões, retomando por parte do estado o controle sobre as vias públicas, a expansão da malha metroviária nas cidades polo, a estatização do transporte de passageiros e o passe livre para estudantes e trabalhadores isentos de imposto de renda;
8. Erradicação da fome a partir da criação de restaurantes e mercados populares e fortalecimento da rede de proteção social através do Sistema Único de Assistência Social (SUAS);
9. Reestruturação da dívida para analisar todo o processo de constituição da dívida, bem como suspensão do pagamento dos juros pelo período em estiver sendo realizada a investigação;
10. Política de combate às opressões. O combate permanente a todas as formas de opressão (como o machismo, o racismo, a LGBTfobia) deve realizar-se não apenas em uma dimensão cultural e de valores, mas por meio da efetiva garantia dos direitos e condições dignas de vida desses grupos oprimidos. Nesse sentido, além da ampliação da licença-maternidade e paternidade, defendemos também a legalização do aborto, com garantia de atendimento na rede pública de saúde, bem como políticas públicas que possibilitem a emancipação da mulher dos trabalhos domésticos (creches, refeitórios e lavanderias públicas, por exemplo). Também defendemos a manutenção da atual política de cotas raciais, a defesa da liberdade de culto das religiões de matriz africana e o fim do genocídio dos povos indígenas e do povo negro.
DeFato: O que o mineiro pode esperar dessa composição para a disputa pelo governo do estado?
Tuani Guimarães: As mineiras e os mineiros podem esperar uma defesa intransigente da classe trabalhadora, uma intensificação das lutas que os militantes do PCB já vêm travando no dia a dia, na construção do Poder Popular no rumo do Socialismo.
Nossa pré-candidatura representa os anseios da classe trabalhadora mineira e é comprometida com essa classe, por isso se faz de maneira independente e sem conciliação com os setores empresariais. Com isso ampliaremos as vozes dos 99% contra os 1%, ou dos de baixo contra os de cima.
Particularmente, a minha presença na chapa vem no sentido de fortalecer as trabalhadoras e os trabalhadores da educação e os movimentos populares das atingidas e dos atingidos pela mineração e, por isso, cumprirei uma agenda intensa de lutas junto aos movimentos populares e sindicais.
DeFato: O Governo de Minas Gerais tem enfrentado uma série de problemas, principalmente por causa da divida estadual. Como você avalia esse cenário e como lidar com ele?
Tuani Guimarães: Nos posicionamos contra o Regime de Recuperação Fiscal, que não resolverá o problema da dívida pública de Minas Gerais. Defendemos uma auditoria pública e o fim das isenções fiscais dada às grandes empresas. Desde a luta dos inconfidentes, o povo trabalhador mineiro luta por justiça social, liberdade e igualdade social. Minas é um estado rico em riquezas minerais e naturais. Precisamos rever a questão da tributação das atividades mineradoras, construir um novo modelo de mineração pautado pelas necessidades populares e não pelos interesses do poder econômico.
No cenário da dívida estadual de Minas Gerais é necessário rever uma série de medidas do governo Zema, tendo em vista que o atual governador, apesar disso, ampliou as isenções fiscais às grandes empresas, como as de mineração, que bateram recordes de lucros nos últimos anos. Este mesmo governo abriu mão de receber R$ 126 bilhões nas compensações das perdas da Lei Kandir, deixando de lado mais de 90% dos valores devidos pela União.
Sendo assim, primeiro é necessário criar uma comissão de estudo da dívida do Estado de Minas Gerais para identificar os recursos que o estado renunciou em detrimento da população mineira trabalhadora e, posteriormente, adotar medidas tais como cobrança da aplicação da Lei Complementar 176/2020 (repasse da União para os estados que deixaram de arrecadar com a Lei Kandir) e a revogação das isenções fiscais.
DeFato: Você é uma ativista do movimento dos atingidos pela mineração. Como vocês abordaram a questão mineral? E a pauta dos atingidos?
Tuani Guimarães: Na questão mineral pensamos sob duas perspectivas, a necessidade de existir territórios livres da mineração e a mineração para atender às necessidades sociais do povo trabalhador. A proteção dos direitos das pessoas e de um meio ambiente saudável são prioridades para nós.
A maior parte da produção mineral brasileira, e de Minas Gerais, vem da extração de minério de ferro e os locais onde se encontram são também ricos em água e muitos desses locais são essenciais para a manutenção de fontes de água para o consumo humano, abastecimento de bacias hidrográficas e manutenção do ciclo hidrológico.
Em outros locais podem ser marcos paisagísticos, culturais e territórios essenciais de se manterem preservados para a manutenção do modo de vida de comunidades indígenas, quilombolas, ribeirinhas, entre outros. Dessa forma, é importante que a mineração não avance ainda mais sobre esses territórios.
Enquanto em regiões que a exploração mineral ocorre, a reestatização da segunda maior empresa de mineração do mundo, nascida em Itabira, a Vale é de suma importância, pois não se pode admitir que a mineração deixe rastros de mortes e destruição enquanto os bolsos dos acionistas se enchem. Esse setor nas mãos do setor privado é oligopolizado e, diante disso, a cada novo crime executado pelas empresas, como algum risco na restrição da oferta do produto, o preço dos minérios sobem, sendo assim as criminosas, como nos casos da Vale/Samarco/BHP Billinton, em Mariana, e Vale, em Brumadinho, logo após seus crimes recolheram lucros extraordinários.
A Vale triplicou seu patrimônio após destruir toda a bacia do Rio Doce em três anos e bateu recordes de lucro em plena pandemia, mesmo após matar mais de 270 pessoas e destruir toda a bacia do Rio Paraopeba. Soma-se a isso que a mineração é o setor que mais mata trabalhadores em sua situação de normalidade, impulsionado por uma gestão das empresas que se coloca a serviço dos lucros (objetivo de todas empresas capitalistas).
Dessa forma, há uma intensificação da extração mineral com o objetivo de acelerar os ciclos de distribuição de lucros e dividendos aos acionistas, nessa conta as comunidades locais e os trabalhadores sempre sairão perdendo. Diante de uma atividade tão devastadora para as comunidades locais e para a classe trabalhadora, é necessário que ela seja feita de maneira restrita e a partir dos interesses sociais e não como máquina de exportação de produto primário. Sabe-se que inúmeros países compram minérios do Brasil e deixam suas reservas intocadas, pois a própria política fiscal brasileira isenta de ICMS a exportação do produto primário, sendo mais barato a importação e ainda não arca com a destruição dos locais de exploração.
Por isso, defendemos a reestatização da Vale sob controle da classe trabalhadora, para que essa realize sua produção de acordo com os interesses socialmente referenciados; o fim da Lei Kandir, com dois objetivos: aumentar a arrecadação e desfavorecer a primarização da economia mineira; e o aumento das alíquotas da CFEM.
DeFato: Pensando nas cidades mineradores, como é possível trabalhar a diversificação econômica e o desenvolvimento sustentável nesses municípios?
Em relação à situação dos atingidos por barragens em Minas Gerais, defendemos o fim de todas as barragens e aplicação imediata das leis estaduais Mar de Lama Nunca Mais e Política Estadual dos Atingidos por Barragens.
Descomissionamento e descaracterização das barragens até 2025, com garantia da reparação integral dos danos causados e com Assessoria Técnica Independente, conforme previsto em lei. Revisão do acordo do Governo de Minas Gerais com a Vale, no caso do crime de Brumadinho, em benefício das atingidas e dos atingidos na bacia do Rio Paraopeba.
Paralisação da operação das mineradoras em situações de conflito de interesses com as comunidades locais, em casos de remoções forçadas, e inviabilização dos modos de vida tradicionais como ocorre no conflito com o garimpo artesanal na região dos Inconfidentes e em comunidades quilombolas e indígenas.
Quanto ao processo de licenciamento de empreendimentos, propomos a reestruturação dos órgãos de controle ambiental e fiscalização. É de suma importância impedir que funcionários das empresas transitem, no que tem sido chamado de “porta giratória”, entre cargos no governo e nas mineradoras. Ampliação da participação popular com consulta prévia, livre e informada de todas as comunidades por onde recair os impactos socioambientais, em todos processos de licenciamento. E fim do autolicenciamento e da concessão das licenças Prévia, de Instalação e de Operação em um único processo.
DeFato: Pensando nas cidades mineradores, como é possível trabalhar a diversificação econômica e o desenvolvimento sustentável nesses municípios?
Tuani Guimarães: Hoje existe uma recomendação de que 20% da CFEM seja dirigida a ações que visem a diversificação econômica, o desenvolvimento de ciência e tecnologia e sustentabilidade, um primeiro passo seria o início do cumprimento dessa recomendação.
De qualquer maneira, em Minas Gerais, a mineração é um setor estratégico e como tal, em nosso entendimento deve estar a serviço dos anseios da classe trabalhadora e não sendo apenas uma atividade para gerar lucros aos acionistas das empresas. É necessário reduzir o ritmo de extração mineral, pois, com a nova forma de gestão corporativa das empresas, impõe-se um ritmo cada vez mais intenso com a finalidade de gerar dividendos em espaços de tempo cada vez menores. Como os recursos minerais são finitos, é importante que a velocidade de sua extração dê tempo dos territórios planejarem sua diversificação econômica, com participação popular, para isso propomos a constituição de Comitês Populares com a finalidade de estabelecer o controle social da atividade minerária.
Para pensar a diversidade econômica é necessário produção científica e tecnológica para apoiar esse processo. Em Minas Gerais, as universidade estaduais (UEMG e UNIMONTES) têm sofrido um estrangulamento em seu orçamento, é necessário ampliar os investimentos nas universidades e na Fapemig, além de abrir concursos públicos e estabelecer um plano de carreira para as atividades de professor e pesquisadores.
Isso permitirá o desenvolvimento de novas tecnologias para apoiar a ampliação da industrialização mineira e para frear a reprimarização econômica que Minas Gerais tem sofrido. Além disso, diante de um território tão vasto para a diversificação econômica, propomos uma Reforma Agrária Popular para a produção de alimentos saudáveis e impulsionamento das dinâmicas econômicas locais.
DeFato: Você é professora e também atua no movimento sindical da educação. Uma das pautas que envolvem o governo do estado é a valorização dos profissionais da educação. Quais as suas propostas para o setor?
Tuani Guimarães: A pauta zero para as trabalhadoras e os trabalhadores da educação é a execução da Lei do Piso, já aprovada na Assembleia Legislativa, de maneira imediata. Outra questão defendida é o uso do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica) de maneira integral, respeitando seus percentuais no uso para pagamento de salários.
Propomos a revisão do plano de carreira da educação para maior valorização dos trabalhadores e da formação continuada e as nomeações do concurso vigente. É necessário de imediato a revogação da reforma da previdência que recaiu sobre todos os servidores públicos do estado de Minas Gerais.
Propomos maior autonomia para as escolas e processos democráticos para a definição das diretrizes político-pedagógicas da educação mineira, com amplos espaços de construção coletiva com espaços de deliberação com garantia de representação estudantil e das trabalhadoras e dos trabalhadores.
Defendemos o fim dos projetos “Mãos Dadas” e “Somar”. E ampliar os esforços para a reelaboração do projeto de ensino integral e na revogação da reforma do ensino médio na perspectiva de construção de uma educação humanista, científica e emancipadora.