Polícia Federal abre inquérito para apurar se houve racismo contra pesquisadora retirada de voo da Gol

O caso foi registrado em vídeo e divulgado nas redes sociais. Para parte dos passageiros, a resposta das autoridades à situação foi desproporcional e racista

Polícia Federal abre inquérito para apurar se houve racismo contra pesquisadora retirada de voo da Gol
Foto: Reprodução

A pesquisadora Samantha Vitena foi retirada por agentes da Polícia Federal (PF) de um avião da companhia aérea Gol que voaria da Bahia para São Paulo na noite de sexta-feira (28) após ter dificuldades para guardar uma mochila no compartilhamento de bagagens — e reclamar da situação. O caso foi registrado em vídeo e divulgado nas redes sociais. Para parte dos passageiros, a resposta das autoridades à situação foi desproporcional e racista. Para apurar o ocorrido, a Superintendência Regional da Polícia Federal na Bahia comunicou neste domingo (30) a abertura de uma investigação.

A Gol se pronunciou por meio de notas. No primeiro posicionamento, a empresa disse que “uma cliente não aceitou a colocação da sua bagagem nos locais corretos e seguros destinados às malas e, por medida de segurança operacional, não pôde seguir no voo”. Em um segundo comunicado, a companhia disse lamentar “imensamente a experiência da cliente em nosso voo G3 1575.

Segundo Samantha, com o apoio de outros passageiros, a mochila pôde ser acomodada no compartimento de bagagens. Mesmo assim, três agentes da Polícia Federal entraram no avião e a retiraram do voo, alegando que a decisão era do comandante da Gol. Um vídeo sobre a abordagem da cientista foi compartilhado nas redes sociais, no qual é possível ouvir comentários de passageiros que consideraram a ação desproporcional e racista.

“Se eu despachasse meu laptop, ele iria ficar em pedaços. Os comissários não moveram um dedo para me ajudar. Quem me ajudou foi esse senhor e esta senhora (apontando para eles no vídeo), que em três minutos, a gente conseguiu dar um jeito e colocar minha mochila. Pelo contrário, os comissários falaram que se a gente pousasse em Guarulhos (o voo tinha como destino Congonhas), a culpa seria minha, porque eu não queria despachar a mochila. Ele teve a coragem de falar isso para mim”, disse no vídeo.

Samantha embarcou em outro voo da Gol na madrugada de sábado.

Investigação

“Inquérito policial vai apurar a eventual existência dos crimes de preconceito de raça ou cor durante os procedimentos para a retirada compulsória de passageira do voo 1575 da Gol no dia 28 de abril no Aeroporto Internacional de Salvador”, informou a PF neste domingo.

Conforme a corporação, a investigação foi instaurada na Superintendência Regional da PF na Bahia e permanecerá em sigilo até que o caso seja totalmente apurado.

Anteriormente, a Polícia Federal afirmou que foi acionada na sexta-feira pela companhia Gol, no Aeroporto Internacional de Salvador, para efetuar o desembarque de passageira que não teria acatado as ordens do comandante do voo 1575, referentes à segurança de acomodação de bagagens. A passageira foi ouvida pela PF e liberada em seguida. “As circunstâncias do fato estão sendo apuradas”, afirmou.

Governo Federal cobrará explicações da Gol 

Os Ministérios das Mulheres e da Igualdade Racial e a Secretaria Nacional do Consumidor disseram que a Gol precisará “prestar explicações” sobre o caso da passageira negra retirada de um voo em Salvador e que o episódio será notificado à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).

As pastas do governo federal apontaram que o episódio envolve “racismo e misoginia” e que a Procuradoria-Geral da República e a Superintendência Regional da Polícia Federal na Bahia foram acionadas.

‘Racismo nas relações de consumo’, diz secretário nacional do consumidor

No sábado, o secretário nacional do consumidor, Wadih Damous, disse que iria notificar a Gol. “Ao que parece, mais um caso de racismo nas relações de consumo. A Secretaria Nacional do Consumidor atuará com firmeza contra o racismo no consumo”.

Ao Estadão, o advogado Fernando Santos — que acompanhou Samantha até a unidade da Polícia Federal no Aeroporto de Salvador, onde ela prestou depoimento — disse que a situação é lamentável.

Segundo ele, Samantha teve de assinar um Termo Circunstanciado de Ocorrência, por ser acusada de resistência à ordem policial para ser retirada do avião. “Em nenhum momento ela se recusou a sair do avião. Apenas questionou o motivo de sofrer qualquer motivo de restrição”, afirma Santos.

O que diz a Gol

No sábado, emitiu duas notas a respeito do caso:

Primeira nota

“A Gol informa que, durante o embarque do voo G3 1575 (Salvador – Congonhas), havia uma grande quantidade de bagagens para serem acomodadas a bordo e muitos clientes colaboraram despachando volumes gratuitamente. Mesmo com todas as alternativas apresentadas pela tripulação, uma cliente não aceitou a colocação da sua bagagem nos locais corretos e seguros destinados às malas e, por medida de segurança operacional, não pôde seguir no voo.

Lamentamos os transtornos causados aos clientes, mas reforçamos que, por medidas de segurança, nosso valor número 1, as acomodações das bagagens devem seguir as regras e procedimentos estabelecidos, sem exceções. A companhia ressalta ainda que busca continuamente formas de evitar o ocorrido e oferecer a melhor experiência a quem escolhe voar com a Gol e segue apurando cuidadosamente os detalhes do caso.”

Segunda nota

“Lamentamos imensamente a experiência da Cliente em nosso voo G3 1575. Seguimos cuidadosamente apurando os detalhes do ocorrido e reforçamos que não toleramos nenhuma atitude discriminatória”.

* Com Estadão Conteúdo.