ANM admite que Cfem pode mais do que dobrar com fiscalização mais intensa nas mineradoras
Agência Nacional de Mineração firmou parceria com a Receita Federal para cruzamento de dados fornecidos pelas empresas do setor
Um dos principais gargalos apontados por municípios mineradores do Brasil é a dificuldade de fiscalizar as declarações fiscais que balizam o cálculo da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (Cfem). Produzidos pelas próprias empresas do setor, esses documentos são encaminhados diretamente à Agência Nacional de Mineração (ANM), órgão recém-instalado e que não dispõe de estrutura suficiente para averiguar toda a demanda. Nesse cenário, acabam sendo recorrentes as suspeitas de fraudes, como já partiu da Prefeitura de Itabira em relação à Vale.
A ANM reconhece que o problema existe e que o sistema, como é hoje, é passível de subfaturamento por parte dos problemas. Tanto é que a agência procurou a Receita Federal para uma parceria que busca o cruzamento de dados entre os dois órgãos. Na noite dessa quinta-feira (31/10), as instituições assinaram o termo de cessão do sistema ContÁgil, uma ferramenta que permite a comparação das informações declaradas pelos mineradores no Relatório Anual de Lavra da agência e o que é passado à Receita Federal.
Para se ter uma ideia do tamanho do problema, a própria ANM admite que o recolhimento dos royalties da mineração podem mais do que dobrar no país em um curto espaço de tempo.
“Essa ferramenta que nos está sendo disponibilizada vai nos possibilitar usar a expertise da Receita. A estimativa é que em 2019 a ANM arrecade R$ 4,2 bilhões em Cfem. Em 2017, por exemplo, foram R$ 1,6 bilhão. Há uma perspectiva dentro da ANM que, em um curto prazo, podemos mais que dobrar a arrecadação, explorando as possibilidades que esta ferramenta vai nos oferecer”, disse o diretor-geral da ANM, Victor Bicca, durante a assinatura do termo.
O uso do sistema pela ANM não será restrito à contabilidade. Além de evitar a fraude nas declarações, a agência poderá verificar o manuseio de notas fiscais, extratos bancários e dados do comércio exterior. As informações também vão trazer melhorias na qualidade dos dados estatísticos como valor transacionado dos bens minerais, mercado consumidor e produtor, o que refletirá diretamente na eficiência regulatória da agência.
O ContÁgil já é utilizado por todos os estados e diversos municípios brasileiros, além de órgãos de controle como Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE e Superintendência Nacional de Previdência Complementar – PREVIC. O próximo passo para que o sistema entre em funcionamento é customização do ContÁgil especificamente para a ANM e a capacitação dos técnicos.
Números questionados
A Cfem é distribuída a 461 municípios de 26 estados e do Distrito Federal afetados direta ou indiretamente pela exploração de minério. Mensalmente, 60% da compensação é destinada aos municípios produtores, 15% ao estado produtor, 10% à União e outros 15% aos municípios impactados.
Segundo maior gerador de Cfem em Minas Gerais, o município de Itabira questionou os valores declarados pela Vale pelo menos duas vezes em 2019. A Prefeitura argumenta que fatores como alta do dólar, o aumento do preço do minério de ferro e a produção continua nas minas locais não justificam os fortes declínios apurados no primeiro semestre de 2019. A situação foi levada à Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais (Amig) e à própria ANM.
Em maio deste ano, a Vale admitiu deduções indevidas no recolhimento da Cfem e pagou quase R$ 200 milhões a municípios de Minas Gerais e do Pará. Somente Itabira arrecadou R$ 20 milhões a mais com os royalties por causa do depósito retroativo.
Para o diretor da ANM, a parceria com a Receita Federal vai beneficiar, sobretudo aos municípios. “Este ato tem uma significância imediata no administrado que está lá na ponta, mais especificamente no beneficiário do nosso esforço. Nós arrecadamos e imediatamente repassamos aos municípios”, explicou Bicca.