Violência doméstica cresce na quarentena; é preciso denunciar!
Com as pessoas mais tempo dentro de casa durante a pandemia do coronavírus, aumenta o número de agressões dentro dos lares em todo país. É preciso relatar o que acontece!
A pandemia do coronavírus impôs uma nova realidade ao planeta. Para se esconder de uma doença desconhecida, que avança por meio das relações pessoais, famílias se trancaram dentro de casa. Nesse momento, muita gente, em especial mulheres, crianças e idosos, passou a sentir na pele o que é temer também pelo conhecido. Ou pelo que achavam conhecer. Estatísticas alarmantes mostram que a violência doméstica disparou durante a quarentena. Um problema secular que ganhou força em meio às tensões da atualidade.
O Brasil, historicamente, é um local inóspito para as mulheres. Uma pesquisa da Fundação Perseu Abramo (FPA), em parceria com o Serviço Social do Comércio (Sesc), mostra que, a cada dois minutos, cinco delas são agredidas no país. Entre as ocorrências, 80% são ocasionadas pelo próprio parceiro da vítima (marido, namorado ou ex). Estatísticas que acendem o alerta para este período de isolamento. O perigo mora dentro de casa. E as portas estão trancadas.
Levantamento realizado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) aponta que a agressão às mulheres subiu vertiginosamente em estados brasileiros desde que as medidas de isolamento social foram intensificadas. Em alguns lugares, como nos estados mais dinâmicos do país, São Paulo e Rio de Janeiro, o aumento se aproxima de 50% em relação ao mesmo período no ano passado. Em Minas Gerais, durante a escalada da pandemia, entre os dias 23 de março e 6 de abril, o Centro Risoleta Neves de Atendimento à Mulher (Cerna), órgão da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (Sedese), atendeu 123 mulheres em situação de violência.
Diante de tantos dados tristes, é lógico concluir que o aumento da tensão provocado por este momento inédito, aliado ao comportamento violento masculino que se sustenta pelo passar dos anos, cria um ambiente ainda mais perigoso para as mulheres. E uma arma eficaz para combater as agressões e mudar esse cenário é a denúncia. Isso porque, diferente de outros crimes, tantas vezes escancarados, a violência doméstica pode não ser notada por quem está de fora, o que contribui para a escalada de casos. É preciso que as autoridades saibam o que está acontecendo. O silêncio pode ser fatal.
Claro que há o medo. Além das agressões físicas, a violência também se revela por meio das ameaças. E é por isso que os canais de denúncia respeitam o anonimato. Uma campanha lançada pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, no último dia 15, disponibiliza telefones de atendimento e até um aplicativo que pode ser usado pelas vítimas, inclusive com envio de fotos e vídeos. Quem sofre as agressões pode usar o Disque 100 e o Ligue 180. Já o aplicativo se chama “Direitos Humanos Brasil”.
O Governo Federal informa que o número de denúncias de agressões contra as mulheres subiu 35% em abril. Mas a preocupação também se volta para outros tipos de vítimas, como crianças, adolescentes, idosos e deficientes. No caso das crianças, por exemplo, há inquietação com a subnotificação. Houve uma diminuição de quase 20% nesse tipo de denúncia no mês passado, mas esse decréscimo pode estar ligado justamente ao isolamento, já que as informações às autoridades sobre essas ocorrências geralmente partem de professores ou instrutores de creches, que acabam notando as marcas das agressões.
Vale ressaltar que, além dos canais do governo federal, há ainda aqueles mais tradicionais, que são mais familiares para maior parte da população: o 190, da Polícia Militar; e o 181, do Disque Denúncia Unificado (DDU). Especialistas em segurança pública também orientam que as agressões sejam compartilhadas com pessoas de confiança, amigos ou familiares, que podem ajudar a fazer com que as informações cheguem aos órgãos competentes.
Se já não bastasse o medo do coronavírus e suas consequências para a saúde, os serviços sociais e a economia, a pandemia ainda escancara a violência dentro daquele ambiente que teoricamente representaria segurança. Problemas de um mundo cada vez mais doente. Mas, se a Covid-19 ainda parece distante de uma cura, para a violência doméstica há o forte antídoto da denúncia. Use o quanto necessário e ajude a achatar esta curva também.
Gustavo Milânio é advogado e chefe de gabinete da Presidência do TCE/MG
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