Os juros estão na mesa
Confira o novo texto da economista e colunista da DeFato, Rita Mundim
Desde o início da pandemia e da aplicação do remédio mais amargo contra o Covid-19, o foco das ações dos governos e dos bancos centrais era conceder estímulos monetários para a recuperação rápida da economia. E assim foi feito. Nos EUA trilhões de dólares foram despejados nas mãos das famílias e das empresas, houve a intensificação do programa de recompra de títulos e a taxa de juro tem sido mantida no intervalo de 0% a 0,25% a.a. e com promessa de que fiquem assim até o final de 2023.
Na zona do Euro, a taxa é zero e assim como o Banco Central Americano, o Banco Central Europeu pretende manter este nível de juros pelo menos até o final de 2022. O isolamento social que tanto penalizou o setor de serviços e consequentemente as economias mais desenvolvidas do mundo onde este setor chega a representar mais de 90% na composição do PIB, promoveu além das restrições à mobilidade das pessoas um desarranjo nunca visto nas cadeias produtivas globais ocasionando falta de insumos, de componentes e pressionando preços.
Diante da pandemia e da dinâmica em ondas do vírus, o ritmo de produção e de abastecimento das cadeias produtivas foi alterado de acordo com o ciclo de transmissibilidade em cada País, e, só agora com o aumento no ritmo de vacinação em alguns países e a chegada da vacina em nível global poderemos ter no horizonte a possibilidade de normalização de produção e estoques, e consequentemente de menor pressão sobre os preços. Essa é a esperança dos Bancos Centrais que acreditam em uma inflação transitória.
Os investidores, a princípio, acreditavam piamente nos comunicados e atas dos Bancos Centrais, mas a resiliência do vírus e da inflação passaram a ocupar as análises e projeções sobre as taxas futuras de juros. A perda de confiança do investidor global nas promessas dos Bancos Centrais começa a ser sentida pelo aumento considerável da volatilidade com dias cada vez mais frequentes de stress de mercado : bolsas em queda, dólar em alta e juros futuros em alta.
Na semana passada, os sinais contidos na ata do Comitê de Política Monetária do Banco Central Americano sobre a possibilidade de passar a discutir a possibilidade de retiradas de estímulos monetários fez as bolsas americanas operarem em queda. Aqui no Brasil, no encontro de analistas de mercado com o Banco Central, grande parte dos presentes cobrou da Autoridade Monetária um aperto na política monetária capaz de trazer os juros para a neutralidade, ou seja, uma SELIC entre 5,5% e 6% a.a.
Em paralelo, os indicadores prévios da atividade econômica de maio da Zona do Euro, do Reino Unido, da Alemanha e dos EUA divulgados na sexta feira apontam uma recuperação mais forte do que se previa para as suas respectivas economias. As prévias dos PMIs (Purchasing Manager’s Index) medidos pela empresa IHS Markit registraram o melhor resultado para a Zona do Euro nos últimos 39 meses: 56,9 pontos.
No Reino Unido, o índice atingiu o recorde histórico de desempenho: 62 pontos, e nos Estados Unidos, chegou a 61,5 pontos ficando acima dos 60,5 pontos esperados. Este índice vai de 0 a 100 pontos, acima de 50 pontos ele indica expansão da atividade econômica, abaixo de 50, retração. A melhora significativa na retomada do ritmo nessas regiões está diretamente ligada à vacinação e a consequente flexibilização das atividades decorrente do aumento da imunidade da população.
Apesar de não termos ainda conseguido imprimir um ritmo mais rápido na vacinação no Brasil, os números, por aqui, continuam a surpreender positivamente com a economia brasileira mostrando resiliência durante o ápice da segunda onda do COVID-19, em abril. Na semana passada, o maior destaque foi a forte arrecadação da receita no mês de abril, R$156,8 bilhões, a maior para um mês de abril desde que a série começou a ser apurada.
Em relação a abril do ano passado (pior momento da primeira onda) a alta foi de 45,22%, e em relação ao mês de março deste ano, o crescimento foi de 13,34%. A maioria das projeções apontava para um recuo em relação a março devido às medidas de restrições impostas em todo o país no mês de abril. Diante da força dos números, a maioria das projeções para PIB de 2021 foi revisada para cima.
Existe agora um consenso de que a economia brasileira cresça mais do que 4% neste ano. Eu vou além, e, aposto em um segundo semestre muito forte com a melhora no ritmo de vacinação o que pode reativar com força o importante setor de serviços e fazer com que o país cresça em torno de 5%. Essa onda de revisões positivas para uma retomada mais forte da economia traz sua principal dor: pressão nos preços e que também pode ser chamada de inflação…
Então, preparem-se, de agora em diante teremos que conviver com as escolhas sensatas ou não dos bancos centrais no sentido de buscar uma taxa de juros de equilíbrio que seja ao mesmo tempo capaz de controlar a inflação sem tirar o ímpeto do crescimento.
Rita Mundim é economista, mestre em Administração e especialista em Mercado de Capitais e em Ciências Contábeis
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