A curva da pandemia x a curva da economia

Neste momento, a preocupação primária é salvar e manter a vida com a intervenção necessária e responsável dos governos, em todos os níveis, na preservação das empresas, dos empregos e da renda

A curva da pandemia x a curva da economia

Até meados de março deste ano tínhamos uma crise na China provocada por um novo vírus, o COVID-19. Até então, o epicentro da crise era a cidade de Wuhan, com mais de 10 milhões de pessoas, localizada na província de Hubei. Sem remédio e sem vacina, o isolamento social foi a única arma encontrada para barrar a disseminação do vírus.

No dia 02 de março, a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), que reúne as nações mais ricas do mundo, fez uma apresentação com sua economista chefe, Laurence Boone, mostrando os riscos da epidemia chinesa do COVID-19 para a economia global (www.oecd.org/economic-outlook). Naquela época tão recente – mas que hoje parece tão longínqua -, fazíamos as contas do impacto econômico que o mundo sofreria com o isolamento social chinês e a OCDE previa uma queda de 0,5 ponto percentual no crescimento global que ainda seria em torno de 2,9%. Os EUA cresceriam 1,9%, a zona do Euro 1,3%, a própria China cresceria 4,9%, a Índia 4,8%, a Rússia 1,2%, a África do Sul 0,6% e o Brasil 1,1%.

No primeiro momento vivemos a precificação da queda da demanda chinesa, maior importador de commodities do planeta e maior fabricante de quase tudo (o parque industrial do mundo). O preço do petróleo desabou, o minério de ferro foi junto e o isolamento social chinês derrubou também empresas aéreas, empresas de turismo e entretenimento.

E o COVID-19 aterrissou na Europa e mostrou que era o vírus do século XXI, o século da velocidade, da informação em tempo real que passou a ter que conviver e combater um vírus que praticamente se dissemina em tempo real. E o COVID-19 se mostrou mais rápido do que o tempo de preparação e organização de qualquer sistema de saúde do planeta, e a epidemia chinesa se transformou em pandemia, chegou aos EUA, ao Brasil, à África, ganhou o mundo e a terra parou.

A epidemia chinesa que se transformou em pandemia atacou diretamente a economia global e, em especial, o setor de serviços.

Nas últimas décadas, assistimos a um forte movimento migratório da população rural para os grandes centros e em função disso houve um crescimento do setor de serviços na composição relativa do Produto Interno Bruto (PIB) dos países. O PIB é a soma dos bens e serviços produzidos em uma economia. No Brasil, o setor de serviços responde por 70% do PIB, nos EUA por 80%, o mesmo percentual da Zona do Euro, e é por isso que o isolamento social atinge de forma tão dramática a economia. E a desorganização econômica, assim como a capacidade de reação das economias, são diretamente proporcionais ao tempo de duração do isolamento.

Nos EUA, o setor de serviços emprega 80% da população economicamente ativa e responde por 80% do PIB. A indústria emprega cerca de 19% da população economicamente ativa e responde por 19% do PIB, e o setor agropecuário emprega cerca de 1% da população economicamente ativa e responde por 1% do PIB.

Aqui no Brasil temos uma população total de pouco mais de 211 milhões de brasileiros. Deste total, cerca de 106 milhões compõem a população economicamente ativa e, pelos últimos números divulgados pelo IBGE (PNAD CONTÍNUA FEVEREIRO 2020), tínhamos 12,6 milhões de desempregados. A população ocupada era de 93,7 milhões de brasileiros, sendo que cerca de 40,6% dessa população, ou 38 milhões de brasileiros são trabalhadores informais. O número de empregados com carteira assinada no setor privado (inclusive empregados domésticos) era de 33,6 milhões; empregados sem carteira assinada no setor privado eram 11,6 milhões; e os funcionários públicos (estatutários e militares) 11,4 milhões de pessoas. Diante dos números, fica claro o estrago da Covid -19 na economia global e no Brasil, aonde mais de 32 milhões de contas com pedido de auxílio emergencial já foram abertas pela Caixa Econômica.

Os governos, os bancos centrais, os organismos multilaterais do mundo inteiro lançam planos e disponibilizam recursos para prover liquidez e segurança ao sistema financeiro para fazer chegar os recursos capazes de manter empresas, empregos e renda até que o surto seja controlado.

É necessário, nesse momento, bom senso e equilíbrio para que não haja politização e radicalização nas avaliações da intensidade e necessidade do isolamento social que devem ser diárias e feitas de acordo com a especificidade de cada região vis a vis o comportamento do vírus e das disponibilidades de cada sistema de saúde.  

Os atores do espetáculo da economia foram, são e sempre serão as pessoas. Neste momento, a preocupação primária é salvar e manter a vida com a intervenção necessária e responsável dos governos, em todos os níveis, na preservação das empresas, dos empregos e da renda, mas sempre focados na busca de saídas seguras para que a atividade econômica retome seu curso e evite que a crise sanitária, econômica e financeira seja seguida de uma profunda crise social.

Com solidariedade e conhecimento venceremos a terceira guerra mundial.

Rita Mundim é economista, mestre em Administração e especialista em Mercado de Capitais e em Ciências Contábeis

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