Pressão nos preços
IPCA, índice que mede a inflação oficial do Brasil, acumula alta de 0,70% em 2020
O preço do arroz, do óleo de soja, do óleo de milho , das carnes em geral, foi o destaque, dos últimos dias, nas conversas sobre lista de supermercado das famílias… E quando a gente vê a divulgação do IPCA, Índice de Preços ao Consumidor Amplo de agosto, que subiu 0,24% e teve a maior alta para agosto desde 2016, a gente começa a entender a razão de tanta prosa. Com este resultado, o índice que mede a inflação oficial do Brasil acumula alta de 0,70% em 2020, em 12 meses, de 2,44%, acima dos 2,31% observados nos 12 meses imediatamente anteriores.
O IPCA mede o comportamento dos preços da cesta de produtos consumidos pelas famílias com rendimentos de 01 a 40 salários mínimos, e está completando 40 anos de uso no cálculo da inflação brasileira. O índice divulgado desde 1980 nasceu em um país imerso em inflação elevada. Entre 1980 e 1994, ano de implantação do Plano Real, o índice acumulado foi de 13 342 346 717 671,70%!
Depois de passar por muitos planos mirabolantes e por anos de hiperinflação o IPCA se tornou um produto consolidado e balizador do regime de metas para a inflação do Brasil, que está em vigor desde 1999 e ainda é usado no cálculo dos rendimentos pagos pelas NTN-B do Tesouro Nacional.
Além do IPCA , o IBGE também calcula o INPC , Índice Nacional de Preços ao Consumidor que mede a variação dos preços de uma cesta de produtos consumidos pelas famílias com renda de 01 a 05 salários e por isso capta o impacto na variação de preços de produtos essenciais, já que o IPCA ao medir o comportamento dos preços da cesta de produtos consumidos pelas famílias com renda de 01 a 40 salários engloba uma parcela maior da população e uma cesta com muito mais itens de consumo do que a do INPC. É por isso que quando a alta de preços se dá nos grupos de Alimentação e Bebidas , e, Transportes o INPC sofre mais. Em agosto, na média o IPCA ficou em 0,24% enquanto o INPC registrou alta de 0,36%
A maior variação mensal do IPCA foi em março de 1990 (82,39%), enquanto a menor variação foi em agosto de 1998 (-0,51%). Feliz de quem nasceu, no Brasil, depois de 1990 por não ter convivido e vivenciado os anos mais caóticos da história econômica brasileira, já que desde 01 de julho de 1994 , o Real existe e resiste à alta generalizada de preços também conhecida como inflação.
Voltando ao início do nosso raciocínio , os dados divulgados na quarta feira pelo IBGE mostram que dos nove grupos de produtos e serviços pesquisados, seis tiveram alta em agosto. A maior variação veio dos Transportes (0,82%), que apresentaram também o maior impacto positivo no índice do mês (0,16 p.p.). A segunda maior contribuição (0,15 p.p.) veio de Alimentação e Bebidas, que registrou alta de 0,78%.
Os grupos habitação (0,36%) e Artigos de residência (0,56%) também tiveram alta, mas desaceleraram na comparação com o mês anterior (0,80% e 0,90%, respectivamente). No lado das quedas, o destaque ficou com o grupo educação (-3,47%), que contribuiu com -0,22 p.p. no IPCA de agosto. Os demais grupos ficaram entre a queda de 0,78% em vestuário e a alta de 0,67% em Comunicação.
Os transportes (0,82%) tiveram alta pelo terceiro mês consecutivo, influenciados, mais uma vez, pelo comportamento dos preços da gasolina, que subiram 3,22% em agosto. O óleo diesel (2,49%) e o etanol (1,29%) também registraram variação positiva, enquanto o gás veicular recuou 0,79%.
Ainda em transportes, os preços dos serviços de transportes por aplicativo (0,37%) subiram, após a queda de 8,17% em julho. Já as passagens aéreas (-1,97%) seguem em queda, embora o recuo tenha sido menos intenso que o registrado no mês anterior (-4,21%).
O grupo alimentação e bebidas (0,78%) acelerou em relação a julho, quando ficou próximo da estabilidade (0,01%). Os alimentos para consumo no domicílio tiveram alta de 1,15%, influenciados principalmente pela elevação nos preços do tomate (12,98%), do leite longa vida (4,84%), das frutas (3,37%) e das carnes (3,33%). Destacam-se, ainda, as variações do óleo de soja (9,48%) e do arroz (3,08%), que acumula alta de 19,25% no ano. Por outro lado, verificou-se recuo nos preços da cebola (-17,18%), do alho (-14,16%), da batata-inglesa (-12,40%) e do feijão-carioca (-5,85%).
E é aqui que mora a nossa reflexão sobre a pressão nos preços. Como podemos ver acima, os preços de alimentos como o arroz, o leite, o tomate e as carnes , em geral, mas com destaque para a carne de frango e suína, dispararam e são alimentos básicos consumidos pela maioria das famílias brasileiras, e o que está por trás disso tudo? A alta do dólar aliada a uma maior demanda global por soja e milho brasileiros além da peste suína na China ter aumentado as importações de carne suína.
O frango, o boi , o porco são na verdade milho e soja empacotados e se sobem os preços dos principais componentes da alimentação desses animais, o preço da carne e do leite vai junto e o dólar mais apreciado, mais valorizado torna os produtos brasileiros atrativos para o consumidor global, e, em paralelo a injeção de praticamente R$50 bilhões mensais através do auxílio emergencial aumentou o consumo de alimentos.
Este aumento de preços dos alimentos está doendo no bolso? Sim, e no bolso da maioria dos brasileiros mas sob o ponto de vista das metas inflacionárias, ou seja, do controle da inflação pelo Banco Central, é um episódio pontual e que deve ser superado nos próximos meses sem que haja impacto na meta inflacionária para 2020. A meta de inflação para 2020 é de 4% com variação de 1,5 ponto percentual , isto é, podendo oscilar entre 2,5% a 5,5%.
No último Boletim Focus, os economistas ouvidos pelo Banco Central projetam uma inflação de 1,78% para 2020 , muito abaixo do piso de tolerância de 2,5%. O governo já está agindo no sentido de aumentar a oferta interna de arroz, milho e soja através da diminuição ou mesmo da isenção do imposto de importação destes produtos.
Resumo da ópera, assim como em relação ao Covid-19, começamos a ouvir ruídos e discursos políticos sobre inflação, e, em uma economia de mercado é normal que os preços oscilem de acordo com eventos e sazonalidades de oferta e demanda de produtos, o que é bem diferente de um processo inflacionário que implica em aumentos recorrentes e generalizados de preços. Liguem os filtros.
Rita Mundim é economista, mestre em Administração e especialista em Mercado de Capitais e em Ciências Contábeis
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