Seis meses de tensão, medo e doenças: consumo de antidepressivos aumenta nove vezes em Barão de Cocais

Número de comprimidos de Fluoxetina distribuídos pela rede pública de saúde saltou de 45.074 de janeiro a julho de 2018 para 398.717 no mesmo período deste ano; profissionais da saúde mental apostam em práticas integrativas como alternativa para reduzir o consumo de “tarjas pretas”

Seis meses de tensão, medo e doenças: consumo de antidepressivos aumenta nove vezes em Barão de Cocais
O psiquiatra Marcílio Magalhães, de Barão de Cocais – Foto: DeFato Online

Um levantamento de dados feito a partir da Relação Municipal de Medicamentos Essenciais (Remume) de Barão de Cocais, localizada a 90 km de Belo Horizonte, mostra que houve um aumento vertiginoso na utilização de medicamentos antidepressivos e ansiolíticos na cidade desde o anúncio de risco iminente de rompimento de barragem.

De janeiro a julho deste ano, comparado com o mesmo período do ano passado, o estudo aponta uma quantidade quase nove vezes maior: o número de unidades de Fluoxetina entregues pela farmácia básica de Barão de Cocais passou de 45 mil nos sete primeiros meses de 2018 para 398 mil neste ano. Convertendo em caixas com 28 cápsulas, seriam 14.239 caixas contra 1.609. A população atual do município é de 32 mil pessoas. 

Conforme reportagem publicada ontem por DeFato Online, o município registrou aumento de 50% na procura por atendimentos psicológicos e psiquiátricos pelo SUS desde fevereiro, quando a sirene da mina do Gongo Soco, da Vale, tocou em alerta de risco iminente de rompimento.

Os dados repassados pelo município mostram as indicações ofertadas pelo SUS para tratamento de ansiedade e ou depressão são: Clonazepam 2,5mg/mL, Diazepam 5mg, Diazepam 10mg, Fluoxetina 20mg, Amitriptilina 25 mg, Amitriptilina 75 mg, Nortriptilina 10mg, Nortriptilina 25mg e Nortriptilina 50mg.

A análise confirma ainda a ligação entre o aumento da medicalização na cidade e os problemas psicossociais causados pelo acionamento da sirene da barragem Sul Superior da mina de Gongo Soco na cidade.

Implantação das Pics é esperança para diminuir medicalização 

O aumento na demanda psicossocial em Barão de Cocais tem feito com que o município crie um olhar mais atento para as questões emocionais dos moradores. A contratação de novos profissionais psicólogos e psiquiatras e a implementação das Práticas Integrativas e Complementares (Pics) se tornou a esperança do setor para a manutenção da saúde mental diante da ameaça de rompimento de barragem.

Psiquiatra há três anos do Centro de Atenção Psicossocial (Caps) da cidade, Marcílio Magalhães falou à DeFato Online sobre o aumento na procura por acompanhamento por parte dos cocaienses. “A partir do momento em que houve a expectativa real do rompimento da barragem, desencadeou-se um quadro de ansiedade generalizada na cidade em um contexto social. Percebemos que muitas das pessoas que já tinham algum transtorno psiquiátrico tiveram quadros de descompensação por causa da sensação de pânico”, relatou.

Ainda de acordo com o psiquiatra, predominantemente a população moradora de área de risco foi mais afetada no ponto de vista psiquiátrico. As pessoas estavam se sentido em uma condição de insegurança permanente, principalmente ao anoitecer, ao dormir, caía sobre elas essa sensação de insegurança, de medo. O medo é um fator estressor, funciona como gatilho para o desenvolvimento de transtornos psiquiátricos”, explica.

A secretária de saúde do município, Joseane Batista, enfatizou sobre a decisão de reestruturar o setor para atender a população de forma satisfatória. “Precisamos fazer políticas públicas nos setores primários com o Centro de Atenção Psicossocial (Caps) e o Núcleo de Apoio à Saúde da Família (Nasf)”.

A alternativa encontrada pelo município e que promete ser um marco para a saúde mental é a inserção das Pics. Segundo Joseane, a intenção com a prática é diminuir o consumo de remédios. “Estamos reestruturando não só o Caps, mas o atendimento à população infanto-juvenil. Dentre as práticas integradas da saúde teremos aromaterapia, escalda-pés, acupuntura, dentre outras vertentes para que a população se sinta amparada, cuidada e acolhida de uma forma que não haja necessidade de recorrer para a medicalização”, disse.

As Pics foram criadas no país em 2006 com a aprovação integral do Conselho Nacional de Saúde. Em 2017 e 2018 o programa passou por expansões, aumentando a quantidade de tratamento oferecidos através do SUS e capacitando mais funcionários para o desenvolvimento das atividades.

O psiquiatra Marcílio Magalhães explicou à DeFato sobre os benefícios do tratamento alternativo no ponto de vista mental. Confira o vídeo: