O isolamento dos Estados Unidos será a grande proeza de Donald Trump

O “dono” da fazenda de Tio Sam tem ponto de vista consolidado: para ele, o mundo não passa de aldeia dos cafundós do judas.

O isolamento dos Estados Unidos será a grande proeza de Donald Trump
Foto: Isac Nóbrega/PR/Flickr
O conteúdo continua após o anúncio


O filme de faroeste é gênero cinematográfico tipicamente americano. Hollywood já produziu memoráveis histórias sobre o velho Oeste. O Bang Bang até admite analogias com os dias atuais. Donald Trump tem pinta, comportamento e estilo de cowboy. Veja bem. O mandachuva maior do planeta apresenta carranca amarrada, peito estufado e rosna como um malfeitor. O sujeito é o cafajeste que chega ao pôr do sol para azucrinar a vida de pacato povoado. Comporta-se como “salvador da pátria”. O “dono” da fazenda de Tio Sam tem ponto de vista consolidado: para ele, o mundo não passa de aldeia dos cafundós do judas. E tome tiroteio (leia-se taxação) para todos os lados.

O big pic fingiu punir México e Canadá. Os dois países sofreriam um aumento de 25% sobre bens exportados para os EUA. Puro teatro. Era mentirinha.  A encenação permitiu Donald praticar o esporte de sua predileção: a chantagem institucional. O jogo de cena impôs dura humilhação ao canadense Justin Trudeau e à mexicana Claudia Sheinbaum. O colombiano Gustavo Petro foi a primeira vítima do americano na arena da geopolítica.

A dinâmica trumpiana funciona com método. “Orange” leva a mão ao coldre, faz cara feia e amedronta o adversário. Mas, atenção. A arma de fogo normalmente não tem munição. A China do enigmático Xi Jinping desmontou a farsa. O republicano tarifou os asiáticos em 10%. Os chineses não afinaram e devolveram no mesmo tom. Carimbaram com 10% os produtos “made in USA”. Aviões, aparelhos eletrônicos e equipamentos médicos receberam tarifação de 10% a 15%.

Mas, cá para nós, a estratégia do nortista falastrão tem alguma eficácia prática? Até certo ponto. A artimanha, em algum momento, pode se voltar contra o autor da arruaça financeira planetária. Observe o pragmatismo do sistema. A retórica trumpista é “eles precisam de nós, mas nós não precisamos deles”. Não é bem assim. Os Estados Unidos produzem pouco e importam quase tudo que consomem. Não colhem grãos suficientes para alimentar a sua própria população. A maior potência do cenário internacional também não possui matéria prima e nem energia para a totalidade da demanda interna. “America first”, portanto, é imensa fábrica de ilusões.

E se Trump resolver taxar o Brasil? A princípio, causaria alguns transtornos. Mas “Pindorama” não permaneceria eternamente num beco sem saída. Há duas alternativas para se safar da encrenca. Uma. Aumentar as exportações para os membros do Brics e União Europeia. Outra. Consolidar a China como principal parceiro comercial. E, depois, aguardar. É bom ficar de olho na flexibilidade da corda do atual exótico morador da Casa Branca.

As medidas draconianas do “neoditador” Donald Trump estão sujeitas à lei do retorno. A expulsão intensiva de imigrantes, por exemplo, é faca de dois gumes. De repente, chega a hora da onça beber água. Afinal, quem vai limpar banheiros, coletar lixos, dirigir taxis, vender hambúrguer ou fazer serviços de pedreiros? Lógico, latinos e africanos. E mais. A natural reciprocidade nas taxações poderá acelerar o processo inflacionário dos States. E pior. A aldeia global anda com nojo do mandarim “puritano”. Ninguém está suportando a arrogância do cara. Neste contexto, Trump poderá passar à história com uma façanha inimaginável: o isolamento planetário dos Estados Unidos. Caminha para isso.

P.S. 1: a proposta de expulsão dos palestinos da Faixa de Gaza (um novo êxodo) é execrável. Trata-se de limpeza étnica. Donald Trump planeja transformar o local numa “Riviera do Oriente Médio”. Como se vê, Donald é a reencarnação de Adolf.

P.S. 2: é bom ficar atento aos sinais de fumaça da aldeia de Washington. O cenário não é animador. A taxação sobre produtos brasileiros poderá começar nos próximos dias. Ao que tudo indica, a lista inicial tem aço e etanol.

Fernando Silva é jornalista e escreve sobre política em DeFato Online.

O conteúdo expresso é de total responsabilidade do colunista e não representa a opinião da DeFato.

MAIS NOTÍCIAS