Sistema Pontal: MP move ação contra a Vale por reparação aos atingidos pelas barragens

O Ministério Público pede na Justiça a indisponibilidade de bens da Vale no valor de R$ 500 milhões. A ação busca resguardar os direitos dos atingidos pelas obras de descaracterização do Sistema Pontal, em Itabira

Sistema Pontal: MP move ação contra a Vale por reparação aos atingidos pelas barragens
Sistema Pontal, em Itabira – Foto: Divulgação
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O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) entrou com Ação Civil Pública (ACP) contra a mineradora Vale pela perda da estabilidade e elevação do risco de rompimento de barragens de mineração e diques pertencentes ao Sistema Pontal, do Complexo Minerário localizado em Itabira. Para isso, o órgão pediu à Justiça a indisponibilidade dos bens da empresa no valor de R$ 500 milhões. Esse procedimento foi comunicado pelo MPMG na última segunda-feira (25).

Além de solicitar a indisponibilidade de bens, o MPMG também pede que a mineradora contrate uma assessoria técnica independente para prestar consultoria e orientar os atingidos. Dessa forma, o órgão quer que a Vale deposite, em 15 dias úteis após a decisão judicial, um valor inicial de R$ 10 milhões para o Fundo Municipal de Saúde de Itabira — medida que tem como objetivo cobrir os gastos públicos com demandas extraordinárias nos serviços municipais de saúde em Itabira.

De acordo com release publicado no site do MPMG, a “ACP visa condenar a requerida a reparar integralmente as pessoas atingidas pelos danos e impactos socioeconômicos decorrentes da perda de estabilidade e também das obras de reforço, descaracterização ou descomissionamento das referidas barragens e diques”.

“Os diques e barragens do Sistema Pontal utilizam a técnica reprovada do alteamento a montante e, de acordo com a Lei Mar de Lama Nunca Mais, necessitam se submeter a obras de reforço e intervenções para descaracterização. De acordo com a ACP, o risco de rompimento acaba sendo agravado pela execução de obras de engenharia para reforço e descaracterização, que incluiu a construção de estruturas de contenção à jusante (ECJSs), causando ‘graves e intoleráveis impactos socioeconômicos às pessoas atingidas’, inclusive com a previsão de remoção compulsória de algumas centenas de famílias atingidas”, continua o comunicado do MPMG.

Para garantir a reparação integral das pessoas atingidas, o órgão, por meio da 2ª Promotoria de Justiça de Itabira, com apoio da Coordenadoria de Inclusão e Mobilização Sociais (Cimos), “postula a indisponibilidade dos bens da mineradora no valor de R$ 500 milhões. A ACP requer ainda a contratação, às custas da Vale, de entidade para prestar assessoria técnica independente às pessoas atingidas, como forma de garantir a adequada participação e informação, conforme previsto na Política Estadual dos Atingidos por Barragens, Lei Estadual 23.795/21“.

“O MPMG constatou que essas intervenções, ou a possibilidade de ocorrerem em futuro próximo, e a própria conduta da Vale no território, vêm causando danos e provocando violações de direitos coletivos e individuais da população atingida. Pelo menos quatro bairros do núcleo urbano de Itabira podem ser afetados em caso de rompimento das barragens e diques”, aponta o MPGM.

Na ação, o Ministério Público postula, para estruturação do processo, a designação de perícia que identifique a população atingida, apure os danos sofridos e mensure os montantes indenizatórios de forma independente e imparcial.

Além disso, para garantir o direito à continuidade dos serviços públicos, requer que seja imposta à Vale obrigação de destinar recursos para cobrir os gastos públicos com demandas extraordinárias nos serviços municipais, em especial nas áreas de Saúde e Assistência Social, mediante o depósito inicial de R$ 10 milhões.

Preventivamente, órgão também pede que, em caso de necessidade de remoção ou evacuação emergenciais, entre outras medidas, que a Vale pague, imediatamente, um salário mínimo para os adultos, meio salário mínimo para adolescentes e um quarto de salário mínimo para crianças que forem removidos — desde que sejam proprietários ou exerçam atividades comerciais em imóveis evacuados — durante o tempo em que durar essa remoção. Está previsto, ainda, pagamento de cesta básica e cinco refeições diárias e obrigação de garantir moradia digna e adequada para os atingidos.

Nota oficial

A Vale distribuiu uma nota se posicionando em relação ao caso. Confira na íntegra:

“A Vale esclarece que o Sistema Pontal do Complexo de Itabira está paralisado, não recebe rejeitos desde março de 2019, e em nível 1 de alerta do Plano de Ação de Emergência de Barragens (PAEBM), o que não representa risco iminente de rompimento.

Os diques Minervino, Cordão Nova Vista, 2, 3, 4 e 5 compõem o Sistema Pontal, cujo processo de descaracterização foi iniciado em 2020. Dessas estruturas, o dique 5 já foi eliminado e não possui mais a função de barragem. Estão em processo de descaracterização os diques 3 e 4.

Além de consultores externos da Vale, todo o processo de descaracterização das estruturas a montante do Sistema Pontal está sendo acompanhado pelas autoridades competentes, auditoria técnica independente do Ministério Público de Minas Gerais e Prefeitura. Todos os requisitos legais estão sendo observados, inclusive aqueles voltados ao monitoramento, mitigação e controle de eventuais impactos.

Sobre a Ação Civil Pública, a empresa esclarece que ainda não foi citada”.

O que mais a Vale diz?

No final de março, o portal DeFato conversou com a mineradora Vale, que informou ainda não há uma definição quanto ao número de pessoas impactadas pela descaracterização do Sistema Pontal, em Itabira. A empresa, ainda, destacou que estudos estão sendo realizado e que somente após o término dessas análises será possível determinar o impacto total do empreendimento para a população local.

“Estudos relacionados ao Programa de Descaracterização de estruturas construídas a montante de Itabira ainda estão em fase de desenvolvimento. O número de edificações e de pessoas impactadas será identificado quando houver definição do projeto, sendo que a intenção é implantar o projeto que gere o menor impacto social possível considerando as alternativas de engenharia disponíveis”, diz trecho da nota emitida à época pela Vale.

 

“A Vale iniciou, em novembro de 2021, diálogo com a comunidade para as remoções programadas no bairro Bela Vista, em Itabira. Para garantir celeridade, transparência e isonomia no processo de compensações sociais às pessoas envolvidas, a empresa assinou Termo de Compromisso Geral com a Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais (DPMG). Está sendo construído um Termo de Compromisso Específico com a instituição de justiça citada, quando serão definidos os parâmetros das indenizações. Resultados parciais dos estudos, que ainda estão sendo realizados, conforme plano de descaracterização das estruturas construídas a montante do Sistema Pontal, indicaram a necessidade de preparar uma área vizinha à barragem para reduzir os impactos na comunidade durante as obras de descaracterização. Para essa etapa específica, serão considerados dez imóveis e todo o processo será discutido com as pessoas diretamente envolvidas, em conjunto com a DPMG”, aponta outro trecho da nota.

Por fim, a mineradora garante que “todo o processo de descaracterização das estruturas a montante do Sistema Pontal está sendo discutido com o Ministério Público, com a auditoria AECOM, a Defensoria Pública, e acompanhado pela Prefeitura [de Itabira]. Todos os requisitos legais serão observados”.

“O diálogo com os moradores dos bairros Bela Vista e Nova Vista está seguindo de modo a cumprir com o Termo de Compromisso Geral firmado pela Vale com a DPMG. Eventuais indenizações ao Município serão avaliadas caso seja constatado algum dano ao seu patrimônio. Importante reforçar que a Vale já repassa ao município valores referentes à Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM) conforme legislação”, finaliza a empresa.