Defesa de Daniel Alves pede absolvição em julgamento e sugere alternativas
Após escutar a denunciante e outras testemunhas nos dias anteriores, a juíza Isabel Delgado Pérez ouviu o brasileiro, que alegou inocência
A defesa de Daniel Alves pediu a absolvição do jogador na quarta-feira (7), durante o último dia de audiências para tratar do processo em que ele é acusado de estuprar uma jovem de 23 anos no banheiro de uma casa noturna em Barcelona. Após escutar a denunciante e outras testemunhas nos dias anteriores, a juíza Isabel Delgado Pérez ouviu o brasileiro, que alegou inocência e afirmou que a relação foi consensual, antes de se pôr a chorar ao fim do depoimento. No mesmo dia também foram ouvidos peritos forenses, policiais científicos e peritos contratados pela defesa.
No final da audiência, o Ministério Público manteve o pedido inicial de nove anos de prisão, enquanto a advogada Ester García, representante da denunciante, continua solicitando a pena máxima de 12 anos. A defesa de Daniel Alves, por sua vez, defende a absolvição, mas, caso ele seja condenado, sugere uma pena alternativa de um ano, período já cumprido pelo jogador na cadeia, junto a uma multa de 50 mil euros.
Os atenuantes indicados pela advogada de Daniel, Inés Guardiola, são o consumo de álcool, reparação de danos e violação de direitos fundamentais por suposta parcialidade no processo judicial. Além disso, Guardiola pediu liberdade condicional ao jogador, com a retirada dos passaportes da Espanha e do Brasil. O MP defende que o atleta continue preso por risco de fuga, mesmo com a retenção dos passaportes, pois entende que ele tem amigos influentes. De acordo com a imprensa espanhola, o prazo para a juíza Isabel Delgado Pérez dar um desfecho final ao caso é de 20 dias a partir desta quinta-feira (8).
Daniel Alves prestaria depoimento na segunda-feira (5), mas Pérez atendeu ao pedido da defesa para ele ser ouvido depois da mulher que o acusa, testemunhas e peritos. A audiência ocorre em três dias consecutivos. O jogador mudou sua versão sobre o caso por diversas vezes, trocou de defesa e teve três pedidos de liberdade provisória negados, com a Justiça citando risco de fuga do país.
Veja os principais pontos do terceiro e último dia de julgamento:
Peritos e médicos debatem resultados dos exames
A sessão começou com o depoimento da médica que atendeu a jovem na noite da denúncia. Em relatório, o hospital relatou ferimentos da denunciante. Outros funcionários do local relataram que a mulher estava “assustada e teve momentos de lágrimas” e que não revelou quem era o agressor, apenas disse que ele falava português.
Um dos médicos explicou que não foi constatada lesão vaginal, mas destacou que isso não é motivo para descartar a ocorrência de violência sexual. “Estamos acostumados a ver casos de violência em que não há lesões físicas. 70% das mulheres que procuram o serviço deste hospital não apresentam lesões vaginais”, disse. No exame, foi constatada uma lesão lateral, na parte externa do joelho. A ausência de lesão vaginal e de hematomas em outras parte do corpo foi usada pela defesa para argumentar que “o coito não foi tão traumático”.
De acordo com uma psicóloga forense ouvida pela juíza, a denunciante não deu motivos para suspeitas de que “poderia estar exagerando ou simulando”. A fala corrobora com frases dos médicos, que disseram que a mulher “explicou os fatos de forma coerente”. Peritos forenses dizem ter identificado sintomas de estresse pós-traumático na jovem e explicaram que sentimentos de “culpa ou vergonha” são normais em mulheres agredidas frente a “algo que elas não geraram”. Segundo o relato, ouvir alguém falar em português, por exemplo, a deixa nervosa.
A psicóloga contratada pela defesa de Daniel Alves contesta o diagnóstico, pois defende que os remédios tomados pela denunciante não condizem com o transtorno apontado. Além disso, diz que os exames realizados foram superficiais e que as conclusões “possuem algumas lacunas”. Em resposta, um perito disse que a jovem “teve a vida perturbada” e que é normal vítimas pararem de tomar medicações ou trocarem de terapeuta.
Os peritos que atenderam a mulher confirmaram que o DNA coletado nos exames da denunciante são compatíveis com o do jogador brasileiro. Um dos peritos explicou que não houve ejaculação e a amostra poderia ser esmegma, secreção que contém “muito mais carga genética” do que saliva. A amostra foi extraída três horas depois do ocorrido e a denunciante relatou dor intensa ao urinar
O consumo de álcool do jogador foi outro assunto abordado durante a audiência. Dois peritos forenses da defesa disseram que as “capacidades cognitivas de Daniel Alves estavam ligeiramente afetadas”, mas ele “conseguia distinguir o bem e o mal”. A partir das imagens das câmeras da casa noturna, sugerem que o jogador “não está habituado ao consumo de álcool”.
Após o fim dos depoimentos de médicos e peritos, a audiência teve um breve intervalo. Na retomada, foram exibidos vídeos, como as imagens feitas pela câmera acoplada ao uniforme de um policial que foi à casa noturna na noite de ocorrência. Os jornalistas não têm acesso às imagens, apenas ao áudio.
Depoimento de Daniel Alves
Em sua vez de depor, Daniel Alves relatou que, naquela noite, bebeu duas garrafas de vinho e um copo de uísque. Antes de ir para a casa noturna Sutton, acompanhado do amigo Bruno Brasil, esteve em um restaurante e em um bar. Era Bruno quem dirigia o carro. “Eu havia bebido bastante e não podia conduzir”, disse o jogador.
Na casa noturna, Daniel pediu para utilizar uma mesa à qual está acostumado, que fica localizada perto do banheiro. “Assim, não preciso cruzar a boate para ir”, explicou. “Chegamos ao local reservado, começamos a beber e a dançar. Primeiro, vieram duas mulheres e ficaram dançando um pouco. Depois, vieram as três garotas, a denunciante e suas amigas. Chegaram, nos cumprimentaram e começou uma conversa. Sou uma pessoa aberta, mas com respeito. Acredito que elas sabiam quem eu era porque mais de uma vez me pediram para tirar foto”.
Daniel disse que começou a dançar com a jovem. “Ela começou a dançar mais perto de mim, a roçar suas partes às minhas, uma dança típica de boate, um pouco mais pegada”, afirmou, antes de acrescentar que a mulher teria “colocado a mão para trás e começado a tocar minhas partes”. O jogador relatou que, após a dança, a convidou para ir ao banheiro. “Não precisei insistir”, afirmou. “Falei que ia primeiro ao banheiro e esperei um pouco, pensando que ela não viria, que ela não queria. Quando abri a porta praticamente esbarrei nela na porta”.
Na sequência do relato, o jogador contou ter recebido sexo oral da mulher. “Ela se colocou de joelhos à minha frente e começou a fazer sexo oral. Abaixei as calças e me sentei na tampa do vaso sanitário”, disse. “O sexo oral foi praticamente todo o sexo. Depois, ela se sentou diante das minhas pernas. Quando fui ejacular, ejaculei fora das partes dela”, completou.
O jogador defende que “em nenhum momento, ela disse que não queria nada”. Também garante não ter praticado agressão. “Eu não dei um tapa nela, nem a joguei no chão. Não sou um homem violento. Ela não me disse que não queria fazer sexo”.
Daniel reforçou o que foi dito anteriormente ao longo de todo julgamento sobre o consumo de álcool. “Quando saímos do clube, eu tinha bebido demais. Minha esposa estava dormindo na cama. É a mesma coisa que eu disse no segundo depoimento. No primeiro, eu não disse porque minha esposa poderia não me perdoar”.
Ao fim do depoimento, o jogador começou a chorar e levaram um lenço até ele. “Recebi a notícia de que estavam me acusando de estupro na imprensa. Meu mundo desabou. Fiquei praticamente arruinado porque bloquearam minha conta no Brasil e quebraram todos os meus contratos”, concluiu, sem conseguir dizer mais coisas em meio às lágrimas.
Considerações finais da defesa, acusação particular e Ministério Público
Após a versão de Daniel Alves ser apresentada, o Ministério Público fez suas considerações finais e reforçou seu entendimento de que a denunciante “não pretendia ter qualquer relação sexual” com o jogador. Destacou também que, conforme avaliação das imagens, “a jovem apenas dançava normalmente” e que é “possível perceber um desempenho normal em Daniel Alves no que diz respeito ao álcool”, já que ele “cumprimenta os porteiros em perfeitas condições” e caminha normalmente em direção à sala VIP.
O MP defendeu que ele estava em perfeito controle do que estava fazendo. “Vê-se claramente que Alves é quem aponta para as meninas e sinaliza ao garçom”, pontuou. Também foi dito que o “estresse pós-traumático” está comprovado. “Ele não se importou com os apelos dela. Ele a agarrou do chão, jogou-a no chão e teve que esbofeteá-la várias vezes. Dificilmente pode haver qualquer confusão nessa situação”, disse o MP, em outro momento
Em seguida, a acusação particular, comandada pela advogada Ester García, falou sobre o quanto “foi difícil para a cliente chegar a este julgamento” e defende que “não se pode pedir a ela que tenha memória fotográfica. Depois, a defesa, feita pela advogada Inés Guardiola, disse que a versão da denunciante é “incoerente”, já que “não se viu ela incomodada quando se sentou” à mesa com Daniel Alves.
Dias 1 e 2 de julgamento
O Tribunal de Barcelona rejeitou pedido do Ministério Público da Espanha para que a audiência fosse realizada com portas fechadas As sessões acontecem de forma aberta, com a presença da imprensa em sala à parte, mas captações de áudio e imagem estão vetadas.
A mulher que denunciou Daniel Alves teve a identidade preservada e realizou o depoimento na segunda-feira, protegida por um biombo para que não tivesse contato visual com o jogador. A imagem dela foi reproduzida em vídeo para os presentes, com a imagem e voz distorcidas. A medida visou proteger a identidade da denunciante. Sua versão durou cerca de 1h30 e ela reafirmou ter sido violentada pelo atleta.
Na segunda sessão, terça-feira, foram ouvidos três amigos do jogador que estavam na casa noturna; três empregados da casa noturna; advogado convocado por uma amiga da denunciante; 11 policiais; policial que gravou o relato da vítima da suposta agressão do brasileiro com uma câmera na farda.
Joana Sanz, mulher de Daniel Alves, também depôs. A versão dela, dos amigos e do gerente mencionam o estado de embriaguez do jogador no dia do caso. Além deles, um sócio da casa noturna foi ouvido e chegou a dizer que a mulher confessou a ele que entrou no banheiro de maneira voluntária, mas foi impedida de sair depois.