O caos argentino ou se ficar o bicho come, se correr o bicho pega

Os eleitores do país vizinho, Argentina, — por meio de uma eleição perigosamente polarizada — escolherão o novo presidente da República

O caos argentino ou se ficar o bicho come, se correr o bicho pega
Foto: Reprodução

No próximo domingo (19), a Argentina escreverá mais um importante capítulo de sua história recente. Os eleitores do país vizinho — por meio de uma eleição perigosamente polarizada — escolherão o novo presidente da República. Uma tarefa difícil. É muito mais fácil derrotar o Fluminense, numa final de Copa Libertadores da América, no Maracanã abarrotado de fanáticos tricolores. Mas a coisa não se resume em simples metáfora do futebol. Antes fosse. A intervenção do “presidente” John Kennedy resolveria tudo com uma bomba (de pé direito).

Mas, não. No final de semana, o exótico Javier Gerardo Milei (La Libertad Avanza) e Sergio Tomás Massa (Unión por La Patria) disputarão a “Casa Rosada”. Esses dois atores são a mais clara representação da ineptidão. Vamos ao ponto. A nação platina está mergulhada em mais uma de suas costumeiras crises socioeconômicas. Essa tragédia é cíclica por lá. Os números — senhores da razão — são extremamente frios. Confira. A inflação (praticamente hiperinflação) alcançou a estratosférica marca de 138,3%, em outubro. A taxa de desemprego encontra-se na casa de 15%. O país tem 45 milhões de habitantes. As reservas do Banco Central literalmente viraram pó. O poder de compra não passa de simples miragem num deserto do desespero. A moeda (o Peso) simplesmente desapareceu do cotidiano das pessoas.

Esse engenho de fogo morto teve uma consequência extrema: o presidente Alberto Fernández desistiu de tentar a reeleição. O “amarelamento” é previsível fruto da inanição geral do (des) governo peronista. Fernández é síndico da maior massa falida do Cone Sul. Mas, às vezes, bizarrice costuma rimar com política. Adivinhe quem é o candidato do establishment? Sergio Massa — o tacanho ministro da economia. Massa assumiu a pasta há um ano. E, desde de então, a Argentina só rolou ladeira abaixo.

Na disputa do primeiro turno, o “mago dos números” fez um discurso surpreendente. Prometeu o inacreditável. Uma mudança radical nos rumos da economia. E o mais incrível aconteceu: 48% do eleitorado acreditaram na lorota. Capítulo seguinte. O gestor da bancarrota foi para o segundo turno com Javier Milei. Mas, atenção. Nada é tão ruim que não possa piorar um pouco mais. Milei é de extrema-direita. Tudo bem. Esse é o novo modismo ideológico do planeta. Mas o ultraliberal é pra lá de um ponto fora da curva. Ele veste simples figurino “maluco beleza”. As suas propostas de governo provocam calafrios no obelisco de Buenos Aires e deixam a “Casa Rosada” roxa.

A primeira medida seria a dolarização da economia. E, como assim? As reservas da moeda americana estão no fundo do poço. Então, dolarizar como? O “milongueiro” também fechará o Banco Central. E o mais estapafúrdio. Jura que romperá relações diplomáticas com a China — um dos principais parceiros comercial do “reino da prata”. A medida seria um monumental tiro no pé. Uma possível vitória de Milei provocará um furacão político na América do Sul. Para começo de conversa, a terra de Messi deixará o Mercosul. As relações com o Brasil ficarão no fio da navalha. Afinal, Milei só trata o presidente Lula por “ex- presidiário corrupto e comunista”.

E as portas do hospício portenho se escancararam de vez. Javier — na maior cara dura — afiança que só decidiu entrar na disputa depois de trocar ideias com os seus quatro cachorros de estimação: Murray, Milton, Robert e Lucas. Os cães são xarás de ícones da macroeconomia planetária. Como se vê, dá para traçar o seguinte panorama para o arranca-rabo argentino: “los hermanos” tentarão escolher o menos sofrível dos candidatos a presidente da República. Nessa extraordinária conjuntura, essa gente se equilibra num dilema digno de dó: Milei ou Massa? Se ficar o bicho come, se correr o bicho pega!!!

P.S.1: Anote aí. Caso se eleja, Javier Milei promete romper relações diplomáticas também com o Vaticano. A justificativa é esdrúxula. O também argentino Papa Francisco seria um “ilustre comunista” ou “um demônio na terra”.

P.S.2: Pergunta que insiste não calar: Javier Milei será um novo Jair Bolsonaro? Claro que não. O argentino é mais intelectualizado que o mito tupiniquim. Ele é economista, professor e escritor. Conclusão óbvia: o pai de Murray é muito mais perigoso.

P.S.3: Cortar relações com Brasil e China não é uma boa ideia para a Argentina. A atitude extrema representaria um déficit de U$$ 20 bilhões na Balança Comercial do País. E tem mais. Cerca de dois milhões de trabalhadores argentinos perderiam seus empregos.

Fernando Silva é jornalista e escreve sobre política em DeFato Online.

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