Zé Fernando quer verba de Brumadinho na diversificação econômica das cidades mineradoras

Prefeito de Conceição do Mato Dentro concedeu entrevista exclusiva à DeFato Online

Zé Fernando quer verba de Brumadinho na diversificação econômica das cidades mineradoras
À esquerda da foto, Zé Fernando faz pronunciamento ao lado de Bernardo Mucida, presidente da Comissão de Minas e Energia.

O prefeito de Conceição do Mato Dentro, José Fernando Aparecido de Oliveira- popular Zé Fernando- assumiu a presidência da Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais e do Brasil (AMIG) no início deste ano. De cara, decidiu enfrentar um complicado desafio: a redefinição do objetivo da verba para reparação dos danos ambientais da tragédia de Brumadinho.

Em fevereiro, a Vale e o Governo de Minas Gerais firmaram um acordo no valor de R$ 37,6 bi (mais exato: R$ 37.689.767.329,000). Esse recurso será utilizado na construção do rodoanel, em hospitais e no metrô de Belo Horizonte, por exemplo. “A maior parte desse investimento deveria ser na diversificação econômica dos municípios minerados”, reivindica o presidente da AMIG.

Zé Fernando entende que Itabira tem preferência histórica nesse processo: “Eu acho que, por ser a Vale, a antiga Itabira Iron, Itabira deveria ter sido colocada no centro desse acordo”, justifica. Nesta segunda-feira (22), José Fernando participou de uma audiência pública da Comissão de Minas e Energia, da Assembleia Legislativa de Minas Gerais.  Depois do evento, ele deu a seguinte entrevista à “DeFato” (Fernando Silva).

DeFato: O governo de Minas e a Vale assinaram um acordo de R$ 37,6 bi para a reparação dos danos ambientais provocados pela tragédia de Brumadinho. Esse processo- ao longo do tempo- provocou um debate com a participação de diversos segmentos da sociedade. A Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais e do Brasil (AMIG), entidade que o senhor preside, ficou de fora do debate. Qual o motivo desse desprestígio?

José Fernando Aparecido de Oliveira: A AMIG não foi sequer convidada para dar a sua opinião sobre esse acordo, cujos recursos financeiros são provenientes dos nossos municípios minerados. Isso nos causou espanto e nos causa perplexidade, até hoje.

DeFato: Mas o senhor não procurou saber os reais motivos dessa exclusão?

José Fernando: A gente continua insistindo no diálogo. E, aqui, eu repito a máxima que aprendi com o meu pai (o ex-deputado José Aparecido de Oliveira): Vamos ficar roucos de tanto ouvir. Na verdade, meu pai repetia essa frase, que é do Benedito Valadares. Mas não existe política sem diálogo, não existe construção de políticas públicas sem diálogo, não existe a construção do consenso sem diálogo. Então, foi cortada a nossa possiblidade de diálogo e contribuição. E qual seria a nossa contribuição? A discussão sobre a diversificação econômica dos territórios minerados. Nós gostaríamos de expor esse ponto ao governo de Minas e à companhia Vale. Nada contra o anel rodoviário de Belo Horizonte, muito pelo contrário. Nada contra essas obras que estão sendo propostas, mas nós gostaríamos de colocar essa questão (a diversificação econômica) como fundamental e importante na agenda das discussões.

DeFato: E qual seria a estratégia da AMIG para a distribuição desse recurso, nessa chamada política de diversificação econômica dos municípios mineradores de Minas Gerais?

José Fernando: Eu acho que cada caso é um caso. O caso de Conceição do Mato Dentro, por exemplo, é diferente do caso de Nova Lima ou Itabirito. Nós precisamos potencializar as vocações que existem nas cidades (mineradoras) e regiões. Nós temos que fazer um diagnóstico para determinar essa vocação. E, a partir daí, começaria um investimento, de forma planejada, para que a gente saia dessa minerodependência, que assola os nossos municípios e o estado de Minas Gerais.  Essa diversificação econômica passa, também, pela agregação de valor ao nosso produto, porque hoje nós desenvolvemos o nosso produto para fora do Brasil, mas precisamos desenvolver o nosso produto para dentro do Brasil. O produto tem que ser industrializado aqui, com a geração de emprego e renda. A região de Itabira, por exemplo, tem potencial para uma siderúrgica. 

DeFato: E quem mais levou vantagem com essa reparação financeira pelo desastre ambiental foi o estado federativo (Minas Gerais), não os municípios mineradores. O governo de Minas Gerais não se beneficiou de cadáveres e da ruína ambiental?

José Fernando: O estado, na verdade, está fazendo caridade com o chapéu alheio. Ele não está tendo sensibilidade com os municípios de onde provêm esses recursos financeiros, pois sequer fomos ouvidos e sequer participamos desse acordo. Eu acho que por ser a Vale, a antiga Itabira Iron, Itabira deveria ter sido colocada no centro desse acordo.

DeFato: Waldir Salvador (diretor da AMIG) destacou alguns pequenos acidentes ambientais da década de 1980. Essas ocorrências não deveriam ter sido uma advertência para as entidades governamentais? Acaso, aqueles imprevistos não foram o prenúncio das recentes tragédias de Mariana e Brumadinho?

José Fernando: Essa colocação vai de encontro ao que sempre falo: falta planejamento, falta conhecimento técnico e falta estrutura para a Agência Nacional de Mineração, que não tem a capacidade de promover e, muito menos, fiscalizar a atividade mineradora. Agora, vamos fazer um convênio de delegação de poderes para os municípios, que será um grande avanço na questão da fiscalização. Eu acho que hoje não tem mais espaço, na mineração brasileira, para uma mineradora que não tenha a sustentabilidade e a segurança em seu DNA. E, agora, a diversificação econômica, que precisa ser colocada no início da atividade, não no fim. É o que está acontecendo com Itabira, onde estão discutindo diversificação econômica, na exaustão das minas.

DeFato: Essa discussão sobre sustentabilidade é relevante para Itabira, onde a Vale se prepara para encerrar o seu período extrativista. As futuras gerações herdarão gratuitamente esse cenário de montanhas esburacadas e barragens abandonadas?

José Fernando: Qual o legado que a mineração de ferro está deixando para Minas Gerais e para o Brasil? O legado deixado pela mineração do ouro foi o barroco. Minas Gerais tem mais da metade de todo o patrimônio histórico tombado, do Brasil. Essa riqueza arquitetônica é graças à mineração do ouro. E qual é o legado da mineração do ferro? O barraco. E esse barraco é outro nome para problemas sociais e ambientais, do pós-mineração.

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