Mais rejeito, menos compromisso: com novo projeto, Vale amplia riscos em Itabira e ignora demandas da população

Pedido de anuência para ampliar cavas e instalar pilhas de rejeito será discutido em reunião pública do Codema na próxima segunda-feira; população pode participar

Mais rejeito, menos compromisso: com novo projeto, Vale amplia riscos em Itabira e ignora demandas da população
Mina de Conceição da Vale, em Itabira – Foto: Esdras Vinícius

A mineradora Vale está tentando ampliar as cavas e pilhas de estéril e rejeito das minas do Meio e de Conceição, em Itabira, e levar adiante um projeto que pode prolongar suas atividades no município por quase duas décadas. O pedido de anuência será discutido na próxima segunda-feira (12), às 17h, durante uma reunião pública do Conselho Municipal de Meio Ambiente (Codema), no auditório da Prefeitura Municipal.

A proposta não tem como objetivo aumentar a produção, mas estender por até 19 anos o beneficiamento de minério de ferro. Na prática, trata-se de mais tempo de extração em uma cidade já marcada por mais de 80 anos de impactos socioambientais causados por uma mineração predatória, além da ausência de contrapartidas efetivas e recorrentes episódios de omissão por parte da empresa.

Mais rejeito, menos garantia

O projeto prevê ainda a instalação de duas novas pilhas de rejeito seco, em substituição ao modelo de barragens, proibido pela Lei Mar de Lama Nunca Mais (Lei Estadual nº 23.291/2019). Apesar disso, os riscos associados a essas estruturas continuam sendo minimizados no debate técnico e institucional.

O histórico recente acende o alerta: no final de 2024, uma pilha de estéril se rompeu em Conceição do Pará, centro-oeste de Minas Gerais, obrigando a evacuação de famílias inteiras. Em Itabira, onde dezenas de estruturas já cercam a área urbana, a construção de novas pilhas aumenta a apreensão e nenhuma medida concreta de segurança foi detalhada à população até agora. 

Contrapartidas ausentes

Apesar da dimensão do projeto, a Vale não apresentou qualquer proposta concreta de contrapartidas para Itabira. O município, que há décadas carrega os ônus da mineração, segue sem respostas sobre investimentos sociais, compensações ambientais ou alternativas à dependência econômica da atividade extrativa.

Leonardo Ferreira Reis, conselheiro representante da Cáritas Diocesana no Codema, pontua que a empresa fala em prolongar sua atuação até além de 2041, mas não diz quantos empregos serão garantidos nem como pretende mitigar os impactos à saúde, à água e ao modo de vida das comunidades atingidas. “Não existe garantia de emprego, os salários dos trabalhadores da Vale, em Itabira, são mais baixos do que em outras regiões, a segurança do trabalho é frágil”, ressalta.

Impactos

Leonardo expressa preocupação com os impactos do novo projeto minerário em Itabira, prejudicando ainda mais a qualidade do ar e a possibilidade de rebaixamento do lençol freático. Ele cita ainda consequências já visíveis, como a expulsão de agricultores, produtores de alimentos e moradores da região da rodovia 105, que será suprimida. “Isso vai impactar os moradores daquela região toda: Vila Paciência, Vila Amélia, Penha e outros bairros ali próximos.”

Outro ponto crítico é a ausência de diálogo da Vale com a população e com o próprio Codema: “Há pelo menos seis meses esperamos dados sobre as pilhas antigas e sobre as novas estruturas”, comenta.

Além disso, o conselheiro aponta a falta de confiança dos moradores em relação à mineradora. “As pessoas vivem em áreas de risco, mas não recebem informações adequadas nem confiam na mineradora. A Vale é responsável por crimes como o de Brumadinho, que matou 272 pessoas”, lembra. Para ele, o fracasso do simulado de emergência é um símbolo dessa desconfiança generalizada.

Participação é essencial

Leonardo reitera que reunião pública foi marcada após pressão popular e entidades da sociedade civil organizada, já que não havia intenção original de tornar o debate público.

A ocasião será um espaço fundamental para que moradores, trabalhadores e organizações apresentem suas críticas, dúvidas e exigências. As manifestações registradas durante o encontro serão encaminhadas à Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), que tem a palavra final sobre o licenciamento. “A população tem resistido de forma organizada e isso pode avançar tanto para os seus direitos quanto para a superação da economia, mas também é importante dar visibilidade para essa resistência do dia a dia, da dona de casa, do trabalhador e das pessoas que estão aí no seu cotidiano resistindo aos impactos da mineração”, finaliza Leonardo.