O V, o W e o J. Qual é a letra?

Confira o novo texto da colunista e economista Rita Mundim

O V, o W e o J. Qual é a letra?

O aumento significativo e rápido do número de infectados pelo Covid-19 na Alemanha, maior economia da Europa, no Reino Unido, Espanha, França, Itália e em outros países e regiões da Europa provocou o anúncio da volta de medidas rígidas de isolamento social. Nos EUA o aumento de casos também assusta mas com a proximidade das eleições presidenciais que acontecerão na terça, dia 03 de novembro, a flexibilização continua mas o tão esperado pacote fiscal não vai mesmo sair antes do pleito.

O aumento dos casos de Covid-19 na Europa e nos EUA , a não aprovação do pacote fiscal americano, antes das eleições, o risco de judicialização do resultado da eleição, em caso de derrota de Trump e em menor grau a prorrogação da novela do BREXIT( saída do Reino Unido da União Europeia) transformaram a quarta feira,28/10, em um verdadeiro primeiro de abril. Em pleno final de outubro, o nível de aversão ao risco por parte dos investidores globais, disparou como se estivéssemos em abril.

As bolsas despencaram, o dólar se fortaleceu e os juros futuros que subiram em um primeiro momento , recuaram no final da tarde pela percepção de que uma nova onda de COVID-19 impactaria negativamente a recuperação da economia global e poderia provocar uma nova rodada de corte de juros para estimular a retomada da atividade econômica das economias mais afetadas.

As bolsas globais apresentaram queda generalizada entre 2% a 4% e aqui no Brasil, o Ibovespa, principal indicador de desempenho da B3 ( a bolsa brasileira) caiu 4,25% , a maior queda diária desde março e, praticamente zerou, em um pregão, todo o ganho do mês de outubro.

O dólar chegou a R$5,80 e o Banco Central entrou vendendo US$1 bilhão, na tentativa de acalmar o mercado. Eu, particularmente, me sentia em um primeiro de abril, em relação ao comportamento do mercado financeiro brasileiro. Não estamos vivendo uma nova onda de Covid-19 nas proporções europeia e americana, pelo contrário, com exceção de estados como Amazonas, Amapá e Ceará, os níveis de infecção e óbitos vem sendo reduzidos e os balanços do terceiro trimestre divulgados até na sexta, dia 30, mostram uma recuperação forte de empresas e setores.

A correção praticada nos preços dos ativos brasileiros , na minha opinião foi exagerada, e, explico, pela ordem : na quarta feira, o Comitê de Política Monetária do Banco Central, o COPOM, manteve inalterada a taxa básica de juros, a SELIC, em 2% a.a., o menor nível da história, e deixou claro no comunicado que a alta de preços capturada pelos IPCAs nos últimos meses é temporária e que o nível das taxas de juros é adequado às condições atuais da atividade econômica.

A decisão do COPOM foi unânime e manteve o forward guidance, lembram? Os indicativos do que poderá acontecer com a política monetária no futuro, e, mantiveram a projeção da taxa SELIC em 2,00% durante todo o ano de 2021.

Na sexta feira, no apagar das luzes do mês de outubro, a divulgação do desempenho da atividade econômica na zona do Euro trouxe um certo alento para o mercado financeiro global, em meio às incertezas trazidas pela segunda onda do COVID-19. O crescimento de 12,7% do PIB da zona do euro , de 8,2% ,16,7% e 18,2%, do PIB da Alemanha, da Espanha e da França, respectivamente , impediu mais um dia de quedas fortes no fechamento das bolsas europeias e contribuiu para que as bolsas americanas e até a nossa B3 não registrassem quedas ainda maiores no último dia útil do mês.

Até quarta-feira feira o mês de outubro vinha registrando uma recuperação do Ibovespa, uma certa estabilidade do dólar em torno de R$5,60 e estabilidade também na curva de juros futuros, mas bastaram dois pregões, o de quarta-feira e o de sexta-feira para mudarem drasticamente o comportamento dos preços dos ativos no mês.

O Ibovespa , em apenas uma semana perdeu mais de 7% e anulou os ganhos de outubro, o dólar disparou e chegou a ser negociado acima de R$5,80 e o Banco Central entrou na ponta vendedora nos dois dias, para acalmar o mercado , mas mesmo assim, a moeda americana fechou o mês com uma alta de 2,13% em relação ao real ,e, no ano a valorização é de 44%.

A nova onda de COVID-19 na Europa e nos EUA traz apreensão para a velocidade e intensidade da recuperação das economias da zona do Euro e da economia americana que vinham se recuperando em V, e a volta do isolamento social mesmo que de forma parcial pode transformar o V em um W, dada a importância do setor de serviços na composição do PIB dessas economias.

Mas além da volta do COVID- 19, o desfecho das eleições americanas pode colocar mais lenha na fogueira das incertezas… O processo eleitoral da maior economia do mundo pode vir a ser questionado na justiça em caso de derrota de Trump, o que complicaria ainda mais a retomada da atividade econômica nos Estados Unidos.

Por aqui , além dessas fortes pressões globais temos a desconfiança do mercado em relação ao cumprimento do teto de gastos e, consequentemente, ao compromisso com a responsabilidade fiscal. É necessário que o tempo da política seja sincronizado com as necessidades da economia em tempos de guerra e que medidas e reformas sejam conduzidas e aprovadas para que tenhamos um ambiente econômico de segurança fiscal capaz de encorajar o empresário brasileiro, atrair o investimento estrangeiro e dar tranquilidade aos nossos credores.

Afinal de contas, vários setores da nossa economia estão retomando o crescimento em J, e graças à manutenção de uma política fiscal austera desde a implantação do teto de gastos no governo Temer, temos a menor taxa de juros da história e essa conquista precisa ser mantida para que a mais sonhada seja alcançada : o crescimento sustentável.

Rita Mundim é economista, mestre em Administração e especialista em Mercado de Capitais e em Ciências Contábeis

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