Economia cresce, mas inflação incomoda
Confira o novo texto da economista e colunista da DeFato, Rita Mundim
Depois de um longo e, na minha opinião, merecido descanso, estamos de volta para trocarmos ideias e tentarmos vislumbrar o que vem pela frente em se tratando de economia brasileira. Na última semana os indicadores voltaram a mostrar a força de recuperação da economia e ao mesmo tempo o incômodo de uma inflação resiliente que tira o poder aquisitivo dos brasileiros, o sono do Banco Central e já começa a ameaçar e contaminar as projeções futuras para a inflação de 2022 e 2023.
O índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA-15) de setembro veio acima das projeções dos mais pessimistas e chegou a 1,14% elevando a inflação anualizada para 10,05%. Em agosto o IPCA-15 ficou em 0,45% em relação a julho e anualizado em 9,3%. No acumulado do ano, medida por este índice a inflação está em 7,02%. No último boletim Focus, Relatório de Mercado do Banco Central, a projeção para a inflação no final de 2021 está em 8,35 % e depois da surpresa desagradável do IPCA-15 de setembro, deveremos ter uma revisão para cima nas próximas projeções.
Tivemos uma semana cheia e volátil, em nível global e em nível local. A segunda começou com total aversão ao risco com o provável calote da Evergrande, a segunda maior incorporadora da China que deve mais de US$300 bilhões de dólares no mercado global. A primeira leitura foi a de que poderíamos estar, de novo, diante de um risco sistêmico similar à quebra do Lehman Brothers, nos EUA, em setembro de 2008, e como ocorreu naquela época, poderíamos ter uma crise financeira global.
Na dúvida o mercado precificou o caos. Passado o susto e o feriado chinês, a racionalidade e a busca por pechinchas voltaram a comandar o mercado na terça, mas com a cautela característica de um mercado às vésperas de decisão de política monetária nos EUA e aqui no Brasil. A manutenção da taxa de juros nos EUA e a elevação de 1 ponto percentual na taxa Selic, no Brasil, ficaram absolutamente dentro do esperado…
A novidade apareceu na entrevista dada por Jerome Powell, presidente do Banco Central americano após a decisão do FOMC (Comitê de Política Monetária americano), segundo ele, a retirada dos estímulos monetários começa mesmo este ano e os juros podem voltar a subir a partir de setembro de 2022.
Por aqui, a diminuição no ímpeto do crescimento americano e, em especial, do chinês, com o crescimento de casos da variante delta e intervenções do governo em vários setores da economia como foi o caso do setor siderúrgico que derrubou o preço do minério de ferro e intervenções em outros setores como a indústria de games e criptomoedas, fez com que a alta de 1 ponto percentual fosse adequada ao momento, já que o menor ímpeto de crescimento americano e chinês pode ajudar na desaceleração da inflação de commodities.
Nos EUA, após o anúncio da decisão de política monetária , o próprio FEDERAL RESERVE rebaixou a projeção do crescimento do Produto Interno Bruto para este ano de 7% para 5,9% e revisou para cima a projeção da taxa de desemprego de 4,5% para 4,8% da população economicamente ativa americana para o final de 2021.
A reunião entre o ministro Paulo Guedes, o presidente da câmara, Arthur Lira e o do senado Rodrigo Pacheco, sinalizaram para uma provável solução para o pepino dos precatórios, com respeito à Lei de Responsabilidade Fiscal e à decisão do Supremo, o que diminui significativamente o risco fiscal.
Na quinta-feira a arrecadação da receita de mais de R$146 bilhões, em agosto, bateu novo recorde histórico comprovando a força da recuperação econômica. No acumulado do ano a receita já arrecadou mais de R$1,2 trilhão, também recorde para o período, e, na sexta o saldo das transações correntes que representa o saldo de tudo aquilo que transacionamos com o resto do mundo, apresentou um superavit de quase US$1,7 bilhão, o maior para o mês desde agosto de 2006 e muito acima do esperado (US$1,00 bilhão).
Resumo da ópera: ao contrário do que esperávamos ao final do primeiro semestre deste ano, a recuperação das economias perdeu um pouco de tração, mas a inflação global também e infelizmente, em razão da crise hídrica, no Brasil, a inflação ainda apresenta fôlego e resiliência, mas o Banco Central também mostra mais disposição no combate à alta de preços. A retomada do setor de serviços pode ser a boa surpresa do terceiro trimestre em termos de crescimento econômico, mas tudo vai depender da velocidade de normalização do nível dos reservatórios. O racionamento de energia, se necessário, será o termômetro do crescimento da economia tanto no quarto trimestre deste ano quanto no ano que vem.
E, para terminar, vamos ficar atentos ao RTI, Relatório Trimestral de Inflação do Banco Central que será divulgado nessa semana e poderá ser a bússola para entendermos os passos futuros da Autoridade Monetária no combate à inflação.
Rita Mundim é economista, mestre em Administração e especialista em Mercado de Capitais e em Ciências Contábeis
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