Vale a pena fazer porcaria em Itabira
A emporcalhada parceria entre a Cisne e Prefeitura tem uma consequência prática: sobram passageiros, faltam carroças
Vale a pena fazer porcaria em Itabira. E como vale a pena. O demérito virou mérito na terra do Poeta Maior. Mas, como dói! Logo na cidade natal do mais expressivo talento da poesia modernista brasileira. A personificação da excelência. Carlos Drummond de Andrade é virtude elevada à enésima potência. E não se fala mais do “Gauche”. Até mesmo para não macular seu nome.
E, por falar em esquerda, chegamos em Marco Antônio Lage. Um capitalista travestido de progressista. O neófito da política despencou de paraquedas na polis há três anos. Uma parcela mínima da população ouvia falar vagamente sobre o personagem. O famoso itabirano ocupou o cargo de diretor de Comunicação da Fiat Automóveis, no âmbito da América Latina. Por sinal, uma posição de destaque até no cenário internacional. Marco era muito conhecido em Turim, na Itália, por exemplo. Em Itabira, porém, poucos davam conta da sua existência.
Depois de deixar a massa falida Cruzeiro Esporte Clube, o jornalista decidiu se aventurar na política. Na prática, fascinou meio mundo com o seu palavreado típico de encantador de serpentes. O sujeito sofismou como nunca. E plantou no imaginário popular o messiânico discurso vaselina: “Eu sou o Marco. Eu sou o caminho da verdade. Deus me escolheu para libertar Itabira do atraso. Eu sou a luz do progresso. Eu sou a reencarnação da eficiência”, discursou pelas estranhas ruas da cidade, em plena pandemia. Desfilou por aí, sempre amparado em muletas eleitoreiras.
O povo itabirano e o abismo se encararam. Consequência: o desconhecido literalmente entrou na Prefeitura. O eleitor apostou num fantasma e flertou com o desastre. Então, o imperador de Ipoema tomou posse e Itabira conheceu a modernidade “marquiana” em sua plenitude. E tomem buracos, matos, buracos, matos. É lixo para todos os lados. Ficou tudo muito moderno.
No meio do caminho, o prefeito deu a declaração mais relevante do seu mandato: “ Serviço da Cisne é uma porcaria”, mancheteou o “Diário de Itabira”. O disparo ecoou na sociedade, muito naturalmente. O chefe do Executivo só constatou o óbvio ululante. Todo o mundo sabe que o desempenho da concessionária do transporte público é uma porcaria. A imprestável Cisne presta um péssimo serviço à população. Ônibus horríveis e insuficientes. O resultado dessa emporcalhada equação não poderia ser outro: sobram passageiros e faltam carroças.
O “grande gestor” Marco Antônio Lage teve a excepcional oportunidade de livrar Itabira da porcaria. A licitação do transporte coletivo caiu no colo do “nosso herói”. Era tempo de acabar com a porcaria. Mas, não. O alcaide de Mato Dentro fez cara de paisagem urbana e manteve a sujeira nas ruas. E pior. Concedeu um subsídio de R$ 35 milhões para a porcaria, sem choro e nem velas. O capítulo final dessa tragédia toda (ou tola) revela uma indecência explícita: vale a pena ser porcaria em Itabira. Vale apenas R$ 35 milhões. O mago Marco transformou a administração pública numa porcaria. Abracadabra! Isso a Globo não mostra.
Fernando Silva é jornalista e escreve sobre política em DeFato Online.
O conteúdo expresso é de total responsabilidade do colunista e não representa a opinião da DeFato.