Vergonha não é só da seleção, mas também da mídia esportiva brasileira

Opiniões pessimistas contrastam com empolgação exagerada da goleada contra a Bolívia

Vergonha não é só da seleção, mas também da mídia esportiva brasileira
Foto: Gaston Britos/EFE

“Diniz resgatou a essência do jogo brasileiro”. “Não precisamos de Ancelotti”. “Diniz renovou a esperança na seleção”. Não faz muito tempo que escutamos ou lemos essas e outras bobagens. A empolgação exagerada após a goleada por 4 a 0 contra a Bolívia, na estreia das Eliminatórias da Copa, hoje contrasta com a sensação de terra arrasada gerada pela vitória categórica do Uruguai nesta terça-feira (17). Para piorar, muitas dessas conclusões partiram de quem mais se espera racionalidade: a mídia esportiva.

Se já é chato ver o torcedor comum caminhar tanto entre os extremos, com jornalistas fica ainda mais feio. Qualquer um que acompanhe minimamente futebol sabe que é impossível tirar maiores conclusões de uma vitória contra a Bolívia, notadamente a seleção mais FRACA do continente. O Brasil, mesmo com suas piores gerações, possui material humano muito, mas muito, superior ao dos bolivianos, cuja principal referência técnica segue sendo o possante Marcelo Moreno.

Ao irmos do céu ao inferno com tanta velocidade, agimos com irresponsabilidade e conduzimos o torcedor ao erro. Analisar o jogo também exige opiniões “impopulares” quando necessário. Acima de tudo, exige que sejamos mais do que apenas “vendedores de emoções”, especialmente quando a unanimidade reina.

Muitos torcedores possuem uma visão negativa da imprensa esportiva brasileira. Enxergam nós, analistas, como constatadores do óbvio, algo indiscutivelmente exagerado. Mas ao protagonizarmos esse tipo de papelão, fazemos jus a essas críticas.

O resultado é importante no futebol? Sem dúvida. Mas ele não caminha sozinho. Como determinado time chegou àquele placar? Qual o nível do adversário? Quais foram as nuances do jogo? O que podemos projetar daqui pra frente? Essas e outras questões sempre devem nortear qualquer análise, pois dar vereditos em cima de um placar é missão fácil para qualquer um. Se ganhou, ótimo. Se perdeu, péssimo.

Especificamente sobre a seleção, a atuação de ontem merece, sim, olhar atento. Perder para o Uruguai e sua melhor geração em muito tempo não chega a ser um desastre. Mas o Brasil precisa jogar mais. Deve jogar mais.

É preciso lembrar que Fernando Diniz fez apenas seu quarto jogo à frente da seleção brasileira. Se sua ideia de jogo exige tempo até no contexto dos clubes, que dispõe de todo um dia a dia para aprimorá-lo, que dirá com grupos que se encontram esporadicamente?

Essa, aliás, deveria ser nossa maior preocupação. Como fazer os atletas assimilarem um conceito de jogo tão específico com tão pouco tempo para treinar? Um desafio certamente previsto pela CBF e o próprio Diniz, e que exige soluções inteligentes e racionais. Sem contaminação das análises malucas e inconstantes que ditam nossa maneira de ver o jogo.

Victor Eduardo é jornalista e escreve sobre esportes em DeFato Online.

O conteúdo expresso é de total responsabilidade do colunista e não representa a opinião da DeFato.

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