Atendimento prioritário aos advogados nos serviços públicos gera debate na Câmara de Itabira

Projeto de lei foi mal recebido por alguns parlamentares

Atendimento prioritário aos advogados nos serviços públicos gera debate na Câmara de Itabira
Presidente da OAB Itabira, Patrícia de Freitas, faz defesa do projeto aos vereadores. Foto: Victor Eduardo/DeFato Online
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O projeto de lei nº 65/2022, lido no plenário da Câmara de Itabira na última reunião ordinária (11), foi alvo de um intenso debate na Casa nesta segunda-feira (17). A proposta, encaminhada pela Prefeitura Municipal, prevê atendimento “prioritário e diferenciado” aos advogados itabiranos nos serviços públicos. Hoje, cerca de 300 deles atuam ativamente na profissão.

O “privilégio” contemplaria, diz o texto, “todos os órgãos da administração pública direta, indireta, autárquica, fundacional e financeiras com sede no Município de Itabira”. Os advogados contariam, por exemplo, com um guichê próprio para atendimento em bancos, independentemente da distribuição de senhas. Para se beneficiar do projeto de lei, o profissional deverá “apresentar a carteira de identidade profissional emitida pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e procuração assinada pelo cliente que será representado”.

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Representantes da OAB Itabira estiveram na Câmara nesta segunda-feira. Foto: Victor Eduardo/DeFato Online

Sem unanimidade

Discutido hoje durante a reunião de comissões da Câmara, o PL 65/2022 foi alvo de críticas e elogios. Enquanto vereadores como Rose Félix (MDB), Rodrigo Diguerê (PTB) e Júlio do Combem (PP) defenderam a iniciativa, outros, como Júlio Contador (PTB) e Heraldo Noronha (PTB), se opuseram a ela.

Principal crítico da proposta, Júlio Contador conversou com a DeFato Online. O principal incômodo do vereador  quanto ao texto é a segregação de outros profissionais considerados “liberais”, como os próprios advogados. Ele se ampara em um ensinamento do direito para se posicionar contra o PL.

“No Direito tem um termo em latim que diz “Erga Omnes”, que quer dizer que é pra todos ou contra todos. Então aqui na Câmara a gente deve aprovar leis que beneficiam uma categoria, não uma classe. Nessa categoria temos despachantes, corretor de imóveis, médico, arquiteto, engenheiro, pintor, pedreiro, carpinteiro, diversos profissionais autônomos, que pertencem à categoria dos profissionais liberais. E o advogado, que também é profissional liberal, foi estratificado dessa categoria, passando a ser beneficiado por um projeto de lei municipal”, argumenta.

Júlio Contador ainda mencionou outro ponto bastante discutido durante a reunião: a possibilidade de os advogados “furarem fila”. Segundo o petebista, enquanto o cidadão comum esperaria horas para ser atendido, os profissionais jurídicos não enfrentariam a mesma dificuldade, uma injustiça, em sua avaliação.

“Acho que isso vai prejudicar muito quem está na ponta, principalmente o menos favorecido. Aquela pessoa que não tem internet, não tem celular, não tem facilidade de acesso às informações por meio digital. Ele será penalizado nesse sentido. Penso muito numa pessoa que chega cedo na fila de um órgão público e fica até certa hora, até o início da prestação de serviços daquele órgão. E quando ele adentra ao espaço físico, ainda fica de três a cinco horas. E aí o profissional dessa lei é beneficiado, por simplesmente apresentar uma carteirinha da ordem e uma procuração, tendo um atendimento mais célere”.

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O vereador Júlio Contador. Foto: Victor Eduardo/DeFato Online

Em meio à discussão, Luciano Sobrinho (MDB) levantou a hipótese de duas emendas serem incorporadas ao projeto. Uma delas retiraria as instituições financeiras do texto e outra excluiria a ideia do guichê exclusivo. Para Júlio Contador, nenhuma das propostas resolveria o principal problema.

“Isso não vai resolver o problema de quem tá lá na ponta, caso a lei seja aprovada. Então, de antemão, ainda questiono muito esse projeto de lei, acho que não é o melhor para nossa cidade. Estamos aqui por quatro anos para deixar o melhor para o cidadão. Temos que pensar na coletividade e não em uma pequena nata ou classe”, finaliza.

Interpretação equivocada

Presidente da OAB Itabira, Patrícia de Freitas esteve na Câmara para defender o projeto. À DeFato, ela garante que a prioridade seria voltada apenas aos exercícios profissionais dos seus colegas, sem interesses pessoais. A advogada ainda ressalta que a proposta foi interpretada de maneira equivocada.

“Esse projeto é de suma importância para a advocacia. Vejo que se criou muita polêmica com a interpretação um pouco equivocada que deram ao projeto. Mas ele não visa gerar nenhum tipo de benefício para o advogado, e sim resguardar algumas prerrogativas para o profissional no exercício da sua profissão. E que fique muito claro que ele precisa exercer a advocacia de fato, para fins particulares ele não terá nenhum tipo de prioridade no atendimento”, argumenta.

A presidente da seção itabirana da OAB ainda enfatiza a morosidade dos processos judiciais no país, o que prejudica tanto os advogados quanto a população, como um todo. De acordo com ela, a aprovação do projeto de lei ajudaria a resolver tal problema.

“É muito importante que a população entenda que os advogados estão ali representando diversas pessoas. E, por vezes, por mais irrisório que pareça um projeto de lei, ele pode facilitar, e muito, um trâmite de um processo judicial, onde de fato possamos pedir um juiz para oficializar uma requisição de documento, ou uma informação em algum local. Só que esse trâmite, por vezes, dura anos. E a gente tem uma justiça, infelizmente, morosa e que acarreta muitos danos para a população num geral”, pontua.

“Quando precisamos do atendimento, ou, como citado no exemplo, o juiz dá um prazo de cinco ou dez dias para produzir algum tipo de prova, eu preciso fazer um protocolo, aguardar por atendimento, como qualquer outra pessoa. Que fique claro: o advogado não quer se colocar como superior a nenhuma outra classe, mas diante das funções inerentes à advocacia, isso é primordial. O juiz às vezes dá dez dias, quinze dias, e esse prazo precisa ser cumprido”.

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Foto: Victor Eduardo/DeFato Online

Por fim, Patrícia cita que a lei já foi aprovada em cidades como Muriaé, Montes Claros e Varginha, além de também ser discutida na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) desde julho deste ano. Porém, nem sempre a norma é executada.

“A discussão se pautou muito em questão de fila, como se o advogado fosse furar fila. E essa jamais seria nossa intenção. Só queremos que seja resguardado um direito que já existe e é legal, para que as instituições municipais consigam se adequar para oferecer esse atendimento prioritário que é garantido ao advogado mas não é executado”, conclui.