Sô Luiz Menezes: Um incorrigível contador de “causos” – Parte 2

Conheça um pouco da história de um dos grandes ícones da cidade

Sô Luiz Menezes: Um incorrigível contador de “causos” – Parte 2
Foto: Prefeitura de Itabira/Acervo
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O ex-prefeito Luiz Menezes gostava de jogar conversa fora. Era seu passatempo preferido. Ele adorava contar “causos” sobre Itabira e sua gente. Às vezes, era repetitivo. E nem dava conta disso.

– “Fio”, eu já lhe falei que a maior bebedeira de minha vida foi em Ouro Preto, sua terra?

Sim, ele já havia falado sobre isso em várias ocasiões. E, eu, repetitivamente (também), sempre respondia: 

– Não, Sô Luiz. O senhor nunca me contou essa história.   

E o “itabirano de nascimento e coração” narrava tudo outra vez: 

“Eu era porteiro do cinema de Ouro Preto e garçom de um restaurante, também dos proprietários do cinema (a tradicional família Tropia, até hoje, é dona do badalado restaurante Chafariz e do cine Vila Rica). Certa vez, eu saí com os meus colegas da Escola de Farmácia. Bebemos o dia inteiro. Peguei o maior fogo da minha vida. A ressaca foi terrível. Você calcula, “fio”, que eu fiquei quase uma semana de cama? Mas aprendi a lição:  nunca mais bebi, “fio”. 

 E eu decorei esse “causo”, de tanto ouvi-lo. Veja mais alguns que Sô Luiz contava: 

O recém-formado dentista fez uma heroica viagem de Belo Horizonte a Itabira

“Sabe, ‘fio’, quando me formei em odontologia, fiz uma viagem incrível de volta para Itabira. Isso foi em 1942. Para se ter uma ideia, antes de chegar aqui, você tinha que passar por Sabará, Caeté, Barão de Cocais, São Bento e Santa Bárbara. 

Naquele dia, chovia uma enormidade. Em Belo Horizonte, eu consegui uma carona no caminhão de João Azevedo, que era conhecido por “João Boa Conversa”. Ele era uma pessoa de muito bom coração e, durante a viagem, começou a ceder gasolina para outros motoristas, que se encontravam em apuros. Chovia muito, “fio”.  

Imagine você, que havia diversos automóveis atolados na lama da estrada.  Nem se pensava em asfalto naquele tempo. E aí, de repente, aconteceu o pior: acabou o combustível do caminhão do “Boa Conversa”. Tive que ir pra debaixo de chuva e, com muito custo, arrumei carona em outro caminhão. Foi horrível. Três dias depois de sair de Belo Horizonte, consegui chegar em Itabira”, relembrava Luiz Menezes.

A mijada que derreteu o sino da catedral

“Pois é, aquele sino da catedral foi fundido aqui em Itabira mesmo. Para isso, alguns profissionais construíram uma pequena fundição, ali no Pará, naquele local onde hoje funciona a Telemig (um prédio próximo à rotatória, no início da rua Dom Prudêncio, no bairro Pará). 

Sabe como se fazia um sino? Eu conto pra você. Despejava-se o bronze líquido dentro de um recipiente com o formato de um sino. Mesmo depois de seco, ele tinha que permanecer na forma por muitos dias para se solidificar em definitivo. 

Aí, “fio”, você nem imagina o que aconteceu. Havia um homem que andava sempre bêbado pelas ruas da cidade. Certa noite, já de madrugada, ele passou pela fundição e mijou no sino. Incrível, mas o sino, que seria instalado na catedral, trincou completamente.  

Aí, foi uma confusão danada. O pessoal teve que começar todo o processo novamente”, concluiu Sô Luiz, com uma sonora gargalhada. Sobre esse episódio, Menezes ainda destaca um fato curioso: na parte interna, em alto-relevo, o sino tem uma escrita com toda a história de sua construção.

Sô Luiz era dono de uma comunicação fácil, simples e dinâmica. O político sempre procurava falar a “língua do povo”. Essa característica ficava bastante explícita na “Voz do Povo”, o programa que ele apresentava, todos os dias, na hora do almoço, na rádio Itabira.  

O velho comunicador tinha um vício de linguagem, bastante marcante: trocava o “L” pelo “R”, na fala. Sô Luiz pronunciava “câmara municipar” em lugar de câmara municipal, por exemplo. Muita gente afirmava que essa disfunção linguística era proposital. Em discursos oficiais, o “Véio” (outra forma carinhosa como a população se referia a Sô Luiz) não cometia erros de pronúncia.

Quando Sô Luiz se confundia com a piada

Sô Luiz tinha uma definição implacável para o sujeito bagunceiro, o arruaceiro que vivia aprontando nos quatro cantos da cidade. Ele não perdoava no diagnóstico: “Aquele moço é do cu riscado”, garantia.

– Sempre que encontrava com alguma pessoa – nos corredores da prefeitura – o prefeito fazia um convite irrecusável: “vamos tomar um café, lá no meu gabinete?” O convidado então era levado à cantina do terceiro andar. Ali havia café, sucos, refrigerantes, pão de queijo e outros salgados.  Na ocasião, Sô Luiz não perdia a oportunidade para brincar: “pode comer e beber à vontade, fio. Aproveita porque o povo está pagando a conta”.

– Certa vez, o prefeito foi a Belo Horizonte em companhia de alguns vereadores. O grupo participou de uma solenidade oficial no “Palácio da Liberdade”. Depois do evento, os políticos itabiranos decidiram almoçar num restaurante das proximidades. Na hora de pagar a conta, Menezes pediu ao motorista da Prefeitura: “Fio, traz aquela bolsa que deixei lá dentro do carro”.  Sô Luiz então avisou que bancaria toda a despesa. Pegou uma folha de um talão de cheques (bastante amassado) e começou a escrever. Nisso, o vereador Cácio Guerra, presidente da Câmara, interrompeu: “Que é isso, Sô Luiz? Esse talão de cheques é do Banco da Lavoura. Esse banco já fechou há mais de vinte anos”. A “plateia” foi ao delírio.

– Quando alguém se encontrava com Luiz Menezes e perguntava: E aí, Sô Luiz, como tem passado? A resposta era muito irônica: “Eu vou indo, fio, com essa minha cara fora de moda”, respondia o eterno gozador.

Fernando Silva é jornalista e escreve sobre política em DeFato Online.

O conteúdo expresso é de total responsabilidade do colunista e não representa a opinião da DeFato.

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