Vizinho que “não meter a colher” em agressões poderá ter de pagar por isso
Projeto de Lei aprovado pelo Senado impõe obrigação de denúncia a condôminos e síndicos em casa de violência doméstica em condomínios
“Em briga de marido e mulher não se mete a colher”. O ditado é antigo e sua funcionalidade também. Com o aumento exponencial nos números da violência doméstica nos últimos anos, a denúncia se tornou uma arma importante. E agora poderá ser uma obrigação. Projeto de Lei aprovado pelo Senado na última semana impõe multas a vizinhos que não informarem às autoridades sobre crimes desse tipo ocorridos em condomínios.
No mês de maio, mostramos aqui neste espaço que a violência contra a mulher cresceu durante a quarentena imposta pela pandemia da Covid-19. De lá para cá, apesar das medidas de flexibilização do isolamento em boa parte do país, os números continuaram altos. Somente em Minas Gerais, segundo dados da Polícia Civil, foram mais de 44 mil denúncias de agressões sofridas dentro de caso entre março e junho deste ano. As autoridades, no entanto, acreditam que a incidência seja bem maior. Daí a importância da denúncia.
O PL aprovado pelo Senado estabelece o dever de condôminos, locatários e síndicos de informar às autoridades competentes os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher de que tenham conhecimento no âmbito do condomínio, mesmo que tenha acontecido dentro de uma residência ou em um ambiente privado. Caso isso não ocorra, o síndico ou o administrador poderá ser destituído da função e o condomínio poderá ser penalizado com multa de cinco a dez salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência. O dinheiro será revertido em favor de programas de erradicação da violência doméstica e familiar.
E como vai funcionar? Segundo o texto aprovado pelo Senado, os condôminos terão que avisar ao síndico sobre a situação de agressão à qual ficaram sabendo. O síndico, então, terá prazo de 48 horas a partir do conhecimento dos fatos para relatar as denúncias às autoridades, preferencialmente por meio da “Central de Atendimento à Mulher — Ligue 180” ou via outros canais eletrônicos ou telefônicos adotados pelos órgãos de segurança pública.
É importante citar que, além da multa estipulada por este novo projeto, deixar de ajudar uma vítima de agressão também configura omissão de socorro, passível até de prisão. Atualmente, o Código Penal Brasileiro impõe pena de um a seis meses de detenção ou multa para quem negar auxílio a alguém agredido. Se houver lesão corporal grave, a pena é aumentada em 50% e pode até ser triplicada em caso de mortes.
O projeto, no entanto, não se restringe às mulheres. Emendas aprovadas em plenário estendem as mesmas obrigações aos vizinhos em casos de violência contra crianças, adolescentes, idosos e pessoas com deficiência física e mental. Caberá aos condomínios ainda promover campanhas de conscientização nas áreas comuns, com afixação de placas alusivas à vedação a qualquer ação ou omissão que configure violência doméstica e familiar, recomendando a notificação, sob garantia do anonimato, às autoridades públicas
Com a aprovação no Senado, o texto agora segue para a Câmara dos Deputados. Se aprovado sem qualquer modificação, vai para sanção do presidente. Em caso de alterações, retorna ao Senado para uma nova votação antes de ser encaminhado ao Executivo. Assinado pelo presidente, passa a ter força de lei, e garantirá um novo status ao antigo ditado. Não meter a colher poderá custar caro.
Delegacia Virtual
Só para encerrar, ainda dentro desse mesmo tema da violência doméstica, está disponível em Minas Gerais, desde a semana passada, opção na Delegacia Virtual voltada para denúncias de crimes desse tipo. Por meio da plataforma, é possível gerar, de forma on-line, registros de lesão corporal, vias de fato, ameaça e descumprimento de medida protetiva de urgência cometidos contra mulheres, crianças, adolescentes, idosos e pessoas com deficiência.
O endereço é o www.delegaciavirtual.sids.mg.gov.br. No site há toda orientação para registro da ocorrência e sobre os passos a serem dados após o aviso oficial às autoridades.
Gustavo Milânio é advogado e chefe de gabinete da Presidência do TCE/MG
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