À espera de um emprego: contratação de ‘forasteiros’ é desafio aos moradores de Conceição do Mato Dentro
Entidades de classe e comunidade se mobilizam para garantir a preferência da mão de obra local no empreendimento bilionário da Anglo American
Dhayana Generoso Ribeiro, 22 anos, é nascida e criada em Conceição do Mato Dentro. Ela está desempregada, tem três filhos – de um, três e quatro anos de idade – e o marido faz bicos para o sustento da família. A jovem, que trabalhava como operadora de caixa, e o companheiro dela, que tem várias ocupações na carteira de trabalho, estão entre tantas famílias da cidade que depositam na ampliação do Minas-Rio, da Anglo American, a esperança de uma vaga de trabalho.
Em Conceição, o aborrecimento dos desempregados que nasceram ali é ver trabalhadores de fora da cidade chegando para fazer a vida nas obras da Anglo, enquanto esperam ter a mesma sorte. “Infelizmente essa realidade não é de hoje. Antes as coisas eram mais baratas e um pouquinho dava para passar o mês. Agora, tudo ficou mais caro – o supermercado encareceu, as contas subiram, o custo de vida não para de aumentar. Nós deixamos vários currículos, mas ninguém nos chamou. E, temos visto pessoas de outras cidades sendo contratadas. Estão dando mais ocupação aos de fora que aos daqui”, relata Dhayana.
O comentário da contratação de “forasteiros” circula o município de 18 mil habitantes (IBGE). Grupos foram organizados no WhatsApp (aplicativo de mensagens para celulares), onde os participantes planejam manifestações para chamar a atenção da mineradora. Os protestos ainda não têm data acertada, mas a mobilização cresce na cidade.
Em 26 de janeiro, a Anglo American conquistou as Licenças Prévia (LP) e de Instalação (LI) para a Etapa 3 do Sistema Minas-Rio, de produção de minério de ferro em Conceição do Mato Dentro e Alvorada de Minas. As licenças foram concedidas após audiência realizada pela Câmara Técnica Especializada de Atividade Minerárias (CMI), em Belo Horizonte.
A companhia estima investir R$ 1 bilhão no empreendimento, com criação de 800 empregos no pico das obras. Conforme o Grupo Anglo American, a produção de minério na região tem ao menos 4.800 empregados diretos e indiretos, dos quais aproximadamente 1.600 são mão de obra da região da mina.
Anglo garante prioridade de contratação local
Procurada por DeFato, a Anglo afirmou que a contratação de mão de obra da região “é prioridade para a empresa”. Segundo a companhia, mais de três mil currículos de pessoas de Conceição do Mato Dentro, Alvorada de Minas, Dom Joaquim e Serro estão sendo analisados para a Etapa 3. “O objetivo é identificar aqueles que possuem o perfil adequado para as vagas abertas, que, no momento, são 200”, esclareceu a mineradora, em nota.
As 200 vagas citadas são para trabalhar nas empreiteiras terceirizadas do Minas-Rio. São funções como elétrica, mecânica, lubrificação, carpinteiro, pedreiro, encanador, motorista e soldador.
O grupo empresarial também citou suas parcerias visando à capacitação de pessoas na região de Conceição para disputarem, democraticamente, as vagas de trabalho. Uma dessas parcerias é com o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai). “Já passaram pelos cursos mais de 650 profissionais, dos quais 532 foram contratados para trabalhar no Minas-Rio. Em 2017, no sétimo ciclo do programa de formação de mão de obra do programa, outras 86 pessoas se formaram no curso de Operador de Equipamentos de Mina, sendo que 44 foram contratadas. Uma nova turma de eletricistas, soldadores e mecânicos, composta por 90 pessoas, deverá se formar em junho de 2018”, enumerou a companhia.
Inscrições também ocorrem presencialmente
A Anglo afirma também que a captação de trabalhadores não ocorre somente pela Internet. Interessados em trabalharem na Etapa 3 do Minas-Rio podem deixar o currículo em um dos postos de divulgação da empresa nas cidades de Conceição do Mato Dentro, Serro, Dom Joaquim e Alvorada de Minas. A companhia disponibilizou um telefone para dúvidas sobre o assunto: 0800-941-7100 (ligação gratuita).
Colegiado quer novos filtros de seleção
Um colegiado que reúne a Associação Comercial e Empresarial de Conceição do Mato Dentro (Ace), a Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL), Prefeitura e Câmara de Vereadores acompanha o caso das contratações. Na quinta-feira passada, 8 de fevereiro, uma reunião foi feita pelo grupo na sede do Legislativo municipal, quando as lideranças formataram critérios para contratação de mão de obra da cidade no Minas-Rio. O documento foi entregue à mineradora.
O presidente da Ace e CDL, Coryntho Filho, citou situações em que pessoas tentam se passar por moradores da cidade, usando um comprovante de residência, mas com telefone para contato com outros DDDs. Tendo isso em vista, o colegiado propôs filtros de seleção mais específicos e aguarda que eles sejam adotados pela Anglo.
“Criamos critérios para definição da mão de obra conceicionense para além do que a Anglo tem definido. Por exemplo, se o cidadão comprova que nasceu em Conceição do Mato Dentro – por meio de sua naturalidade na carteira de identidade -, se tem filiação no município, se tem histórico escolar em Conceição, se casou-se com um (a) conceicionense, enfim, há um total de sete critérios definidos para que pudéssemos proteger, ao máximo, o trabalhador conceicionense”, comentou.
Sindicato acompanha contratações
O Sindicato Metabase, que representa trabalhadores da Anglo e suas subcontratadas, participou da audiência de liberação das licenças ambientais no mês passado na capital. Diretor tesoureiro do Metabase, Carlos Roberto Assis Ferreira, o “Carlão”, defende a expansão do Minas-Rio, “desde que assegurada a empregabilidade de mão de obra local”.
“Nós comparecemos à audiência e defendemos a liberação da licença de expansão da fase 3, mas por acreditarmos que a geração de emprego e renda é a principal forma de melhorar a vida da população que vive em Conceição do Mato Dentro e cidades da região. Com a criação de novos postos de trabalho iremos aumentar a nossa fiscalização e as nossas cobranças em cima da Anglo, mostrando à empresa que ela tem responsabilidade com os seus trabalhadores”, defendeu o sindicalista.