A terceira via é uma fantasia da elite tupiniquim
Confira o novo texto do jornalista e colunista da DeFato Online, Fernando Silva
Repito: a terceira via é uma peça de ficção. Essa afirmação é conceitual e pragmática. Tem embasamento na realidade histórica. Para começo de conversa, a tal terceira via é uma tese da economia. O conceito (terceira via) é elaboração do sociólogo britânico Anthony Giddens.
Para melhor entendimento, é preciso retornar a um mundo imediatamente posterior à Segunda Guerra Mundial. A humanidade acabava de passar por um período de intenso sofrimento (1939 a 1945). A Europa estava dilacerada e o resto do planeta pagava um elevado custo pelo conflito sangrento. Os cidadãos andavam carentes e apreensivos. Necessitavam amparo poderoso para simples sobrevivência com um mínimo de dignidade.
Diante desse cenário catastrófico, o economista inglês John Maynard Keynes idealizou o Estado de Bem-Estar Social. Essa linha de pensamento preconizava a obrigação dos estados nacionais tutelar o processo econômico para facilitar a vida da população. E, por outro lado, os governos deveriam garantir acesso a serviços básicos de saúde, educação e segurança pública. Quase todos os países adotaram esse modelo socioeconômico, noves fora a União Soviética, por motivos óbvios.
Essa ideologia de gestão governamental perdurou até o início da década de 1980. O sistema gerencial assistencialista ruiu quando o americano Ronald Reagan e a britânica Margareth Thatcher assumiram poder. Os dois líderes mundiais- na base do fórceps – impuseram o neoliberalismo econômico como filosofia de administração pública – uma cepa muito mais demolidora que o liberalismo original do economista escocês Adam Smith.
Com Thatcher e Reagan, entrou em cena uma variante da economia liberal clássica: o novo liberalismo (neoliberalismo). Essa “mutação” é uma antítese ao Estado de Bem-Estar Social.
O modismo ocasionou o afastamento do poder público de todas as atividades socioeconômicas. O povo foi abandonado à própria sorte. As consequências desses “tempos modernos” foram as piores possíveis: aumento da pobreza, maior concentração de renda e intensificação da desigualdade social. E mais. Aprofundou-se o grau de exploração das grandes potências. O resultado final foi muito sinistro.
Os países periféricos – principalmente o bananal – nunca ficaram tão periféricos. A América Latina, por exemplo, se transformou em América latrina. O grande laboratório do neoliberalismo foi instalado bem aqui ao lado, no Chile do ditador Augusto Pinochet.
O Próximo capítulo dessa história começa com as ascensões do presidente Bill Clinton e do primeiro-ministro Tony Blair, respectivamente nos Estados Unidos e Grã-Bretanha, só para variar. O americano e o britânico se sensibilizaram com o escandaloso mercantilismo global.
Encontraram o mundo praticamente nas mãos dos grandes conglomerados transnacionais. Os dois políticos adotaram a proposta de Giddens. Uma coisa nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Em outras palavras, os governos mundiais não seriam extremamente keynesianos e nem radicalmente liberais. Nascia, dessa forma, a terceira via econômica- que teve curto prazo de validade.
Desce o pano. Abrem-se as cortinas de pindorama. Aqui, os magos do establishment sempre tentaram adaptar a terceira via ao processo político. O monstrengo, porém, jamais prosperou. Agora, para as próximas eleições presidenciais, a elite tapuia ressuscitou a bizarrice. O mais novo candidato a astro da aberração é o ex-juiz Sérgio Moro – o neófito político de araque.
Na ótica tupiniquim, a terceira via seria um contraponto à esquerda é à direita. Para a estratégia prosperar, porém, o mito (ou mico) de Curitiba teria que “roubar” votos do presidente Jair Bolsonaro e do petista Lula da Silva. Essa pretensão é uma pedrada na região dos países baixos. Moro não conseguirá jamais, em tempo algum, levar na conversa os simpatizantes do petista. Ainda mais com aquele charme de marreco.
Mais fácil a turma da estrela vermelha votar no belzebu que no “magistrado” parcial. Por outro lado, o dono da Lava Jato não provoca nenhum encanto no eleitorado bolsonarista. Pelo contrário. Nem os bolsomions arrependidos- por mais que antipetistas- apoiariam o togado de araque.
Conclusão: a terceira via tapuia não passa de jabuticaba. É apenas mais uma ficção (ou fixação) dos mandarins nativos do chamado mercado. De real mesmo- nesse momento- só a velha polarização entre o PT e a direita. Então, nada de novo no front. A configuração política bananeira continua a mesma de há pouco mais de quatro anos.
PS: é hora de parar de chamar Sergio Moro de ex-juiz. Besteira. Ele jamais foi juiz.
Fernando Silva é jornalista e escreve sobre política em DeFato Online.
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